quarta-feira, outubro 02, 2013

Economia, Poder Político e Poder Financeiro



Muita gente pensa que a Economia é o resultado das leis económicas e que o conhecimento destas permite prever a sua evolução, tal como em Física se pode prever a evolução de um sistema conhecendo as leis da natureza. Nada mais errado.
A Economia, como tudo o resto (Ciência, Justiça, Media, etc), está ao serviço dos dois poderes que existem: o Político e o Financeiro. Todos dependem do dinheiro que o poder político ou financeiro lhes atribui. Mesmo a Igreja, apesar de ter fontes próprias de receitas, tem de pactuar com esses dois poderes. Um exemplo de como a Ciência está subordinada a esses poderes é o caso do aquecimento global (ver esta notícia “fresquinha”).
É por isso que a Economia (não é só o Gaspar...) falha quase sempre as suas previsões – estas não dependem das leis económicas, dependem apenas dos interesses e força dos dois poderes. São eles que determinam a evolução da sociedade humana. Conhecendo-os, adquirimos uma capacidade preciosa: a capacidade de fazer futurologia. E, com ela, a capacidade de modificarmos o Futuro provável.
Vamos então ver como se organizam os Dois Poderes e como isso determina fatalmente a sociedade humana e a sua evolução.

1- Os Dois Poderes

Penso que o ser humano se move a longo prazo, primariamente, para 3 fins: poder, dinheiro e reconhecimento/estatuto; afinal, as características do Rei/Rainha... Destes 3 “atratores” da actividade humana, são os dois primeiros que a condicionam através dos tempos, na forma de poder Político e poder Financeiro.
Naturalmente, a Economia serve esses poderes. A Economia não serve “uma sociedade melhor”; os economistas estão ao serviço de quem lhes paga e as escolas de economia formam pessoas cuja habilidade consiste essencialmente em enriquecer os ricos, pois esses serão os seus empregadores.
(isto não envolve nenhum juízo de valor sobre as pessoas em si; os economistas são pessoas como quaisquer outras e as pessoas agem em função do seu interesse, mesmo que disso não tenham consciência)

O primeiro objetivo de qualquer poder é a sua perpetuação. Idealmente, ambos os poderes tendem para uma sociedade de senhores e servos; porém, a circulação atual de informação e a capacidade de mobilização das pessoas tornam isso impossível para o Poder Político, que é obrigado a estar ao serviço de parte ou de toda a sociedade, consoante a sua organização, para se poder perpetuar. O Poder Financeiro, ao contrário, continua a existir no obscurantismo.

2 - O Poder Político e a Economia.

Ao Poder interessa manter os povos atrasados e pobres. Antes de haver capacidade de comunicação maciça entre as pessoas, isso era fácil de conseguir. A falta de informação e da capacidade de comunicação é essencial para que uma minoria mantenha o seu estatuto.
Com o aumento da capacidade de comunicação das pessoas, com a difusão de informação política, o Poder teve primeiro de alargar a sua “corte” de apoio para melhor enquadrar o povo, fazer surgir uma pequena “classe média” e, por fim, assumir a forma de democracia. A difusão de informação política obrigou o Poder Político a ter de desistir de uma sociedade de senhores e servos e a ter de aceitar uma sociedade em que parte suficiente dela já não é serva. No entanto, como veremos, a ausência de informação financeira (a informação financeira que existe é tão manipulada e obscura como a informação política na Coreia do Norte) permite que o Poder Financeiro venha ele a conseguir a sociedade de senhores e servos. Mas vejamos agora o lado político.

Numa democracia o Poder Político depende da maioria. Isto implica uma nova organização da Economia, que tem agora de servir os interesses da maioria.
Em vez de um quadro senhores/povo, surge uma “classe média” vasta na qual o Poder se suporta. A Economia é dirigida para manter essa classe média satisfeita. Em consequência, a sociedade (o “povo”) organiza-se com 1/3 de servos e 2/3 de classe média. Esta é a solução que maximiza a qualidade de vida da classe média com o mínimo de recursos – a solução que permite que os senhores fiquem com o máximo de recursos ao mesmo tempo que garante a estabilidade política. Note-se que são os eleitores que formatam assim a sociedade, pois elegem os partidos que propõem esta solução (por exemplo, quando o PS se propõe promover a igualdade de oportunidades, ou seja, acabar com os “servos”, a classe média portuguesa começa logo a contestar os “custos”). Numa ditadura, a classe média tem uma dimensão muito pequena, definida pelo Poder; numa democracia tem a dimensão de 2/3 da população, definida pela população.

Esta solução é sobretudo eficiente nos países de clima ameno, onde os “servos”, os “descartáveis”, podem sobreviver quase sem custos para os restantes. É por isso que a escravatura nunca foi possível nos países mais a norte, os escravos ou morreriam de frio e fome ou sairiam demasiado caros.
A guerra norte/sul dos EUA não teve um objetivo “humanitário”, destinou-se primariamente a destruir a vantagem competitiva do Sul que podia usar escravos enquanto o norte não podia. As guerras são sempre ditadas pelos interesses e justificadas pelos princípios morais. Não quer isto dizer que quem promoveu essa guerra não tivesse imperativos morais, mas ela só foi possível porque havia interesses de poder (políticos ou financeiros) nela.

A transição ditadura – democracia não aconteceu em todo o lado; na Rússia substituiu-se a ditadura dos senhores pela do povo (em teoria). A queda do regime comunista da URSS mostrou a impossibilidade de um sistema não legitimado por votos se manter se não estiver apoiado pela satisfação popular, ou seja, pela continuada subida da qualidade de vida do povo. A URSS não crescia economicamente, não estava em guerra nem endeusava os líderes, o Poder Político tinha necessariamente de cair.

A China percebeu bem isto e desenvolveu uma teoria económica com um novo objetivo: a subida sustentada do nível de vida de todo o povo. Este é o único objetivo económico que serve o Poder Político na era da comunicação quando este poder não é eleito.
Compreendamos: num sistema democrático, basta promover a satisfação de 2/3 da população; com jeitinho, esse número até pode descer, temporariamente, até ½. Mas num sistema de poder não legitimado pelo voto isso não chega, agora que as pessoas dispõem de uma grande capacidade de comunicação e mobilização. Por isso o regime chinês fez esta opção radical: enriquecer toda a gente.
Nesse sentido a China desenvolveu uma política nova. Separou as pessoas entre camponeses e urbanos para melhor gerir o crescimento de cada grupo, criando economias separadas para cada grupo, cada uma com a sua moeda. Depois, sabendo que o desenvolvimento é fruto do “know-how”, pôs em acção um plano de obtenção de know-how que hoje é seguido em todo o mundo não-ocidental. O saber académico é fácil de obter, está nos livros e na net. O problema é o know-how específico das empresas. Para o conseguir, a China desenhou um processo de atracção de empresas estrangeiras, condicionado à transferência de know-how e à partilha dos lucros.

Assim, uma empresa estrangeira para se instalar na China precisa de um sócio nacional (nas grandes atividades, os sócios são empresas feitas pelo estado com o dinheiro impresso pelo banco da China). Isto garante que essa actividade tem interesse para China, que há transferência de know-how e que pelo menos metade dos lucros fica na China (cá, as grandes empresas transferem a totalidade dos lucros para fora). As grandes atividades, como o fabrico de automóveis, estão sujeitas a um plano a longo prazo que visa que no fim dele a China tenha todo o know-how necessário. A Volkswagen está na China a prazo, até 2030. Mas este é um negócio muito bem construído pelos alemães, que ficarão fornecedores dos componentes de alto valor acrescentado do carro chinês e com garantia de não concorrência no mercado europeu pelo menos até essa data (se pensavam que íamos ter carros chineses baratos, desenganem-se).
 Esta teoria chinesa parece ser hoje seguida em todo mundo à excepção da Europa.

Por outro lado, também as democracias de países pequenos tiveram de tomar outro rumo para sobreviverem. Assim, na Dinamarca, Suécia e Noruega existe uma forte coesão social sem descartados (de qualquer forma, eles não poderiam sobreviver nesses climas...). Esta foi a solução destes países para resistirem à Alemanha, França e Inglaterra. A Holanda, Bélgica e Luxemburgo tornaram-se uma espécie de protectorados da Alemanha e da França.

Portanto, consoante a organização política, temos 4 casos diferentes de sociedades:
Numa democracia típica, existe 1/3 de “descartados”; o nível de vida da classe média pode ser estático porque basta a existência dos descartados para gerar um sentimento suficiente de satisfação. É o caso dos EUA.
Numa ditadura moderna, ao contrário, o nível de vida de toda a população tem de subir continuamente, pois só isso legitima o poder. A participação das pessoas no Poder é assegurada através do poder local, democraticamente eleito e com peso na decisão política central. É o caso da China. Mas note-se que neste sistema há um senão: o Poder Político está sempre apoiado na existência de um perigo global, um inimigo, porque nessas circunstâncias as pessoas estão menos dispostas a contestar a liderança. O Passos Coelho firma-se no Poder baseado na necessidade de “salvar o País” (numa Democracia, os eleitos têm de ser responsabilizados pelo programa que apresentaram às eleições; desta forma, este governo escapa a esse escrutínio). Num sistema como o Chinês, quando houver um crescimento mais débil, podemos esperar que o Poder Político crie um conflito, como uma guerra com o Japão (coisa que não desagradaria ao Japão, que também precisa de um inimigo para compensar a falta de crescimento).
As pequenas democracias, por seu lado, ou perdem a independência ou assentam numa forte coesão social. É o caso dos países nórdicos e, penso, de alguns “pequenos” (à escala asiática) países asiáticos
Subsistem ainda umas ditaduras clássicas, assentes no controlo e manipulação profunda da informação política. É o caso da Coreia do Norte.
Parece que esgotei os sistemas políticos relevantes, mas não, falta um: a Europa!

Na Europa acontece uma coisa extraordinária: o seu sistema político é tal que o país mais forte manda na Europa toda! Então, é a classe média alemã que manda na Europa. Isto não acontece por acaso nem por burrice, é de propósitoas elites europeias não iam deixar os destinos da Europa nas mãos da maioria, não é? Então, criaram um sistema em que o Poder Político europeu depende apenas da classe média alemã. Naturalmente que esta escolherá o partido que se propuser transformar em “descartados” o resto dos Europeus.
Compreendamos: a classe média alemã pensa dos povos do Sul o mesmo que a classe média portuguesa pensa dos nossos descartados – esses preguiçosos e ignorantes que só entendem a linguagem do chicote; e vai eleger (já elegeu) o partido que tiver como programa a escravização destes calões do Sul. Aliás, isto é histórico, sempre que puderam os alemães promoveram a escravatura, tanto dentro como fora da Alemanha... os ucranianos que o digam... A classe média alemã pensa que esta é a solução que maximiza o seu interesse e, por isso, desenvolve a teoria moral que a suporta – a teoria de que estes povos não merecem mais do que a escravatura. Isto é normal, estou farto de ouvir a classe média portuguesa dizer isto dos operários, os alemães não são piores do que nós. Nós, humanos, somos muito menos inteligentes do que presumimos.
Portanto, face à estrutura política da Europa, é fácil perceber o sentido da sua evolução: as classes médias alemã e francesa (que pode atrapalhar os interesses alemães) vão continuar como estão; os restantes povos passarão à categoria de “descartados” e serão a fonte de mão-de-obra barata que tornará a indústria “europeia” (alemã) imbatível no mercado global (assim pensam eles, esquecendo que os outros países do mundo não são parvos e nem todos os líderes são compráveis).

Sobre a Guerra
Um pequeno apontamento sobre este importantíssimo processo do Poder: a Guerra.
A Guerra tem várias utilidades; no passado, tinha o importantíssimo papel de evitar a sobrepopulação. Hoje já não tem esse papel na generalidade dos países mas continua a ser fundamental para o Poder. Quando há Guerra, não há contestação ao Poder enquanto as pessoas se sentirem em perigo; quando acaba a guerra, é necessário recuperar da destruição por ela causada, o que inicia um período de crescimento onde o Poder se suporta. Portanto, ao Poder convém um ciclo crescimento-guerra-crescimento-guerra... tem-se feito os possíveis para inventar outras maneiras de manter o crescimento alto (a globalização, as novas tecnologias, etc), de inventar perigos diferentes (aquecimento global) mas parece que ainda não passamos sem recorrer periodicamente à guerra.

Bem, mas se acham isto negro, esperem até perceber a estrutura do poder Financeiro. Este vai afectar todo o mundo ocidental. No próximo texto.


2 comentários:

UFO disse...

SEM COMENTÁRIOS.
Obrigado por mais este elucidativo post.
Agora andamos todos com a cabeça metida entre o rabo, e nem tempo têm para ler, pensar e escrever. O medo do dia de amanhã deprime.
Somos um povo assassinado, um país agonizante.

alf disse...

Olá UFO

bem, eu tempo tb não tenho mas não é por isso rsrs. É mesmo nestas alturas que mais temos de pensar, nada de desânimos!!!!

Essencialmente, penso que somos um povo ignorante. Os povos são. em média, todos iguais,o que faz a diferença é o que sabem e o que entendem do mundo; e nós sabemos muito pouco, só o que vemos da janela da sala, como dizia o Salazar... e a culpa é das elites que tudo fazem para que assim seja, sabendo que na diferença de conhecimento é que se alicerça a desigualdade