segunda-feira, janeiro 16, 2012

Porque o rating está certo



Tem sido lançada uma grande confusão na cabeça das pessoas com a constante referência à dívida soberana, como se ela fosse a causa da presente crise financeira. Ora salta aos olhos que não pode ser: a Espanha tem uma dívida externa pequeníssima, muito mais pequena do que as dos países que aparecem cotados com altos ratings, e está com problemas.

Quando comprei o meu andar, fiquei com uma dívida muito maior do que o meu rendimento anual – o meu “PIB”; fiquei com uma dívida de mais de 200% do meu PIB; no entanto, o meu rating era AAA para a banca; Porquê? Porque o que eu ganhava era superior aos que eu gastava e aos meus encargos com essa dívida.

E este é que é o busílis da questão: o que se ganha dar ou não para pagar as despesas.

O que é isto de “o que se ganha” em termos de um país? É o dinheiro que entra, pelas exportações, turismo, remessas de emigrantes. E o que se gasta? É o dinheiro que sai, pelas importações, turismo, movimentos de capital, remessas de imigrantes.

Portanto, o que faz com que um país seja AAA ou lixo é este balanço, não é a sua dívida soberana. Basicamente, é a balança de pagamentos do país. É por isso que a Alemanha tem necessariamente um rating AAA.

A balança de pagamentos é por isso a preocupação nº 1 de qualquer outro país.

Portugal tem uma balança de pagamentos altamente deficitária há décadas; é um país que gasta mais do que ganha, portanto. Como é que Portugal pode ter um rating que não seja “lixo”??? Naturalmente que é lixo! É como uma pessoa que todos os anos pede um novo empréstimo para conseguir pagar os encargos dos empréstimos anteriores.

Como é que deixamos de ser lixo? Veremos no próximo post.

9 comentários:

antónio ganhão disse...

Exportemos os nossos gestores para a China já que são tão do agrado dos Chineses e são um produto de valor muito acrescentado...

Diogo disse...

Caro Alf,

Já para não referir aqui que as agências de rating são parte integrante da crise do subprime nos EUA ao atribuir a cotação máxima a bancos investidores na véspera da sua falência,

Já para não dizer que estas agências de rating são propriedade de bancos que ganharam triliões com esta crise financeira,

Já para não dizer que estas agências de rating já deviam ter sido desmanteladas e os seus responsáveis presos,

Você está redondamente enganado.

Diogo disse...

Passo a explicar porquê:

Numa zona com uma moeda comum não existem «exportações» ou «importações» – ou seja:

Para uma empresa é indiferente vender para o vizinho do lado como para um tipo que está a 10.000 km de distância. E para uma empresa é indiferente comprar do vizinho do lado como de um tipo que está a 10.000 km de distância.

Donde, quando uma empresa está a vender para o vizinho do lado, está a exportar. E quando uma empresa está a comprar do vizinho do lado, está a importar. O mesmo se aplica às transacções a 10.000 km de distância.

Quando Portugal vende à Alemanha não vai buscar marcos. Quando a Alemanha vende a Portugal, não vem buscar escudos. Uns e outros vão buscar euros.

Há empresas que produzem melhor e vendem mais? Há!

Há países que devido a essas empresas conseguem mais impostos? Há!

Um país da zona euro não é mais do que um distrito ou um concelho de um país.

Isto para não falar na possibilidade de escolha da sede tributária de hoje em dia.

alf disse...

Acabo de ver o Medina Carreira na TVI24 (olhos nos olhos) a dizer o mesmo que digo aqui, devidamente ilustrado com gráficos; e, tal como eu, a interrogar-se porque raio não há um político que ponha o dedo na ferida e anda tudo para aí distraído a inventar explicações para a crise que são irrelevantes.

alf disse...

antonio

pois... só que o valor acrescentado deste produto é a capacidade de influenciar as decisões do governo... o Catroga vale um dinheirão cá com um governo PSD mas valerá zero na China...

alf disse...

Diogo

Você esquece uma coisa essencial: o nosso orçamento é local. Sairem daqui euros é exactamente o mesmo que sairem daqui escudos.

Já falei nisto várias vezes; é como se as pessoas do distrito de Castelo Branco tivessem de viver das receitas locais - a saúde, as estradas, o ensino, a administração, as reformas, a segurança social, tudo tivesse de ser pago com as receitas dos impostos locais.

Isto não é uma impossibilidade, mas a organização fiscal teria de ser muito diferente - por exemplo, as empresas de lá não poderiam ter a sede em Lisboa e pagar impostos em Lisboa, teriam de o pagar lá.

Além disso, os recursos naturais que lá serão explorados - turismo, minérios, águas - teriam de o ser de tal forma que o distrito beneficiasse disso - não pode ser uma empresa alemã fazer lá um campo de golfe, trazer os golfistas em voos charters, ficarem alojados nas intalações do campo e regressarem ao seu país sem que um tostão pingue localmente.

Ora o que tem acontecido neste país é como se Castelo Branco passasse a ter orçamento baseado nas receitas locais mas o sistema fiscal fosse nacional - ou seja, as empresas exploram os nossos recursos e depois levam os lucros embora.

Além disso, somos pequenos e a capcidade de gerar riqueza é proporcional à dimensão; e não fazemos nada para ultrapassar a nossa pequenez - os alemães que são bem maiores fizeram por exemplo um instituto de investigação com os suiços, com mais de 10 000 engenheiros e cientistas; nós deviamos estar a fazer coisas com os espanhóis, os brasileiros, os angolanos, mas continuamos pequeninos.

Nós temos de tirar a venda dos olhos e ver as coisas como elas são - um país pequeno tem de fazer sacríficios que um país grande não tem porque tem outras possibilidades; e tem se ser mais esperto porque o outro é mais forte.

Diogo disse...

Não Alf,

No comércio com países FORA da zona euro, quando o saldo da balança comercial de um país se apresenta negativo, o governo, para a equilibrar, tem de recorrer a reservas cambiais (em dólares, euros ou outras) que esse Estado tem em caixa ou recorrer a empréstimos do exterior para equilibrar a balança comercial.

No comércio com países DENTRO da zona euro, a coisa passa-se toda directamente entre empresas. Os Estados não têm de trocar euros para equilibrar balanças comerciais.

É evidente que um Estado tem interesse em que as empresas produzam e paguem os seus impostos dentro das suas fronteiras.

Diogo disse...

«Portugal tem uma balança de pagamentos altamente deficitária há décadas; é um país que gasta mais do que ganha, portanto. Como é que Portugal pode ter um rating que não seja “lixo”??? Naturalmente que é lixo! É como uma pessoa que todos os anos pede um novo empréstimo para conseguir pagar os encargos dos empréstimos anteriores.»


Caro Alf, a tecnologia tem vindo (e continua) a avançar em ritmo exponencial. Tecnologia significa capacidade de produção. Hoje, mesmo que os portugueses só trabalhassem 2 horas por dia, o total de produção homem + máquina é suficiente para dar a todos um nível de vida muito superior.

Simplesmente, não se produz mais porque não há poder de compra. Porque o desemprego e os salários miseráveis são imensos e incapazes de comprar mais produção.

alf disse...

Diogo

A balança de pagamentos é exactamente (ou quase) como as suas contas pessoais - você recebe em euros e paga em euros como toda a gente; no entanto, você não pode gastar mais euros do que ganha. Assim é você, assim é o país. Se o país não conseguir este equilíbrio, começam as falências, as reduções de ordenados, o aumento dos custos sociais, que aumenta os encargos do estado, aumenta os impostos, etc.

Este quadro resulta necessariamente de uma balança de pagamentos deficitária.


O que diz quanto à produtividade está inteiramente certo; é por isso que é inaceitável um sistema económico que gera pobreza. Este sistema económico é inaceitável, por isso é que os nórdicos arranjaram outro.