sexta-feira, maio 11, 2007

Desvio 2 - Ordenados Baixos


A interacção com os leitores está frutuosa, nomeadamente com o António e a Laura-anda-à-chuva, e aqui vai mais uma ideia nela originada .


O que é que faz os ordenados serem altos ou baixos? A ganância dos patrões? A luta dos sindicatos? A intervenção do Estado?

Consideremos um cenário de empresas pouco sofisticadas, de baixa eficiência e produtividade. Não carece de empregados muito eficientes, não precisa de seleccionar os seus trabalhadores, qualquer um serve. Os ordenados serão baixos.
Consideremos o caso das empresas altamente eficientes. Cada posto de trabalho é um lugar de responsabilidade, onde o trabalhador tem normalmente de ter uma visão geral da empresa, onde é um componente importante do sistema. A sua eficiência reflete-se na eficiência da empresa. O patrão tem de seleccionar os empregados e pagará muito mais, dependendo da oferta do mercado.

Num cenário como o português, com muitas pessoas com baixa formação e empresas de todos os tipos, a tendência será para a existência de um grande leque salarial.

Consideremos agora que o sistema educativo é altamente eficiente e todas as pessoas são altamente qualificada. Então, mesmo que as empresas sejam todas altamente eficientes, exigindo trabalhadores muito competentes, os ordenados são todos baixos porque volta a não ser preciso selecção, todas as pessoas são qualificadas. Paradoxal, não é?


Qual é a solução para evitar o esmagamento dos ordenados? Simples:

Cada trabalhador tem de ser um empresário em potência. Se não lhe pagam o que ele quer como empregado, então ele tem de ser capaz de montar a sua própria empresa. Sozinho ou com outros. E isto que lhe dá poder negocial.

Isto exige dois tipos de condições:

1- um sistema educativo que prepare as pessoas para a vida empresarial
2- um adequado sistema de apoio (financeiro, estatal) à criação de novas empresas

Se o sistema educativo for capaz disso, o resto vem por arrastamento.

Conclusão: uma escola que não prepara para a vida empresarial não prepara os seus alunos para o futuro

13 comentários:

Anónimo disse...

1- Refuto liminarmente ser uma funcionária pública que o ensina a ser. A minha formação para o ensino compaginava a pedagogia para a autonomia ( Flávia Vieira), em 1994 - e antes!
Ensino(amos) a pensar! Acontece que o ensino é massificado e esta ilusão democrática do ensino para todos provoca frustrações porque não podemos fzer todos o mesmo, ser todos ricos, e etc. Ainda assim, mesmo nas classes consideradas «desfavorecidas»-que palavra!- depende de onde se olha, não é?- há alunos que conseguem ultrapassar as enormes dificuldades que os rodeiam e mesmo assim crescer autonomamente.O dinheiro mexe mais que a educação, pois este é o motor...

2-Existem em Portugal cursos profissionais no Ensino Secundário que ensinam a criar uma empresa, inclusivé,no ano passado trouxe a ANJE à escola falar com esses alunos, porém quem frequenta esses cursos são normalmente os maus alunos. E esta? Dá que pensar?
Laura-que-anda-na-chuva

alf disse...

Ensinar para a autonomia é sem dúvida uma antiga preocupação da Laura. Louvo o seu empenho. Aproveito para dizer que existem excelentes professores e em quantidade. A fulcro da questão não está no professor, está no Ministério, nos objectivos traçados para o ensino. Não me parece que ensinar para a autonomia seja um objectivo prioritário... ou estou enganado?

O que diz no ponto 2 dá muito que pensar... ou não dá, no fundo é o que eu já penso. A minha experiência é a de que grande parte das empresas que existem em Portugal são de pessoas de baixa formação, que não tiveram outra saída que não fosse.. ser empresário. Ser empresário é para quem não pode se empregado, esta é a mentalidade! Logo, os "bons alunos" vão ser empregados, não precisam de saber criar empresas! Aos maus alunos é que não resta alternativa... E esta hem?!? Que futuro para um país que pensa e educa assim?

alf disse...

Este "desvio" afinal parece ter-nos trazido a um resultado importante nesta demanda das razões da crise:

...a falta de formação em empreendedorismo!

O problema existe na escola mas não se limita a ela,

.......é um problema cultural

(não adiante a escola dar formação nesta área se não passa pela cabeça dos alunos vir a ser empresário)

Por último, a minha referência à condição de funcionário público dos professores foi infeliz. Eu tenho a maior consideração pelos fp, eu próprio o fui longos anos. O que eu quiz dizer é que não está na mão dos professores, por moto proprio, induzir essa mudança de mentalidade, quanto mais não seja porque não conhecem o que seja a realidade empresarial, pois essa não é a sua realidade.

antonio disse...

Se a Laura lhes dá esse sentido de autonomia, dou-lhe os meus parabéns, pois a partir daí o céu é o limite.

O problema é que culturalmente esse nosso céu está muito cá por baixo...

Mas uma coisa é certa: num supermercado em Portugal a produtividade por litro de leite vendido é superior à de Espanha, pela simples razão que o salário é mais baixo e o valor acrescentado por litro de leite é sensivelmente o mesmo (embora cá seja mais caro devido aos impostos.)

Noutras áreas de trabalho intensivo e não qualificado, a nossa produtividade tem sempre que ser superior à do resto da Europa, ou então existe algo de errado na gestão.

alf disse...

Amigo António, penso este é um tema mais complexo do que parece. A produtividade depende do Sistema, da sua eficiência, não depende dos ordenados, por paradoxal que pareça. Os ordenados são uma mera questão da oferta e procura, sujeitos pontualmente a alguma influência de governos, sindicatos e patronatos.

Este assunto merece a abertura de um novo tópico de discussão, que fica prometido para breve... e pode contar com inesperadas revelações...

antonio ganhão disse...

Ui!

Anónimo disse...

eu concordo com o Alf e acho que a formação "para" o empreendorismo é importante e está em falta, mas discordo que isso seja uma solução que se possa aplicar a todas as pessoas, aliás penso que só excepcionalmente...

claro talvez se possa melhorar aí, também aí.

por eu exemplo eu, não tive essa formação mas também não tenho esse perfil. talvez essa formação me tivesse moldado de outra maneira, mas talvez não... por exemplo a aversão ao risco (que invalida qualquer pretensão empreendedora) será uma parte da minha maneira de ser muito antes da influência do sistema de ensino

por outro lado terão sempre que existir pessoas com vários perfis, complementares... criativos e executivos, técnicos e comerciais, teoricos e práticos, visionários e pragmáticos, etc...

penso eu que é na correcta combinação e articulação destas características que se estruturam as organizações produtivas...

o mercado de trabalho coloca as pessoas através da avaliação das suas competências técnicas e experiência passada e não dos seus verdadeiros perfis

assim, um negócio pode ser menos produtivo do que poderia, ou até mesmo falhar, porque, apesar de ter reunido as valências técnicas correctas (por exemplo, 1 financeiro, 2 comerciais, 3 administrativos e 4 técnicos) não possui os perfis necessários para se desenvolver (por exemplo, está cheio de pragmatismo mas não tem nenhm visionário)

regressando à questão da formação, não invalidando que o problema da produtividade esteja relacionado com tantos outros factores (como os já aqui apontados ou toda a panóplia comum de factores históricos e culturais) gostaria de acrescentar mais um:

na minha opinião, todos os cursos deviam desenvolver (ou pelo menos porque dar possibilidade de) a vertente orientada para a aplicação prática da matéria tal como ela é utilizada pela sociedade

penso que é muito fácil ver onde vão parar os estudantes de determinado curso e passar prepará-los para isso mesmo

os biólogos devem (poder) aprender a gerir um laboratório, os economistas devem (poder) aprender a montar um centro de estudos, os informáticos devem (poder) aprender a trabalhar os clientes e os projectos

ou sejam todos devem (poder) ter formação em contabilidade, organização, gestão de projectos, logística, fiscalidade, na mexacta medida em que são essas as tarefas que eles vão eventualmente desempenhar!!!

e como nada disso acontece quem tem que ensinar essas coisas é o mercado de trabalho, o qual faz isso de forma caótica, aleatória e muitas vezes destrutiva

chegado à "empresa" ou "instituto" o profissional não tem ferramentas para ajudar a transformar, antes pelo contrário é ele mesmo transformado segundo a regra do "aqui as coisas fazem-se assim"

alf disse...

Inteiramente de acordo! Eu também não tenho qualquer vocação para empresário mas conheço quem tenha. Como não tenho para botânico ou para historiador e isso não invalida que não tenha aprendido algo disso. A questão fulcral é que os elementos para essa formação têm de estar disponíveis na escola.

E o andrezero vai ainda mais longe que eu ao afirmar que:

ou sejam todos devem (poder) ter formação em contabilidade, organização, gestão de projectos, logística, fiscalidade, na exacta medida em que são essas as tarefas que eles vão eventualmente desempenhar!!!

e acrescenta:

e como nada disso acontece quem tem que ensinar essas coisas é o mercado de trabalho, o qual faz isso de forma caótica, aleatória e muitas vezes destrutiva

Pois é, segundo o andrezero, a escola já não prepara as pessoas nem para empregados no nosso complexo sistema actual!

Patrícia Grade disse...

Pois é meus amigos, gostei de ler até aqui, mas acho que anda tudo um bocado esquecido de uma coisa...
Na antiga Grécia, as Akademias eram locais de culto da sophia, do conhecimento, o gosto pelo saber. As escolas passaram de akademias a fábricas de mentes repletas de conhecimento oco. Não há um gosto pelo saber, porque se começa pela forma como o ensino está delineado. Os professores são obrigados a seguir parâmetros de ensino que volta e meia mudam. Têm de andar a par da legislação para não serem prejudicados no seu trabalho e enquanto isso, tÊm ao mesmo tempo que andar a par das novidades nos programas curriculares, sob pena de terem de explicar tintim por tintim porque é que não leccionaram todo o programa como lhes foi pedido.
No meio disto tudo esqueceu-se que o aluno não está na escola para se tornar um empresário, nem sequer para se tornar uma pessoa activa no mercado de trabalho. A escola não foi feita para preparar as pessoas para o mercado de trabalho. A escola foi feita para saciar uma das nossas necessidades básicas e que nos acompanha até ao fim dos nossos dias - a busca pelo conhecimento. Logo que nascemos abrimos os olhos e no nosso cérebro ainda em crescimento já nos perguntamos onde estamos, porque estamos aqui... À medida que vamos crescendo e que as multiplas peças do puzzle se vão encaixando, as nossas perguntas passam a ser outras...
Já se perguntaram por que raio leem um livro de um filósofo grego e parece que os temas são os de hoje?
Já alguma vez se questionaram por que raio é que os erros do passado continuam a ser cometidos?
A escola foi inventada para facilitar o acesso ao conhecimento, para globalizar o ensino de coisas que facilitariam a nossa vida, para que a cada nova geração não fosse necessário ter de inventar o fogo, o microscópio, a cura para a hepatite...
Hoje em dia o ensino está de tal forma massificado, que mais parece que o conhecimento é uma obrigação e não o prazer, a necessidade básica que realmente é... e isso minha cara Laura, perdoe-me porque já vi que não é assim consigo, mas é muito culpa de alguns professores que, não preparados para o mercado de trabalho, resolvem ir dar umas aulitas... à falta de melhor...

alf disse...

A escola deve preparar para vida laboral e pode ser ao mesmo tempo um espaço de pesquisa. O que não deve ser é uma máquina de injectar conehcimentos superficiais e mais ou menos inúteis.

No meu tempo estudava-se filosofia pelo calhmaço do sr. Bonifácio que, certamente movido pela melhor das intenções procurava condensar toda a busca de conhecimento ao longo dos séculos. Eu, como todos os meus colegas, não tinhamos dúvidas: filósofos eram loucos ignorantes. Dizia-se: a Filosofia é a disciplina com a qual ou sem a qual se fica tal e qual.

Uns anos depois caiu-me nas mãos um livro de textos escolhidos de filósofos, que passara a fazer parte do programa de Filosofia. Fiquei fascinado, devorei o livro.

Creio que o ensino, neste tipo de coisas, teve algumas grandes melhorias. Para se perceber alguma coisa de filosofia é preciso ler alguma coisa escrita pelos filósofos e não por outros que os interpretam.

mas continua a haver coisas verdadeiramente aberrantes. Por exemplo, vejo os jovens a estudarem resumos de livros para os exames. Mas agora a literatura pode-se resumir??? Claro que isto revela todo o estado das coisas: livros obrigatórios e provas a fazerem perguntas sobre a acção do livro para forçar os alunos a lerem! Que disparate! Os alunos deveriam ter prazer na leitura. E deviam ter uma ampla liberdade de escolha dos livros que querem ler. mas parece que não é assim.

A escola tem um risco sinistro: o de matar a curiosidade e a inteligência. Professores sem a visão e a compreensão da Indomável (bem vinda, é uma honra!) originam essa consequência.

Patrícia Grade disse...

Obrigada pelas boas vindas Alfie.
Quanto ao assunto em causa e já que falas nos resumos por que os alunos estudam, tenho uma história engraçada para te contar.
Há dois anos dei explicações de lingua portuguesa e francesa a uma rapariga que estava com uma enorme dificuldade em acompanhar as aulas da sua turma, porque trabalhava ao mesmo tempo. O problema dela era que precisava de fazer o exame nacional e a professora estava a dar as aulas, resolvendo com os alunos exames de anos anteriores...
Estas aulas não mais eram do que resumos dos exames que a própria professora tinha reslvido - ela limitava-se a dar as respostas aos alunos.
Como eu não estava por dentro do programa do 12º ano, comprei um pequeno livro de preparação para os exames de lingua portuguesa, com análises das obras. Posso-te garantir que era uma bosta. O que será fazer um resumo sobre a obra de Cesário Verde sem nunca ter saboreado um dos seus poemas?
Sabes o que fiz?
Na internet pesquisei os autores estudados, imprimi um sem numero de textos - poesia ou prosa, consoante o autor - e pusemo-nos a ler cada um deles. Digo-te que aquela rapariga nunca tinha lido um texto de Pessoa e apaixonou-se pela mensagem. Ao fim de pouco tempo ela sabia distinguir de olhos fechados os pseudónimos de Pessoa, apenas pela sensibilidade transmitida no texto.
Quando fez o exame ia cheia de medo e depois de o ter feito ficou desconsolada porque nenhum dos colegas tinha respondido da mesma maneira.
Nas nossas sessões limitei-me a ler com ela, a ver os textos À luz da história pessoal do autor, da sua biografia, dizendo-lhe que o escritor quando escreve não está a ver se o poema é decassilábico ou se a rima é emparelhada ou o raio que a parta. Ainda assim, era bom que ela soubesse o que isso era, para poder esquecê-lo quando lesse as obras. Ela lia e eu perguntava-lhe de quem ela pensava que era o texto, porque não lhe dava o nome, por isso te digo que ela distinguia o autor de olhos fechados!
Posso dizer-te ainda, que aquela rapariga teve uma das notas mais altas da escola dela nos exames nacionais de lingua portuguesa.
Vais dizer-me que foi mérito meu, eu respondo-te que o mérito é todo dela. O trabalho foi dela, o interesse foi dela, eu apenas lhe transmiti um bocadinho de curiosidade e gosto pela leitura de autores que são analisados na escola como se fossem coisas chatas e sem interesse.
Os nossos miudos interrogam-se porque raio têm de ler Herculano, Camões, Pessoa e mais tarde, quando são adultos e com um bocadinho de sorte até gostam de ler, descobre livros empoeirados em alguma biblioteca ou num alfarrabista e apaixonam-se pelos clássicos, porque eles disseram coisas que parece estarem eles a descobrir agora.
A escola não ensina porque tudo é normalizado, tudo é ensinado como se fossem verdades absolutas.
Se houve coisa que aprendi na Universidade e que me chocou imenso foi que não existem verdades absolutas. Se nas escolas isto fosse ensinado, garanto-te que a curiosidade seria enorme. Toda a gente teme a incerteza mas ela atrai-nos como a luz atrai as melgas. Talvez porque o fascinio de descobrir algo novo e diferente seja a luz que nos move...

Rui leprechaun disse...

Ena! Este profeta é muito prático cá prò Gnomo assim seráfico... ;)

Ou um Alf-Bill... those pearly gates I wanna feel! :)

Pois eu, nem empregado nem empreendedor... vagueio sem rumo nem amor! Ai... só o sonho da Sininho ilumina o meu caminho... ;)

Sim, isso faz sentido e tenho lido muito acerca dessa nova visão da economia baseada na iniciativa individual e a procura de nichos de mercado

Curiosamente, de certa forma até é isso que eu também faço, o problema é que sou um nabo em marketing, está visto. Além de não ser lá muito diligente, a mim já nem a necessidade aguça o engenho...

Depois... há pastores e pastoras... estas sim, encantadoras!

Ou a Mãe do Universo...

Rui leprechaun

(...alta Deusa a que me ofereço! :))

Rui leprechaun disse...

Puxa! Esta senhora Indomável também é uma altíssima sábia... eu não digo que só me apaixono por inteligências do outro mundo?! :)

Ai... se elas me aceitassem como pupilo, eu ficava mais contente que co'a noz o esquilo! ;)

E nem era preciso ensinar assim coisas muito difíceis e avançadas... o b-a-bá já serve por cá!

Mas sim, afinal parece que eu até disse algo acertado... mas foi só um texto copiado!

Pois estudar por prazer...

Rui leprechaun

(...é a vera fonte do saber! :))


PS: Hummm... e com uma Mestra linda ... eu aprendo mais ainda!!! :D