domingo, fevereiro 23, 2014

A Austeridade é fatal para os Bancos



Eu já aqui disse e repito: uma política de Austeridade vai ser fatal para a banca nacional.

Relembro o que foi que desencadeou a crise financeira: o empobrecimento das pessoas. Este empobrecimento foi a consequência necessária de o crescimento da riqueza dos ricos se ter tornado superior ao crescimento total da riqueza, o que implica que passou a alimentar-se do empobrecimento dos não-ricos.

Claro que havia os produtos tóxicos e etc, mas isso tudo só estoirou porque as pessoas deixaram de ter dinheiro para os alimentar - foi aí que eles se tornaram "tóxicos", antes disso eram fantásticos...

A banca tem dois tipos de atividade: a dita de retalho e a dita de investimento. A primeira vive de explorar as necessidades das pessoas (empréstimos), a segunda de explorar a ganância das pessoas (aplicações financeiras, bolsa).

Claro que o processo de emprestar e reemprestar sempre o mesmo dinheiro parece uma forma excelente de ganhar dinheiro – se para cada euro depositado puderem emprestar 10 euros (andavam a emprestar 30 antes da crise), o que ganham em juros em cada empréstimo é multiplicado por 10 para obter a rendibilidade do capital – um juro médio de 5% rende 50% num ano. Parece uma galinha dos ovos de ouro mas não é bem assim, porque é preciso subtrair o crédito mal parado – e o peso deste no resultado final também é enorme: 1 caso de incumprimento nesses 10 empréstimos gera um prejuízo de 50% num ano. Ou seja, uma pequena taxa de crédito mal parado faz passar de um lucro bestial para um prejuízo abissal. Portanto, basta uma pequena flutuação na taxa de incumprimento para fazer este negócio passar de grandes lucros para grandes prejuízos

Os incumprimentos são inerentes ao processo: se um banco empresta a uma empresa para ela aumentar a sua competitividade e empresta igualmente à empresa concorrente, nenhuma aumenta o volume de vendas nem os lucros e ambas ficam sem meios para pagar o juro dos empréstimos; ou então uma é bem sucedida e a outra abre falência, não pagando o empréstimo. Ou seja, qualquer novo empréstimo bancário a uma empresa contem a perspetiva de fazer falhar outro empréstimo. O balanço de toda esta atividade é ditado pela evolução da economia: se esta melhorar, a taxa de incumprimento desce e vice-versa.

. Claro que o processo não é assim tão linear, os bancos têm alternativas, como seja ficarem donos de todas as empresas de um setor e estabelecerem um monopólio disfarçado, que é o que está a acontecer nas grandes áreas de atividade. Só que isso é para os grandes bancos, não é para os bancos nacionais.

Ouvimos dizer que a economia está a melhorar pois as exportações estão a crescer. É ótimo que as exportações cresçam mas não são elas que marcam a economia - o que marca é o mercado interno.

A crise financeira nos EUA não rebentou por as exportações dos EUA estarem a descer - foi porque os americanos estavam a empobrecer. E a solução não foi empobrecê-los mais, foi enriquecer aos americanos. Os americanos não implementaram uma política de austeridade, fizeram o contrário.

Se nos EUA é assim, em Portugal muito mais, porque os nossos bancos não têm dimensão internacional, eles vivem do mercado interno.

Repito o que já disse: ou os bancos nacionais se juntam todos para financiar o Estado e pôr travão numa política de Austeridade que consiste apenas em tirar dinheiro às pessoas, ou vão ficar em muito maus lençóis. A ganância de quererem ganhar dinheiro com a dívida soberana vai arruiná-los em vez de salva-los.


domingo, fevereiro 16, 2014

Como pode o Estado financiar-se a 1%


O Estado colocou recentemente dívida a 10 anos a mais de 5% ao ano; e colocou dívida a 1 ano a 0.86% ao ano; e a 6 meses a uma taxa ainda mais baixa. Parece então que é muito simples resolver o problema do financiamento do Estado: fazer só emissões de dívida a curto prazo!

Pensemos: quem, no mundo de hoje, quer aplicações de capital a DEEEEEEEEEEEZ longos anos??? Ninguém!!!!! Quem compra a 10 anos é para a seguir vender no mercado secundário e conseguir um ganho a curto prazo. É para alimentar o processo de casino da compra e venda de títulos. Haverá umas exceções, mas isso não conta.

As dívidas a 10 anos são dos países que têm Banco Central e que das mesmas não pagam juro nenhum, como já expus em posts anteriores; aí sim, faz sentido o prazo de 10 anos – ou de 20, tanto faz. Agora, nestes países do Sul da Europa que deixaram de ter banco central para se financiarem, colocações de dívida a longo prazo não faz sentido nenhum.

Poderemos pensar: mas então o Estado teria de colocar enormes quantidades de dinheiro todos os anos. Ora claro que não, pela simples razão de que a dívida pública portuguesa é ridiculamente pequena ao pé do capital em circulação. No entanto, há que saber gerir o processo para garantir a máxima capacidade de negociação (ver comentário).