segunda-feira, julho 16, 2007

Mistérios: a Seta da Vida

(imagem da Wiki)
Oláa ....vislumbrei um caminho e ripostei de imediato: Como não? Há lá coisa mais transcendente do que as explicações que os cientistas apresentam do Universo? O que os bruxos mais esotéricos conseguem inventar não chega aos calcanhares da imaginação de alguns cientistas!
- De que raio estás tu a falar?!? – exaltou-se o Mário.


Fazendo o meu melhor para aparentar profunda admiração pelo espanto do Mário, respondi calmamente:

- então, o que há de mais transcendente que os espaço-tempo curvos, os universos a 11 e mais dimensões, os universos paralelos, os universos que chocam, isto para não falar em coisas mais especificas como a teoria da inflação, a matéria negra, a energia negra e ...

- Isso é completamente diferente – interrompeu-me o Mário, o olhar tornado metálico pela irritação – a natureza é como é e não como nós queremos, não está limitada pelas nossas limitadas capacidades de compreensão.

Respirou fundo e continuou em tom suave – claro que compreendo que as pessoas sem suficiente formação científica não sejam capazes de entender essas avançadas teorias e hipóteses....

Ele estava exactamente onde eu pretendia. Rezando para não trocar os pés pelas mãos neste momento crucial, afirmei solenemente:

- A Ciência actual é um monumento à existência de um Deus. Transpira a existência de um Deus por todos os poros.

Mário “passou-se”. A boca abriu e fechou umas três vezes antes de conseguir falar. O silêncio foi total nesses instantes, pelo canto do olho pude observar as máscaras de apreensão dos outros. Finalmente, a palavra surgiu seca na boca do Mário:
- Explica-te! – comandou.

- Dizia-me há dias um amigo que o Universo parece ser uma máquina construída com o único objectivo de produzir estruturas tão complexas quanto possível, pois começou com o átomo de hidrogénio e já fabrica as complexas proteínas da Vida.

- Isso já me está a cheirar a misticismo – interrompeu Mário – o Universo evolui no sentido da desorganização crescente. Todos os sistemas físicos evoluem no sentido da entropia crescente. Isso é uma lei básica.

- Entropia? – questionou Luísa – o que é isso?

- É uma medida da quantidade de informação que é necessária para descrever um sistema – Mário gostava sem dúvida de ensinar – Um exemplo clássico é o do supermercado. No começo do dia, todos os produtos estão dispostos nas prateleiras respectivas. Para se saber a localização de qualquer produto, basta uma lista não muito grande da localização de cada tipo. Ao longo do dia, os clientes pegam em produtos largam-nos onde calha. Ao fim do dia, se se quiser fazer uma lista da posição de todos os produtos, essa lista tem de incluir a posição de cada um dos produtos que ficaram fora de sítio. Ou seja, é preciso mais informação para descrever o posicionamento dos produtos. Estão de acordo não é verdade?

- Sim! - respondemos em coro e rimo-nos, que o riso estava a fazer-nos falta.

- Ora bem - continuou Mário - matematicamente, essa quantidade de informação é medida por uma função chamada entropia. Portanto, a entropia do sistema de produtos do supermercado cresce ao longo do tempo. E se não existissem pessoas que se encarregam todos os dias de voltar a pôr os produtos no sítio certo, ao fim de algum tempo a lista de posicionamento tinha de ter tantos items quanto os produtos existentes no supermercado. Estás a perceber?

- Estou. Realmente é interessante.

- Esse exemplo é bom – comentei então – porque mostra bem o problema que a noção de entropia cria para a Física.

- O problema!? – admirou-se Mário.

- Sim, porque para baixar a entropia foi preciso fazer intervir os empregados do supermercado, ou seja, uma inteligência, uma vontade exterior ao sistema! – não pude conter um sorriso de triunfo. Mário ficou algo perplexo e, sem lhe dar tempo a contestação, concluí – a ideia que o aumento de entropia, ou seja, o aumento de desordem, é uma característica essencial dos fenómenos físicos implica a ideia, eventualmente inconsciente, de que só a intervenção de uma inteligência exterior ao sistema pode alterar essa inexorável evolução para uma desordem crescente. Não será assim?

- Continua – Mário, cauteloso, optou por me fazer continuar, certamente à espera de um ponto fraco na minha argumentação que lhe permitisse uma contestação clara.

- Quando olhamos para o Universo, o que verificamos é que ele sempre se transformou no sentido da complexidade, no sentido contrário à seta de evolução subjacente às teorias físicas. Portanto, os físicos procuram explicar o Universo baseados num conceito fundamental que é obviamente o oposto do que se observa. Olha, nessa linha é completamente impossível explicar como é que surge a Vida por exemplo. Nesse quadro, a Vida é um milagre.

- Estás querer dizer – retorquiu Mário, pesando as palavras – que um modelo correcto do Universo conduz necessariamente à formação da Vida, não como um acontecimento fortuito mas como um acontecimento necessário, inexorável?

- Claro! E vês o espanto que tal afirmação te causa? Sinal que subjacente ao teu pensamento ateu não deixa de estar uma crença inconsciente num deus criador. Mas há mais: a teoria cosmológica aceite pela ciência, o Big Bang, está perfeitamente de acordo com a concepção judaica, continuada pelos cristãos e muçulmanos, da existência de um Deus que criou o Universo a partir do nada. Não podia estar mesmo mais de acordo: tudo surge de um ponto do nada! Aliás a ideia é proposta por um abade, o abade Lemaître...

- ..que foi um grande cientista!

- Sem dúvida. E religioso também. Chegou a presidente da Academia Pontifícia de Ciências, à qual estão ligados os nomes de nada menos 39 prémios Nobel.

- Espera aí – interrompeu-me Luísa, espantada – essa não é a academia do Vaticano, que tem origem na Academia do Lince, aquela do Galileu?

- Vai sempre tudo parar ao mesmo, não é...?

- Esperem aí, não passem já a outro assunto antes de resolvermos o problema da entropia – interrompeu Mário - A tendência para o aumento da entropia é um facto indesmentível e não há nada de errado no pensamento científico a esse respeito!

- Pois .... mas então como é que o Universo evolui no sentido da complexidade e não no sentido do caos?

- Estou ansioso por te ouvir – ironizou Mário

9 comentários:

Anónimo disse...

a explicação é magistral meu caro alf .
Por fim o Mário (como nós) deve estar de facto ansioso pela continuação, mas creio que já não lhe sobeja espaço para a ironia, (última linha do post).

alf disse...

Anónimo
Obrigado.
O Mário não pode acreditar que o seu interlocutor seja capaz de explicar algo que a Ciência não explica, não é? Portanto, só está à espera de ouvir um disparate...
Um abraço

antonio ganhão disse...

Estou chocado! Então Deus é um gestor de produtos num supermercado, pago a ordenado mínimo nacional!

Deus arrumando os produtos mais baratos e de origem chinesa nas prateleiras de cima para dificultar a leitura do rótulo de origem, a arrumar os doces e as revistas cor de rosa nos escaparates junto às caixas registadoras… por muito menos tivemos nós a Inquisição.

Esta defesa de Deus, tem o condão de irritar os puristas da racionalidade, iluminismo e tudo que soe a mente esclarecida, sem deixar de irritar os crentes mais conservadores; um leve pisar de calos às religiões, não nos podemos cingir só aos católicos, pois há por aí mais mercado a conquistar.

Brilhante! Começo a ver aqui o resultado das minhas achegas! (modéstia ;)

NC disse...

O texto promete, de facto.

Patrícia Grade disse...

Beeeemmmmm... não sei se gostei mais do post se dos comentários.
Meus amigos, chego à conclusão que é mais fácil ser-se gaja burra do que seguir-vos o raciocinio... homens... eu a pensar que vocês só perdiam tempo com bola, geringonças electrónicas e sexo... mas que grande desilusão!

NC disse...

«a pensar que vocês só perdiam tempo com bola, geringonças electrónicas e sexo»

Achas pouco, não?!?!?!?

:-)

alf disse...

Já alguém me disse que o melhor da blogosfera são os comentários ao meu blogue... começo a acreditar
:-)

Rui leprechaun disse...

Ai, sim?!

E isso foi antes de eu cá chegar p'ra aumentar a entropia...

Rui leprechaun

(...e provocar avaria!!! :))

Rui leprechaun disse...

mas então como é que o Universo evolui no sentido da complexidade e não no sentido do caos?


Pois é isso mesmo... berra aqui um tolo a esmo!!!

Estou em pulgas para perceber esta baralhada da entropia, há que anos eu remoo tal cruel desarmonia!

Mas o Hawking diz uma coisa espantosa, que não me faz sentido nenhum... é que nem percebi patavina!

Enquanto o leitor leu este livro, terá convertido pelo menos mil calorias de energia ordenada, sob a forma de alimentos, em energia desordenada, sob forma de calor que se perde para o ar circundante por convecção e transpiração. Isto aumentará a desordem do Universo em cerca de vinte milhões de milhões de milhões de milhões de unidades, ou cerca de dez milhões de milhões de milhões de vezes o aumento da ordem do cérebro do leitor, se se lembrar de tudo o que está no livro.

Estou mais que varado de espanto!!! Mas de onde é que vêm tantos milhões de milhões de milhões... só por mil calorias, note-se bem!!!

Já agora, se um buraco negro é um Big Bang às avessas, então aí a entropia devia diminuir, o que acontece no seu interior, claro. Mas como a entropia total tem de aumentar, então ele postulou a radiação Hawking, que até hoje ninguém mediu!

Humm... começo a desconfiar que talvez nem sejamos menos inteligentes do que eles, enfim, talvez só a matemática... ;)

Mas atenção, que a entropia também é uma medida das probabilidades e assim até pode eventualmente diminuir. Pelo simples acaso matemático, claro... dizem eles!

Ele fala ainda na seta do tempo termodinâmico, que aponta para o aumento da entropia e desordem, claro!

A hipótese de não haver fronteira para o Universo prevê a existência de uma seta termodinâmica bem definida porque o Universo tem de principiar num estado regular e ordenado.

O problema disto tudo é que tal supõe um início do espaço-tempo, no Big Bang, que depois se expande indefinidamente, na direcção das 3 setas: termodinâmica, psicológica e cosmológica!

Bah! mas isso está tudo gatado... só o desvanecimento é acertado! :)

Pelo menos, a seta da vida faz-me muito mais sentido... viva o Alf, nosso Avatar desconhecido! ;)

Ainda tenho mais para dizer...

Rui leprechaun

(...mas já basta de escrever! :))