terça-feira, abril 14, 2009

Inteligências: a Aprendizagem



O nível de Inteligência mais elementar já conhecemos:

[Geração Aleatória de Hipóteses + Selecção].

Este nível de Inteligência é o mais eficiente quando a capacidade de geração de hipóteses é da ordem de grandeza do número de hipóteses possíveis. Por exemplo, como qualquer apostador do euromilhões sabe, as suas chaves, geradas aleatóriamente, nunca acertam – o número de hipóteses que um apostador pode produzir não é significativo. Mas, por outro lado, quase todas as semanas há quem acerte – o número total de apostas é significativo em relação ao número de combinações possíveis. O método é eficiente considerando a totalidade de apostas geradas mas ineficiente a nível individual.

Um caso onde a Natureza teria usado este método foi na geração da Vida. No cenário que apresentei (ver etiqueta «Origem da Vida»), ter-se-ão produzidas combinações dos átomos que formam a vida em número significativo em relação ao número de combinações possíveis. Nesse cenário, este método elementar é tão capaz de produzir Vida como o conjunto dos apostadores de produzir uma chave ganhadora no euromilhões. Este é o método mais eficiente para um problema deste tipo.

Depois, a Vida, para evoluir, carece de outros métodos de Inteligência porque a capacidade de gerar hipóteses em número significativo deixa de existir; e quanto mais a vida evolui, menor é a capacidade de gerar hipóteses, porque cada vez é menor o número de indivíduos e maior o tempo de reprodução; e maior é o número de combinações possíveis. A Evolução da Vida suporta-se certamente em processos de Inteligência altamente sofisticados. Não podemos esperar entendê-los imediatamente, teremos de ir dando os passinhos que as nossas pernas permitem.

Vamos, por isso, analisar processos de Inteligência sucessivamente mais sofisticados.

Um processo de inteligência completamente diferente é o da Aprendizagem.
Os seres vivos usam extensivamente este processo na seguinte combinação de acções:

[(Aprendizagem+Arquivo) + (Identificação Situação+Selecção Solução)]

Este processo é imbatível em velocidade de resposta, que é essencial à sobrevivência.

O cérebro recolhe continuamente dados do mundo exterior, testa sistematicamente as possiveis soluções para cada situação que experiencia ou que imagina, e arrruma em memória as situações e as soluções correspondentes.

Durante o período de vigília, identifica as situações que vai encontrando e aplica as soluções que tem em memória;

durante o sono, processa as experiências do dia, analisa situações que podem ocorrer, através de um processo de geração de novas situações que analisaremos noutra altura, testa soluções e finalmente arruma e completa o seu arquivo de situações-soluções. Os sonhos são, em parte, a análise de situações possíveis e potencialmente perigosas. As crianças têm muitos «pesadelos», que vão desaparecendo à medida que a experiência de vida permite ao cérebro estreitar a possibilidade de situações perigosas.

Portanto, durante a vigília o cérebro «enche» uma base de dados temporária com informações da experiência diária; durante o sono, processa toda esta informação, actualiza e arruma o seu arquivo de situações-soluções, e «limpa» a base de dados temporária. A necessidade de sono é, por isso, um pouco como a necessidade de esvaziar periodicamente a bexiga.

A nossa actividade mental resume-se a isto em mais de 99%. Porém, quando temos de enfrentar um problema completamente novo, este sistema fica incapaz de encontrar uma solução, ficamos desorientados, sentimo-nos «estúpidos». Em parte por isso, toda a mudança nos causa grande ansiedade, pois ela representa a necessidade de modificarmos o nosso «arquivo de situações-soluções».

Este processo tem a vantagem da rapidez de resposta mas para enfrentar um problema novo é totalmente ineficaz. Aí, é preciso recorrer a outros processos de Inteligência. Note-se que mesmo este processo se apoia noutros processos de inteligência para gerar tentativas de solução no processamento noturno.

O sistema de ensino funciona quase exclusivamente com base neste processo. Um grave inconveniente desta exclusividade é que conduz à atrofia da capacidade de usar outros sistemas. É isso que ilustro no post « Um Burro carregado de Livros».

Bem, agora que referimos um pouco a importância e as limitações da Aprendizagem nos processos de Inteligência, estamos em condições de observar como é que a Natureza usa a Aprendizagem para nos fazer como somos.

quarta-feira, abril 01, 2009

Lição de Humildade




O século XX terminou em pleno apogeu da confiança do Homem na sua extraordinária Inteligência. As pessoas comuns tinham a sensação que a Humanidade se tinha elevado às alturas dos Deuses dos antigos, que tudo era agora possível, nenhum problema era desafio bastante para as capacidades Humanas, a Democracia era um sistema político perfeito, a Fome em breve desapareceria, a cura do cancro estaria ao virar da esquina, quiça mesmo a juventude eterna. As teorias do Homem dominavam o Clima, o Cosmos, a Matéria; a Física estava quase concluída, o que faltava cairia aos pés do grande acelerador em breve. As misteriosas catástrofes que repetidamente ameaçaram a continuidade da Vida na Terra não passavam de um meteoro que as formidáveis capacidades tecnológicas poderiam enfrentar. Falava-se já das possibilidades de fabricar vida em laboratório, de melhorar as capacidades mentais com recurso a chips, de transformar o Homem em Super-homem. A Evolução deixaria de ser tarefa da limitada Natureza para passar a ser assegurada pelas mãos sábias e muito mais generosas do Homem Qualquer coisa que tivesse origem nas vozes autorizadas era aceite como verdade sagrada e só os pobres de espírito questionavam ainda a sublime superioridade das fontes de conhecimento humanas.

O século XXI tem vindo a desnudar o imenso equívoco. O inquestionável «Aquecimento Global» transmutou-se silenciosamente em «Alterações Climáticas», o superacelerador de partículas autodestrói-se para não destruir a Física Atómica, a teoria Cosmológica tornou-se mais fabulosa do que a Astrológica – os Sábios de hoje recorrem aos mesmos expedientes e à mesma linguagem dos bruxos de antigamente para iludir o imenso povo.

Mas eis que explode a crise económica. Os mais incensados Economistas, apanhados de surpresa, começaram por confessar que não a entendiam, que ninguém poderia prever o que iria acontecer.

Isso era preocupante, as pessoas podiam começar por duvidar dos «Sábios». A linguagem foi mudada. Transformaram-se os sintomas da crise em causas dela - o «subprime» é um sintoma, uma consequência da crise, não é a causa, é exactamente como as indústrias que abrem falência. Apontam-se culpados, os banqueiros. E fazem-se previsões: em 2010 a crise acaba. Assim se sossegam as massas, se restabelece a confiança na humana «Inteligência». Desta forma, sem nada perceberem do que se está a passar (exceptue-se o PM inglês...), sem fazerem a mínima ideia do que vai acontecer, os «Sábios» mantêm o seu estatuto. E manterão sempre, porque este processo de ir transformando consequências e sintomas em causas dos problemas pode ser repetido ad eternum. Felizmente, porque se não fizessem podia instalar-se o pânico.

Donde vem esta confiança cega nas humanas capacidades? Dos sucessos tecnológicos. Se somos capazes de fazer telemóveis, aviões e foguetões, certamente que seremos capazes de fazer teorias sobre o clima ou sobre a economia, não é verdade?

A verdade é que... não é verdade!

Se olharmos para a história do conhecimento humano, em qualquer área, percebemos que apesar dos milhares e milhares de pessoas a ele inteiramente dedicadas, o essencial desse conhecimento é devido a um número reduzidíssimo de pessoas. Cuja maior dificuldade foi, em muitos casos, não o desenvolvimento desse conhecimento mas simplesmente convencer os outros. Isto tem sido objecto de muito debate, mas agora vão ter a oportunidade de começar a perceber o PORQUÊ.

Muitos defendem que os «génios» mais não fizeram do que antecipar o normal curso do conhecimento. Ilusão. Mostra a História que Humanidade patina longamente no erro, muitas vezes em dramas sucessivos, ergue-se apenas para cair novamente, até que surge alguém que quebra o ciclo do erro. Esse «alguém» segue uma metodologia muito diferente, que misteriosamente tem permanecido incompreensível para a generalidade das pessoas.

No post « Níveis de Inteligência» já referi, e exemplifiquei com o labirinto, como a Inteligência tem um nível elementar, o da «geração de hipóteses+selecção» e tem outros níveis. Um desses níveis permite a Tecnologia. Muitas pessoas estão preparadas para esse nível. Por isso a Tecnologia evolui sustentadamente. Por isso não identificamos «génios» nas áreas tecnológicas, não porque eles não existam, mas porque abundam.

Mas nas áreas de importância crucial para a evolução da sociedade humana, aí a metodologia tecnológica é tão incapaz como um cego é de conduzir um carro. A sociedade humana é conduzidas por pessoas que não podem ver para onde vão. Na Ciência como na Política ou na Economia. Só quando se começam a «estampar» é que se vai à procura de quem consiga «ver» alguma coisa. Por isso elegeram o Obama. Mas também esta procura é «cega» porque as pessoas não sabem qual é o problema nem o que procurar. Nem vão entender o remédio.

A diferença entre os níveis de Inteligência não é uma diferença de capacidade. É uma diferença de adequação. O nível elementar é o melhor, o mais adequado, quando a «geração de hipóteses» é muito grande e o preço do «erro» é baixo. É muito usado pela Natureza com a sua imensa capacidade de gerar situações diversas. Os outros níveis são adequados a outros quadros e outros objectivos. Não são melhores nem piores em valor absoluto. E também são muito usados pela Natureza, como veremos.

Perceber os níveis de Inteligência é crucial para sairmos do «buraco» em que as nossas teorias erradas, seja na Economia, Política, Educação ou Ciência, nos estão a meter. E também para começarmos a perceber os limites da nossa inteligência. E ainda para, como disse o Virgílio Ferreira, começarmos a usar inteligentemente a nossa Inteligência ( “De que te serve a inteligência se não tens inteligência para a usar com inteligência?”)

Vamos então olhar para os níveis de Inteligência no próximo texto. Tanto quanto os nossos olhos meio cegos conseguem ver.