sexta-feira, janeiro 18, 2008

Ecopoese



No post “A Manjedoura da Vida”, o Mário referiu a existência de uma teoria, a Ecopoese, que defendia que a Vida exigia uma atmosfera terrestre do tipo da que eu estava a apresentar.
Obtive essa atmosfera a partir do conhecimento de um fenómeno de afastamento entre a Terra e o Sol; verifiquei que ele poderia explicar certos mistérios como a formação das dolomites e do petróleo; e verifiquei que para a produção industrial de fenómenos de tipo associado à origem da Vida, nomeadamente a formação de compostos azotados e o crescimento de cristais, se usa o tipo de condições existente nessa atmosfera.

Dessa forma mostrei que essa atmosfera era não só suficiente para explicar esses fenómenos mas também possivelmente ideal, pois corresponde às condições que usamos industrialmente. Mas não mostrei que essa atmosfera era necessária, que em condições mais “frias” é impossível ocorrer a formação da Vida.

A demonstração da condição necessária é importante para mostrar que o modelo actual está errado, é impossível. Eu apenas mostrei que o meu modelo será melhor, não que é o único.

Ora a teoria da Ecopoese, de Raul Félix de Sousa, faz essa coisa fascinante: a partir da química da Vida conclui que o modelo actual é impossível e que a química da Vida exige condições do tipo das que apresentei.

Contactei o Autor, que muito amavelmente me ofereceu um exemplar do seu livro, bem como diversas considerações sobre o que apresentei nos posts, de que transcrevo excertos:


O fato é que depois que o experimento de Miller pareceu confirmar as idéias de Oparin, Haldane e Urey, a atmosfera redutora tornou-se dogma, martelado em todos os livros de biologia e em inúmeras (milhares) publicações da literatura primária. A ponto que, tautologicamente, a própria existência da vida passou a ser citada como prova. Observe-se que, como já disse, entre os geólogos nunca houve um tal consenso.A possibilidade de um período com uma atmosfera hipercrítica de H2O ou de CO2 é real, e a meu ver, altamente provável. Os valores de 260 atm para H2O (volume total da água contida nos oceanos e outros reservatórios terrestres de água) e 60 atm para o CO2 (carbonatos da coluna sedimentar e outros depósitos de carbono), que podem espantar a muitos são, na verdade, valores mínimos. A depleção de gases nobres da atmosfera terrestre aponta para a perda hidrodinâmica, ocorrida nos períodos iniciais de formação da atmosfera, que cito no livro. Com base na abundância natural dos elementos deveríamos ter aproximadamente tanto Neônio quanto Nitrogênio na atmosfera, por exemplo. Estima-se que a água que permanece em nosso planeta seja apenas uma (provavelmente bem pequena) fração da água original que já o envolveu. Com relação ao CO2, podemos fazer considerações semelhantes. Não há nenhuma razão para termos menos CO2 que Vênus. A Terra é composta do mesmo material condrítico original que Vênus e tem uma massa maior. Além disto é muito mais difícil para a Terra perder CO2 que Vênus, onde já há muitos bilhões de anos todo o CO2 deve estar na atmosfera. ... Não seria grande surpresa se tivéssemos algo como o dobro das 60 atm estimadas.
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Ocorre entretanto que uma atmosfera de H2O hipercrítica dificilmente permitiria a existência de qualquer composto reduzido de carbono.
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O CO2 hipercrítico, por outro lado, pode existir em condições fisicamente bem mais brandas, compatíveis com o mundo orgânico, e é também quimicamente pouco agressivo com relação aos compostos orgânicos, como provam vários de seus usos industriais modernos. Ocorre entretanto que nas condições em que poderia formar-se na Terra deveria forçosamente interagir com a água líquida, muito mais abundante. A interação entre CO2 e H2O é complexa. Formam-se H2CO3, íons HCO3-, H3O+, uma parte do CO2 dissolve-se sem se combinar ou ionizar. Nem sei se suas características físicas são descritas para toda a gama de temperaturas e pressões. Agindo sobre o substrato mineral da crosta dissolveria uma série de íons metálicos e permitiria a formação de inúmeros compostos não metálicos. É a este meio que denominei 'hipercarbônico', detendo-me sim, sobre suas caraterísticas químicas reactivas. E sobre como estas poderiam conduzir ao surgimento dos processos metabólicos do mundo vivo, essência do modelo da Ecopoese.

Sobre a catástrofe do Oxigênio devo dizer que concordo certamente que o aligeiramento da atmosfera causado pela absorção ou condensação dos seus demais componentes terá alterado drasticamente a sua concentração percentual. Mas há mais coisa aí. Em primeiro lugar, os valores utilizados como concentrações iniciais são apenas conjecturas. Há valores os mais díspares espalhados na literatura científica, mesmo considerando apenas os modelos 'redutores'. Além disto, oxigênio não é um gas inerte. Pelo contrário, é altamente reactivo, e sua concentração é governada pela interação dinâmica entre seus sumidouros (sinks) e suas fontes (sources). São considerados sumidouros as interações com materiais reduzidos da litosfera e gases vulcânicos reduzidos. São fontes a fotólise atmosférica da água, abiótica, e a fotossíntese oxigênica, de natureza biológica. O argumento tradicional, que contesto no livro, é que a fonte abiótica seria de longe insuficiente para compensar o sumidouro, o que garantiria uma atmosfera sem oxigênio, pré-condição, segundo a visão clássica, para a origem da vida, o que também contesto.



Para quem quiser um entendimento mais profundo destas questões, tem no capítulo I do livro de Felix de Sousa, que pode descarregar na página da Ecopoese, a melhor introdução ao assunto que eu já vi.
Um pouco como na época de Galileu, novas ideias, nas margens da ciência oficial, começam a unir-se para dar novas asas ao conhecimento.

Daqui o meu abraço transoceânico ao Raul!

12 comentários:

Manuel Rocha disse...

Já lá fui...muito interessante !!

Vá lá que não fui eu quem publicou estas citações...ainda me aparecia por lá um ET a acusar-me de estar a debitar para intelectuais...::)))

antonio ganhão disse...

...em condições mais “frias” é impossível ocorrer a formação da Vida.

Eu estou de acordo. Nada como mulheres quentes! A atmosfera inicial devia de ser quente e húmida.

alf disse...

Manuel

eheheh... cá se fazem cá se pagam, não é?

este blogue tem janelas... de vez em quando avistam-se paisagens diferentes...

alf disse...

António

Pois... como nos casamentos ehehe... uma atmosfera inicial quente e húmida que vai arrefecendo ao longo do tempo... dizem os entendidos...

quando escrever o livro vou-me lembrar desta imagem!

Diogo disse...

Alf: «eu disse que os átomos constituem sistemas sucessivamente mais complexos, que sistemas muito complexos identificamos facilmente como "vida", que sistemas muito pouco complexos identificamos como " não vida"»

Continuamos sem ter uma definição inteligível de vida.

alf disse...

diogo

A sua pergunta pressupõe que existe uma fronteira entre "vida" e "não vida". É isso que uma "definição" faz: identifica a fronteira, que permite separar o que é do que não é.

Ora eu penso que não existe fronteira entre Vida e "NÃO VIDA", logo não pode existir "definição".

Por isso eu disse que há organizações que sabemos identificar como "vida", outras como "não vida", podemos enumera-las, mas como não há fronteira não há definição.

Para quem é religioso, crente, num deus criador, que não sei se é o seu caso, isto pode parecer dificil de aceitar. Mas não é a mim que cabe o ónus de apresentar tal definição: é a quem pensa que a Vida resulta de um acto divino.

Para quem pensa que se trata de um processo natural, o que existe é o aparecimento de organizações sucessivamente mais complexas; a partir de certo grau não temos dúvidas em designar por "vida" (há critérios definidos para isto), abaixo de certo grau dizemos que é "não vida", mas no meio há coisas que não sabemos classificar, como os virus, ou os prions.

O não haver definição também não implica que a vida não possa ter uma origem "divina"; por isso eu lhe pedi a definiçáo de "recta", para entender que "definir" não é aquele processo trivial que se aprende na escola; talvez porque a nossa inteligência tem limitações...

Diogo disse...

Alf,

Eu não acredito em Deus, portanto rejeito a origem divina da vida.

Aceito, igualmente, que existe uma «vida», uma «não vida» e uma «terra de ninguém»

O que me parece insuficiente é considerar «vida» como um «sistema muito complexo de átomos». Porque é que essa «complicação atómica» se esforça por se manter, por se replicar?

Anónimo disse...

Já passei por la e descarreguei o capitulo =)
Vou ver se leio alguma coisa, tenho que aumentar a minha cultura ao nivel da biologia =P

alf disse...

diogo

ai ai que o blogger prega-me partidas... eu já tinha respondido mas pelos vistos não "entrou"... é pena porque tinha-me saído bem... agora vai mais à pressa mas aqui vai.

Eu não sei se a Vida tem ou não origem extranatural; não sei se existe alguma divindade, se seres mais evoluidos que tivessem criado a vida na Terra, se o conhecimento da Vida já tem raizes num Universo anterior, enfim, posso pôr uma miriade de hipóteses mas a verdade é que nada posso afirmar acerca da validade desta ou daquela.

Mas o que é importante é que isso é irrelevante! É que os fenómenos do universo são, pelo menos em 99,99% dos casos, unicamente consequência das propriedades físicas.

Se existem alguma entidade exterior capaz de intervir no mundo natural, isso pode ser muito importante a uma escala individual mas é irrelevante para a ciência. A ciência não tem nada a ver com a religião. Não a nega nem a afirma, é independente, porque uma ocorrencia fora das leis da natureza é a excepção, não é a regra.

Podia dedicar-me a definir o que seja "vida". Mas devo ter consciencia de que não sei o suficiente para isso - afinal, até só conheço a vida que existe na Terra!

Posso fazer uma enumeração do que considero vida e do que considero "não-vida"´; depois buscar propriedades comuns à vida e inexistentes na não-vida. Obtenho uma definição?

a resposta é não! Exemplo: toda a vida terrestre nasce doutra vida e está preparada para se continuar; por isso qualquer definição de "vida" lhe atribui a capacidade de reprodução. Mas é evidente que eu posso conceber uma máquina que fabrique "seres vivos" - então estes não se originaram por reprodução nem são reprodutores.

Não existem seres destes actualmente; mas podem vir a existir, contrariando todas as definições de vida actualmente existentes.

No liceu ficamos com a ideia de que "definir" é básico e essencial; mas não é assim. Por exemplo, não há uma definição de "recta". Algo aparentemente tão simples e, no entanto, tão dificil de definir...

alf disse...

raiz de carla

Cuidado! esse capítulo atira-a de caras para as fronteiras do conhecimento - um mundo imerso em duvidas, em hipóteses multiplas, em incertezas - completamente diferente do sofá de certezas em que o ensino está instalado...

Diogo disse...

Alf: «Podia dedicar-me a definir o que seja "vida". Mas devo ter consciencia de que não sei o suficiente para isso - afinal, até só conheço a vida que existe na Terra! Posso fazer uma enumeração do que considero vida e do que considero "não-vida"´; depois buscar propriedades comuns à vida e inexistentes na não-vida. Obtenho uma definição? a resposta é não!»


Donde, se eu não sei o que é "vida", se eu não sei como se passou de "não-vida" para "vida", como posso estar a discutir as condições mais favoráveis para o surgimento de um fenómeno que desconheço?

Alf, eu não estou a querer implicar. Mas ainda ninguém sabe o que é a vida. Sem o saber, como teorizar sobre as causas do seu aparecimento?

alf disse...

Diogo

Exactamente por isso: para descobrir! Se se soubesse não era preciso teorizar, não lhe parece? Se não se sabe, ou se vai à procura ou nunca se chega a saber, não é?

Não é bem teorizar sobre as causas é teorizar sobre o como ela apareceu.

Neste blogue já dei várias achegas: comecei por mostrar que a inteligencia é uma propriedade natural, a natureza é inteligente no sentido em que se modifica no sentido da complexização; depois dei suporte às afirmações dos geólogos de que a Terra teve um passado quente e expliquei porquê: porque esteve mais perto do Sol. Mais adiante eu provarei que assim é. Sabendo que a Terra esteve masi perto do Sol ganhamos condições para entender melhor que processos podem ter conduzido à Vida e como ela evoluiu. Isso é importante porque nos dá uma melhor perspectiva do nosso papel.

Mas vá seguindo o blog e irá percebendo como estas coisas acabam por formar um todo que ultrapassa a imaginação...