terça-feira, setembro 11, 2012

Existe um buraco negro no Deutsche??

(continuação)


Lentamente, direi mesmo a custo, voltei a pousar o olhar no Hans; ele recomeçou:

Como sabes, a actividade da banca dita de investimento gerou lucros superiores a 30% ao ano durante muitos anos; às vezes superior a 50%. Estes lucros não resultaram de nenhuma produção de riqueza, nada foi produzido nestes “investimentos”, estes lucros são o mero resultado de predação da riqueza alheia, ou seja, de “especulação”. Fez uma pausa para verificar se eu estava a par. Tranquilizei-o:

Sim, isso é bem sabido a nível dos economistas; todos os bancos e outras instituições financeiras trataram de entrar nessa actividade na medida das suas possibilidades. Cá, criaram-se dois bancos dedicados quase exclusivamente a isso, o BPN e o BPP.

Disseste uma coisa muito acertada: todos trataram de entrar nessa actividade ao nível das suas possibilidades! Ora quanto maior um banco, maior as suas possibilidades, não é verdade?

Sim… mais recursos financeiros para aplicar, maior pressão para aumentar os lucros, mais capacidade de contratar especialistas para inventarem novos processos especulativos…

Isso mesmo; portanto, os grandes bancos realizaram um imenso investimento especulativo, em produtos que o seu imenso corpo de especialistas foi inventando; e tudo isto em escala tanto maior quanto maior o banco. Uma nova pausa, a pedir para eu concluir o raciocínio. Fiz o que pude:

Queres dizer que quanto maior o banco maior o investimento especulativo… sim, e então? Evitei adiantar-me muito na resposta, quero saber o raciocínio dele

Maior o investimento e maior o corpo de especialistas em especulação, corrigiu-me. As duas coisas são importantes para perceberes o desenrolar dos acontecimentos. Agora, diz-me lá, qual foi a consequência deste enriquecimento tão rápido e sem produção real de riqueza?

Ah, isso é uma coisa que estou farto de tentar explicar aos meus amigos: quando essa predação da riqueza se tornou maior do que a riqueza produzida, a generalidade das pessoas começou a empobrecer; ora essa especulação só funciona enquanto as pessoas têm um horizonte de crescimento de riqueza. Quando as pessoas perceberam que estavam a empobrecer, fugiram desses esquemas e os balões especulativos estoiraram.

Claro, é o que acontece em qualquer esquema de pirâmide, vive da expectativa das pessoas de ganharem por entrar nele. É por isso que se diz que o sistema financeiro assenta na “confiança”, é “fiduciário”; só que não é confiança na honestidade dos processos e agentes, como muita gente pensa, é confiança em que o dinheiro aplicado vai gerar um retorno elevado– confiança em que ao entrar num esquema de pirâmide se vai sair a ganhar. Quando essa confiança desapareceu, as pirâmides estoiraram todas. As pirâmides e os investimentos de risco, foram os dois motores do enriquecimento rápido. Claro que os investimentos de risco dão retorno elevado a princípio mas depois colapsam. Disse, com ar definitivo, e recostou-se; tinha acabado a exposição e eu não estava a perceber onde queria ele chegar, não me tinha dado nenhuma novidade. Atrevi-me:

E …

Ergueu-se. Não estás a perceber? Não é óbvio? Quanto maior o banco, maior o estouro. Essas práticas agora ditas de tóxicas eram as práticas usadas por todos, quem as não usasse não tinha lucros, a banca de retalho rende pouco; e, quanto maior o banco, mais as usava.

Portanto…

Portanto – com ar impaciente - os grandes bancos, o Deutsche, o Barclay’s, estão falidos, falidíssimos! Têm um buraco dum tamanho incomensurável, do tamanho da riqueza especulativa de que se alimentaram durante muitos anos.

De repente, lembrei-me duma conversa que tive há dias com um gerente bancário; além de me explicar como é que eu podia fazer aplicações do capital que ele pensa que eu tenho mas não tenho sem pagar imposto, ou pagando muito pouco, dissera-me que o Deutsche tinha mudado radicalmente o seu perfil de investimento, que agia agora como os bancos em dificuldades, procurando apenas produtos de curto prazo e rendibilidade segura. Dei um sinal de concordância ao Hans e incitei-o a continuar:

E…

E então – como se dissesse algo óbvio - o seu imenso corpo de especialistas teve de encontrar maneira de salvar a situação; e a solução passa pela aposta em novas formas de especulação, pois só algo que permita grandes ganhos no curto prazo pode aguentar esses bancos.

E…

Bem, vamos por partes. A primeira coisa que podes começar já a perceber é que a única coisa que interessa à Alemanha agora é salvar o Deutsche. E depressa, depressinha, antes que o Zé povinho perceba – o Hans, nesta conversa em inglês, disse mesmo “Zé povinho”, o que me deixou boqueaberto. A Alemanha está a executar o plano traçado pelos especialistas em especulação do Deutsche, os matemáticos e outros cientistas pagos a peso de ouro, para salvar o banco; salvar à custa do dinheiro dos outros, naturalmente, não há outra maneira. O objectivo é sacar todo o dinheiro real, que é o dinheiro dos pobres, para tornar real o seu dinheiro especulativo.

Queres dizer que os países do Sul são verdadeiramente patéticos quando se viram para a Alemanha para os ajudar a enfrentar o ataque especulativo às suas dívidas soberanas?

Claro; a Alemanha é o motor desse ataque, delineado pelos seus especialistas. E o objetivo desse ataque é o empobrecimento dos povos, e rápido.

Estás a dizer que não podemos ter nenhumas esperanças que sejam tomadas medidas da parte do BCE ou da Alemanha no sentido de controlarem esse ataque?

Claro que não!!! Eles nem enganam, declaram mesmo que o que estão a fazer é empobrecer os povos. Empobrecer os pobres para que os ricos não abram falência. Vocês entrarem em recessão não é um falhanço da Troika, é um objetivo atingido; ou pensas que eles são tão estúpidos que não sabem aquilo que toda a gente sabe, que estas medidas implicam recessão e aumento do déficit, aumento do desemprego?

Sim, claro…

Legitimam esse empobrecimento com o argumento de que sem os ricos a sociedade inteira colapsa e por isso eles até estão a salvar toda a gente ao empobrecer os pobres e a classe média! Só que eles não estão a empobrecer toda a gente por igual, estão a empobrecer por baixo, é claro.

Isso é óbvio no caso de Portugal onde, ao contrário dos outros países, só existem medidas para empobrecimento do povo, nem uma medida reestruturante ou que afete os mais ricos.

E não é por acaso, como verás. Além de que os líderes alemães querem ganhar as suas eleições, por isso espalham a miséria nos outros lados. Vocês vão pagar o buraco do Deutsche. Vocês vão ser explorados até ao último tostão, e depois escravizados. Todos os direitos foram já riscados, como irás vendo, excepto o direito dos ricos à sua propriedade. Esqueçam a semana de trabalho de 5 dias, férias pagas, ordenado mínimo, horários de trabalho, reformas, etc, etc.; vão passar todos a ser pagos à hora (muitos já são) e miseravelmente, porque o poder negocial dos empregados desapareceu. E se as coisas ainda não estão mais graves é porque a Alemanha tem medo do Obama, que anda a investigar o Deutsche; mas se o Obama perder as eleições, vais ver o que acontece.

Sim, já vi qualquer coisa sobre os americanos exigirem investigar o Deutsch a pretexto de alegadas ligações ao Irão… Mas porque é que dizes que Portugal pode ter um papel crítico neste processo?

Bem, tenho de de explicar quais são as 3 formas de especulação. Pede-me aí outra cerveja.

(continua)

PS- este texto relata uma conversa, as opiniões do Hans (nome fictício) são as dele, não as do autor

72 comentários:

Diogo disse...

Alf, você escreveu aqui um chorrilho de asneiras. Quando é que você se decide a dedicar algum tempo a aprender alguma coisa acerca de finanças?


Retirado do livro "Política Monetária e Mercados Financeiros":

Concessão de crédito por um banco cria nova moeda na economia:
Suponha-se que um Banco concede crédito a uma família no valor de 100.000€. Esta operação pode ser registada da seguinte forma:

O Banco credita a conta de depósitos à ordem da família no montante de 100.000€ (algum funcionário do Banco altera os números que estão registados informaticamente na conta à ordem da família, somando 100.000€ ao valor que lá se encontrava anteriormente). Isto significa que, como resultado desta operação de crédito, passam a existir na economia mais 100.000€ de depósitos à ordem. Uma vez que os Depósitos à Ordem fazem parte da massa monetária, a operação de crédito fez aumentar o stock de moeda existente na economia.
[…]
Como vimos, a operação de crédito do Banco-A à família provocou o aparecimento de Depósitos à Ordem - e portanto de moeda que não existia antes - no montante de 100.000€. Vamos agora fazer uma afirmação mais forte: nas economias modernas, a principal fonte de criação de moeda é a concessão de crédito pelos Bancos Comerciais às famílias, às empresas e ao Estado. Repare-se que uma coisa é dizer que uma operação de crédito bancário cria moeda; outra, bem mais forte, é dizer que a maior parte da moeda que existe numa economia nasceu de operações de crédito bancário efetuadas até ao presente.

alf disse...

Diogo

Quando é que você mete na cabeça que essas coisas que diz são o B-A-BA, que toda a gente sabe disso, e que o problema está muito para além disso?

Os lucros de 30% e mais da banca de investimentos não têm a ver com isso; ou melhor, isso está na base, mas depois é o processo especulativo que gera os lucros fabulosos para alguns - lucros especulativos.

Esta crise não resulta dos lucros da banca de retalho, dessa actividade de depósito e empréstimo; resulta dos processos especulativos.

Essa multiplicação de dinheiro de que fala está estudada e condicionada, tem lucros limitados, ao contrário da especulação.

Suponho que no próximo texto você comece a perceber como a especulação é a base do império financeiro de que tanto fala e porque é que os seus agentes agem como agem.

Se o problema fosse só o que você diz, eles estavam sossegadinhos a ver o dinheiro multiplicar-se; mas só enriqueceriam a 8% e eles querem enriquecer a 30%

A multiplicação de dinheiro que resulta desse processo está associada ao desenvolvimento da sociedade e o dinheiro virtual é tornado real pelo dinheiro impresso pelo banco central; o ganho especulativo é que não pode ser tornado real a não ser pelo empobrecimento de quem tem o dinheiro real

PPP Lusofonia on Bank exposure disse...

Quando um devedor não pode pagar, o credor tem um problema, sim senhor

Evidentemente os credores originais tinham um problema, agora menor à medida que a exposição vai sendo transferida para credores oficiais como o BCE

vbm disse...

É facto que o sector bancário envolveu-se em especulação desenfreada, tipo "operação-pirâmide", e as falências em cascata só foram evitadas com a participação dos estados no capital dos bancos:

- os prejuízos acumulados, as imparidades das imoblizações especulativas estão a ser pagas com os impostos sobre as populações.

A outra "solução", a da emissão de notas redunda no mesmo efeito para as populações, erosão do poder de compra por elevação geral de preços, i.e., inflação.

Contudo, julgo que a especulação, em si, com supervisão pública do mercado de capitais, é uma actividade positiva e benéfica.

Basta reflectir que se meio mundo anda a comprar "gato por lebre" é bom de ver que é inevitável que é premiado quem simplesmente não é parvo!

E justamente, a especulação avisada é a bem sucedida na projecção do futuro face às tendências já detectáveis no presente.

Carlos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlos disse...

Caro vbm

“É facto que o sector bancário envolveu-se em especulação desenfreada, tipo "operação-pirâmide", e as falências em cascata só foram evitadas com a participação dos estados no capital dos bancos:

- os prejuízos acumulados, as imparidades das imoblizações especulativas estão a ser pagas com os impostos sobre as populações.”

O que acha da intervenção dos estados para salvar a banca com dinheiro das populações, sem que estas tenham tido qualquer responsabilidade ou benefício.

Carlos disse...

Estou a gostar.
Vou esperar pela continuação.
Vai demorar muito?

Diogo disse...

Alf,

O texto que coloquei acima, o tal B-A-BA, que você desconhece está qui bem explícito:


Um banco concede crédito a uma família no valor de 100.000€ para a compra de uma casa, creditando a conta de depósitos à ordem dessa família no montante de 100.000€.

Para essa operação, um funcionário do banco altera os números que estão registados informaticamente na conta à ordem da família, somando 100.000€ ao valor que lá se encontrava anteriormente.

Esse dinheiro não existia antes em lado nenhum. O banco cria-o a partir do nada digitando essa quantia no teclado de um computador.

Como resultado desta «operação de crédito», passam a existir na economia mais 100.000€ de depósitos à ordem. Uma vez que os depósitos à ordem fazem parte da massa monetária, a operação de crédito fez aumentar o stock de moeda existente na economia.

Ao fim de 30 anos, a uma taxa de juro de 5%, a família pagou ao banco um total de cerca de 255.000€, dos quais 155.000€ são juros.

Resumindo, o banco inventou 100.000€ que emprestou com juros a uma família, e esta, ao fim de 30 anos, entrega os 100.000€ inventados pelo banco mais 155.000€ em juros, estes bem reais. A família foi espoliada pelo banco em 155.000€ de juros sobre um capital que o banco inventou e lhe «emprestou».

Esta fraude sem nome acontece quotidianamente em todos os empréstimos dos bancos comerciais às famílias, às empresas e ao Estado. Haverá roubo maior na história da civilização?

vbm disse...

«A intervenção dos estados para salvar a banca com dinheiro das populações», é inevitável porque a banca-rota, a não circulação do dinheiro, é morte súbita de qualquer sociedade.

Agora, a injustiça de «as populaçõe não terem responsabilidade ou benefício» no caos ameaçado e evitado à sua custa é parcialmente um facto. Na verdade, não é o cidadão comum o directo responsável pelo descalabro.

Os estados deveriam ser extremamente punitivos em relação aos responsáveis bancários.

Na América, p.e., os administrdores financeiros foram tributados em 90% dos bónus recebidos, e o vígaro bolsista Maddoff, julgado e preso.

Em Portugal, os bancos - BCP e BPI - estão intervencionados pelo Estado e os suprimentos avançados serão convertidos em acções se os bancos não os conseguirem reembolsar dentro de um prazo curto; isso, a dar-se, equivale a uma nacionalização parcial.

A população, em todo o caso, não é totalmente inocente, porque cada cidadão tem a obrigação de não ser parvo, não se deixar intrujar e não dobrar a espinha aos poderosos, aos endinheirados e aos 'xicos-espertos'!

Diogo disse...

« “É facto que o sector bancário envolveu-se em especulação desenfreada, tipo "operação-pirâmide", e as falências em cascata só foram evitadas com a participação dos estados no capital dos bancos: - os prejuízos acumulados, as imparidades das imobilizações especulativas estão a ser pagas com os impostos sobre as populações.”»


O Monopólio Bancário Mundial é dono dos políticos e dos sistemas políticos de todos os países, assim como do poder legislativo, judicial e mediático.

A fantochada que começou com a «Crise do Subprime» nos EUA e se prolongou à Europa com a «Crise das Dívidas» foi totalmente deliberada, porque o Monopólio Bancário Mundial já sabia que os Estados lhes iriam devolver o dinheiro que eles supostamente perderam – too big to fail.

Naturalmente, deixaram falir alguns bancos (agências de facto) para dar um ar mais convincente à coisa.

vbm disse...

Nihils Obsta! :)

Não sei bem o que significa mas figuro que declara: "essa observação não objecta ao que foi dito" que relembro, repetindo:

- o estado não pode deixar de suprir os bancos de depósito em ruptura de pagamentos. A alternativa é o caos.

Ora isso mesmo é afirmado ser do conhecimento dos próprios bancos, o que é óbvio.

A 'fantochada' emergiu e emerge da desregulação da actividade bancária que deixou de distinguir operações de especulação das de fraude fianceira.

Porque se avançou para a desregulação?, perguntar-se-á.

Eu posso não ter razão mas suponho que se deveu à necessidade de abertura à China, - encetada politicamente por Nixon-Kissinger e prosseguida comercialmente por Reagan— com vista a fazer ruir o comunismo soviético.

Neste contexto, a taxa de rendibilidade dos investimentos produtivos nos EUA e na Europa diminuiu, embora se haja contido, e até diminuído, a proporção dos salários no rendimento nacional – o que foi compensado por ilusória miragem de riqueza pela facilidade de crédito ao consumo.

A par do esbulho fraudulento dos operadores bancários e financeiros, cuja ‘desalavancagem’ de crédito e restauração de solvabilidade está a ser paga por impostos, pode censurar-se a sonsice aburguesada das classes populares e trabalhadoras que se deixaram estupidificar na falácia do crédito fácil.

Restaurar a credibilidade da moeda e finanças do ocidente passa por

i) conter a especulação na produção (e stockagem) oligopolista do petróleo – que, no Médio Oriente, já nem é convertida em investimento urbanístico encomendado ao Ocidente, pelo que os fundos soberanos árabes acumulam-se, inactivos, em reservas de baixa rendibilidade —;

ii) obrigar a China a valorizar a sua moeda, permitindo uma elevação do nível médio de salários que paga aos seus trabalhadores e melhoria do seu nível de vida (e a China tem o seu crescimento demográfico contido);

iii) contribuir para conter o crescimento da população da Índia, do Sudeste da Ásia, da América Latina e da África — ao contrário da China, é de crer que um “tsunami bantu” em África e na América assolará o mundo no século 21, ceteris paribus.

Carlos disse...

“«A intervenção dos estados para salvar a banca com dinheiro das populações», é inevitável porque a banca-rota, a não circulação do dinheiro, é morte súbita de qualquer sociedade.”

Parece-me que, a não circulação de moeda, pela falências dos bancos, só acontece neste sistema, criado propositadamente desta forma para (e para poder) justificar o salvamento dos bancos.
Por ser uma função tão importante, penso que quem deve gerir a criação de moeda devem ser os governos de cada país (sou contra a moeda única). É perigoso? Desde que se legisle adequadamente para evitar abusos, não vem mal de maior. Este sistema provou que pode ser muito pior. Se me deixas cair, arrasto-te comigo. Parece-me que a chantagem e a subjugação é total, absoluta.(*)

“A população, em todo o caso, não é totalmente inocente, porque cada cidadão tem a obrigação de não ser parvo, não se deixar intrujar e não dobrar a espinha aos poderosos, aos endinheirados e aos 'xicos-espertos'!”

Já que o zé povinho se deixou levar(*), não seria mais útil para aprenderem de uma vez por todas, deixar cair os bancos e depois acarretarmos, todos, com as consequências? É que ao salvarem os bancos, da forma como os salvaram, ficou claro que há empresas que façam o que fizerem, vão ser, têm de ser, sempre salvas, para além de lhes ter sido lavada a imagem, e dissipa-se por várias gerações o efeito das consequências. Logo, o castigo não é proporcional, para além de outros irem pagar por algo que não tiveram responsabilidade, o que é injusto. Porque são por exemplo, essenciais ao funcionamento da sociedade? Da sociedade, com este sistema. Não nos podemos esquecer que a banca tem lucros desproporcionais com a criação de riqueza que fomentam. É também injusto para outras empresas que vão à falência e ninguém lhes joga a mão (o que considero correcto).

Posso permitir que qualquer governo, disponha do meu dinheiro a seu bel-prazer?

(*) “... pode censurar-se a sonsice aburguesada das classes populares e trabalhadoras que se deixaram estupidificar na falácia do crédito fácil.”
Pode-se. Mas qual é o grau de responsabilidade? Depois de autênticas lavagens permanentes de que o sector bancário é essencial e que são pessoas de bem, é natural que as pessoas que têm de trabalhar para comer, viver, não tenham tanto tempo para se poderem aperceber da tramóia. É permanente o incentivo à vaidade por exemplo. É permanente o incentivo a algo que todos gostam de ter, casa própria. Carro, que em muitos casos é essencial para se poder ganhar dinheiro. Enfim o zé povinho não tem especialistas (publicitários, psicólogos, etc) a trabalharem permanentemente para ele, para se poderem defender da quantidade brutal e permanente de estímulos ao consumo.
Penso que sim que têm alguma culpa no cartório, mas é tão ínfima, mesmo colectivamente, que é quase um desperdício de tempo estar a culpa-lo.

“Na América, p.e., os administrdores financeiros foram tributados em 90% dos bónus recebidos, e o vígaro bolsista Maddoff, julgado e preso.”

Penso que devido aos danos que causaram, e que eles estão conscientes, o castigo é anedótico.
Estou convencido que o Madoff só foi preso porque entalou muitos ricos.

Não deve este sistema financeiro ser abolido?

vbm disse...

Abolir a banca privada é porventura uma solução possível, mas julgo-a mais perigosa do que a influência do Estado na actividade autónoma dos bancos: através da regulação; pela defesa da concorrência; porventura, pela própria participação do Estado no sector através de banco próprio, nacionalizado.

A falência de bancos de depósitos paralisa por completo a actividade económica. Os capitais geridos pela banca são maioritariamente das empresas e das famílias. E mesmo os accionistas são outras empresas e o público em geral, mais do que alguns proprietários particulares.

A socialização da banca - e das grandes empresas - é um facto no sistema capitalista, aliás perfeitamente prospectivado por Marx.

O que precisa mesmo de ser controlado, para além da regulação da actividade dos bancos, são os dividendos distribuídos e os bónus dos administradores. A desigualdade económica é ineficiente e prejudicial para lá de certos limites, que o Estado não deve consentir ultrapassr sob pena de erodir a coesão da sociedade.

Carlos disse...

Caro alf

Houve alguns factores que me levaram a desconfiar dos “investidores” e de todo este sistema.
Apenas dois que me parecem mais flagrantes.

1º - Cada vez que Portugal punha dívida pública à venda, a oferta era sistematicamente ultrapassada, várias vezes, pela procura.
Ora, se a dívida pública portuguesa era um risco tão elevado, e por isso cobravam juros proíbitivos, então porque é que a procura ultrapassava sempre largamente a oferta? Não seria o contrário o normal?
Penso as dívidas públicas raramente são investimentos de risco. Mesmo depois do ataque cerrado que Portugal sofreu, para ter de se endividar ainda mais e ter de pagar mais.
Os meios de comunicação social trataram de branquear a situação. Em último caso podem sempre ser cobradas coercivamente, ou pela força das armas, ou por guerras económicas.

2º - Que tipo de investidores são estes que pagam para comprarem dívida pública alemã?
Lembro-me que uma vez a Alemanha teve de voltar a vender dívida publica pela 2ª vez porque não apareceram compradores suficientes...

A única explicação que encontro é que estão a ir buscar lucro a Portugal, Grécia, etc, depauperando essas economias, para depois investirem na, ou ajudarem a economia alemã.
Quando se diz que a Alemanha está a dar-nos uma ajuda, está simplesmente a devolver-nos aquilo que nos foi tirado.

Já agora, porque razão os chineses não podem vender carros na europa, feitos na china, a 1/3 do preço? Qual seria a economia mais afectada com esse produto?

Por tudo isto e muito mais acho interessante o que está a publicar.

Carlos disse...

Caro vbm

“Abolir a banca privada é porventura uma solução possível, mas julgo-a mais perigosa do que a influência do Estado na actividade autónoma dos bancos: através da regulação; pela defesa da concorrência; porventura, pela própria participação do Estado no sector através de banco próprio, nacionalizado.”

Referia-me é à criação de dinheiro, não em abolir a banca. Quanto à regulação, concordo, penso que está mais do que demonstrado que é fundamental. Uma coisa que não suporto é a especulação. Acho-a destrutiva.
Penso que o foi o ministro das finanças libanês que impediu a banca libanesa de comprar lixo, daí a banca libanesa continuar sem sobressaltos.

“A socialização da banca - e das grandes empresas - é um facto no sistema capitalista, aliás perfeitamente prospectivado por Marx.”
Creio que Marx escreveu o que ouviu falar.
“A socialização da banca - e das grandes empresas...” não será apenas uma imagem de fachada?
Mas isto daria outra discussão.

Não tenho nem nuca tive qualquer problema com os ganhos de alguém. É-me totalmente indiferente. O que passa a ser um problema de todos é o mau uso que dão ao dinheiro que ganham. Daí ser da opinião de ter de haver um tecto máximo de ganhos, tanto para pessoas como para empresas. Permitiria, forçaria a concorrência e impediria grandes influências nas decisões dos políticos.

Estou convencido que o problema da banca, ou de qualquer outra actividade económica é um problema humano. A ganância desmedida quiçá patológica até.

“A desigualdade económica é ineficiente e prejudicial para lá de certos limites, que o Estado não deve consentir ultrapassr sob pena de erodir a coesão da sociedade.”

Nunca tinha pensado nisso dessa forma.

vbm disse...

O rendimento e a a fortuna específica dos cidadãos particulares são mais determinantes do equilíbrio económico e social do que muitos imaginam.

Em si, a riqueza acumulada pelas empresas é riqueza colectiva, implicada na actividade económica em que os trabalhadores participam.

O rendimento individual, esse é que já pouco tem a ver com a produção propriamente dita. É certo que o consumo sumptuário e de luxo ainda envolve emprego terciário, a construção de vivendas particulares ou edifícios públicos não deixa de embelezar uma cidade e manifestar a pujança da arte e do bom gosto.

Mas há limites a vigiar, além dos quais a desigualdade é imprópria, desistimulante ou mesmo injusta e intolerável.

O crédito bancário é emissão de dinheiro, de facto. Por isso mesmo tem de ser regrada.

A especulação, em si, é legítima e até valiosa. Se acerto na tendência do devir e os outros erram, eu fico melhor colocado no futuro do que eles. O petróleo ser caro é o melhor dos estímulos para descobrir e adoptar uma forma de energia alternativa.

Diferente é a manipulação do mercado e a fraude negocial, a reprimir e punir.

Carlos disse...

“O rendimento e a a fortuna específica dos cidadãos particulares são mais determinantes do equilíbrio económico e social do que muitos imaginam.”

“Mas há limites a vigiar, além dos quais a desigualdade é imprópria, desistimulante ou mesmo injusta e intolerável.”

“O rendimento individual, esse é que já pouco tem a ver com a produção propriamente dita.”

Quer desenvolver um pouco mais estes temas?


“O crédito bancário é emissão de dinheiro, de facto. Por isso mesmo tem de ser regrada.”

Porque não retirar-lhes essa possibilidades?


“Em si, a riqueza acumulada pelas empresas é riqueza colectiva, implicada na actividade económica em que os trabalhadores participam.”

Bem, parece-me que o termo “riqueza colectiva” requer alguma boa vontade, embora concorde um pouco. Só que quando as empresas atingem determinadas dimensões e peso, os accionistas maioritários, através dos administradores ou gestores, conseguem manipular os governantes para seu benefício (eliminando concorrência, controlando um sector do mercado, recebendo benefícios, etc).


“A especulação, em si, é legítima e até valiosa.”

Porquê? Para além do benefício pessoal que pode trazer ao especulador, traz algum benefício à sociedade? Qual é o valor acrescentado que traz/inerente? Parece-me que as desvantagens são piores do que as desvantagens. Vivemos em sociedade e temos de ponderar estas questões. Por eu enriquecer não quer dizer que a sociedade beneficie com isso. E, pela banca houve especulações bastante destruidoras (apostando que as pessoas não iam poder pagar as casas, o que se tornou verdade por causa das especulações que fizeram).

“Diferente é a manipulação do mercado e a fraude negocial,...”

Ao especular não está de certa forma a manipular o mercado? O problema está onde acaba um (A especulação, em si, é legítima e até valiosa.), e começa o outro (a manipulação do mercado e a fraude negocial ).

vbm disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
vbm disse...

É difícil escrever-conversar, digamos “escreversar”.
Telegrafo.

— O rendimento e a fortuna pessoal, se não reinvestidos na actividade económica são mero entesouramento, consumo sumptuário, ou mera delapidação inconsequente.

Há também os casos de filantropia tipo milionários americanos ou legados pos-morte como o de Gulbenkian e o de Champalimaud. Já a fortuna e a poupança reinvestida é completamente ciclada na actividade produtiva.

A desigualdade económica estimula a emulação e é poderoso incentivo à produtividade. Além do mais, ser “melhor que os outros” é ambição respeitável se houver competição leal.

John Rawls teorizou ser lícita a desigualdade que reverta em maior bem-estar global da sociedade, e ilegítima se acarreta diminuição do bem-estar total

— A concentração da concessão do crédito nas mãos do estado impede a criatividade e liberdade económica, exponenciando o dirigismo social de modo ineficiente e porventura alheado dos desejos e necessidades da população.

— Os sectores-chave da actividade económica, especialmente os que atingiram uma maturidade tecnológica já menos inovadora devem ser cerceados no seu poder de influência política, o que pode conseguir-se com políticos aptos a ‘dividirem para reinar’, e por conseguinte apoiarem e apoiarem-se em forças activas alternativas à dos poderes conservadores.

A minha teoria é a de que os políticos devem defender os interesses dos cidadãos contra todo o corporativismo, apenas aceitando os interesses particulares que se subordinem ao objectivo do livre desenvolvimento de cada um como condição do máximo desenvolvimento de todos. (É assim uma espécie de geometria social, o “cidadão-qualquer”, como, para os geómetras, o ponto, o plano, o volume qualquer! :)

A especulação acertada é valiosa porque antecipa a adaptação da sociedade à condição do futuro, prevista no próprio devir do presente. Por exemplo, a Inglaterra, no tempo de Georges Soros estava a viver e a explorar o mundo inteiro comprando-lhe bens com uma libra que não valia a cotação a que era trocada pelas outras moedas. Seguro disso, Soros denunciou que “o Rei ia nu” e vendeu todas as libras que pôde trocando-as por dólares. O Tesouro britânico teve de reconhecer não poder continuar com a intrujice a que sujeitava os seus fornecedores e a libra caiu.

Mutatis mutandis para o endividamento insolvente de vários países do euro, que só pela reacção extremada dos credores começaram a perceber que não podiam continuar a viver à custa alheia! Especular pressiona adoptar o comportamento adequado à necessidade do porvir.

Carlos disse...

Caro vbm
“A desigualdade económica estimula a emulação e é poderoso incentivo à produtividade. Além do mais, ser “melhor que os outros” é ambição respeitável se houver competição leal.”

Concordo. A igualdade é uma criação humana. A desigualdade um facto imposto pela natureza.

Mera curiosidade. Casos de filantropia, ou seja estranha filantropia.
Tax Exempt Foundations - G. Edward Griffin interviews Norman Dodd
http://www.youtube.com/watch?v=YUYCBfmIcHM

“— A concentração da concessão do crédito nas mãos do estado impede a criatividade e liberdade económica, exponenciando o dirigismo social de modo ineficiente e porventura alheado dos desejos e necessidades da população.”
Penso que está a extremar. Sei que essa possibilidade existe, Por isso nunca afirmei que só o estado deve conceder crédito. O que disse foi que me parece menos mau ser o estado a criar dinheiro.
Porque razão a banca só pode conceder crédito se criar dinheiro? Porque razão só existe esse processo, não pode haver outro?

vbm disse...

Quando o banco concede crédito, o devedor fica com a sua conta de depósito creditada. Os depósitos movimentam-se por cheque e transferência de conta a conta. Liquidam pagamentos, como as notas de banco e as moedas. Por essa razão, são dinheiro. O banco pode emprestar um múltiplo do volume de depósitos que tem. Por isso há criação de dinheiro.

Se não houvesse este mecanismo, a possibilidde de expandir a produção e a actividade económica ficava excessivamente dependente da poupança acumulada pela população, o que se sabe ser um constrangimento restritivo demais para ser adoptado. Agora, importante, de facto, é que o crédito seja concedido para projectos efectivamente produtivos, criadores de riqueza e com retorno satisfatório.

Carlos disse...

Caro vbm

“Quando o banco concede crédito,... …há criação de dinheiro.”

Concordo, a banca cria dinheiro a partir do nada, e em troca recolhe riqueza, ou parte da riqueza a quem emprestou/empresta. A banca vende nada. Desta forma cria riqueza pessoal sem produzir algo. Daí já ter dito que os ganhos da banca são desproporcionais para com a riqueza que criam.

“Agora, importante, de facto, é que o crédito seja concedido para projectos efectivamente produtivos, criadores de riqueza e com retorno satisfatório.”

Lá se ia o crédito aos bancos...
Há aqui, ao que me parece, uma divergência de princípios, entre nós. Eu penso que o crédito deve ser concedido sem restrições. É um assunto entre credor e devedor (claro que deve ser regulado, as leis devem fazer jus ao seu nome e os tribunais devem funcionar sem as imposições restritivas existentes, na busca de justiça).

“— A concentração da concessão do crédito nas mãos do estado impede a criatividade e liberdade económica, exponenciando o dirigismo social de modo ineficiente e porventura alheado dos desejos e necessidades da população.”

Quando a banca resolve emprestar a um micro empresário ou industrial a 6/7% e a um grande empresário ou industrial a 1%, não está a manipular o mercado? (entre outros malefícios)
A sua dúvida em relação ao possível comportamento do estado, também é valida em relação à pratica da banca privada.

“Se não houvesse este mecanismo, a possibilidde de expandir a produção e a actividade económica ficava excessivamente dependente da poupança acumulada pela população, o que se sabe ser um constrangimento restritivo demais para ser adoptado.”

Sei que é um lema muito utilizado. Podemos experimentar, para comprovar na prática a vantagem desvantagem (:))? Podemos comparar com tempos passados, mas, seria isso intelectualmente honesto?
Cria inflação, que, de outro modo não criaria.
O que criou, uma sociedade inteira a viver a crédito. Tal como um dominó, tomba uma peça e lá vão as outras... por isso os problemas actuais são muito maiores. Muita da “riqueza” que “existe” não será mera ilusão (não me lembro se era o BES, tinha acções a 5€ e agora valem 0,50€)?
Tenho sérias dúvidas que seja um malefício, a vida prosseguir a um ritmo, mais consensual, com o ritmo, com a natureza humana.
Sou da opinião de que a economia e finanças, criação humana, deviam existir para servir o homem, não para se servir dos homens, ou servir uns quantos em detrimento da esmagadora maioria.

vbm disse...
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vbm disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
vbm disse...

Muito interessante a tua formulação. O stock de dinheiro em cada momento, inicialmente ouro, é uma mercadoria como a dos demais stocks de bens ainda não consumidos ou gastos. Logo, a fracção, maioritária, de crédito concedido além do stock de dinheiro inicial, embora em proporção ao da grandeza deste, é algo ‘criado’ do nada, é um poder de pagamento — exactamente, dinheiro — que emerge de nada, por mero direito convencional.

Mas depois dizes, assim «se cria riqueza (pessoal) sem produzir algo»… Será possível? Julgo que não. Parece-me curto-circuitado o ciclo de criação de riqueza. Vejamos.

O dinheiro existente, o stock de moeda inicial, é uma mercadoria como as demais. Está criada. Entesourada. Tão presente quanto todo o stock de bens ainda não consumido ou utilizadamente gasto. O que se proporciona ao mutuário é a utilização desse dinheiro, desse poder de gasto. Como isso se faz num múltiplo do stock existente é verdade que se cria dinheiro que não existia.

E então, porquê isso não é um desastre «tout court»? Porquê isso não é roubar uns a favor de outros, ao fim e ao cabo? — seja por falência do banco, seja por inflação, i.e., desvalorização do dinheiro, seja por confiscação tributária dos contribuintes para redotar de fundos os bancos de depósitos e crédito.

Ora isso não é o esbulho dos casos enunciados quando simplesmente tais situações não se verifiquem. O que sucede se o dinheiro criado pelo crédito mobiliza recursos produtivos em inactividade ou desempregados na economia.

Bem entendido, se os recursos inactivos se empregam activamente para produzir bens e serviços que não interessam para nada — bens invendáveis ou de tal maneira caros que é preferível não os comprar — por exemplo, estradas paralelas umas às outras, ou com portagens tão caras que não compensa chegar depressa ao destino :) — então, estamos caídos na mesma inutilidade da inacção e desemprego, pelo que o crédito redunda em roubar a uns para dar a outros.

Portanto, quando o crédito origina emprego produtivo de recursos inactivos e gera bens e serviços úteis e procurados, a riqueza aumenta porque a produção e o bem-estar crescem e aumentam. Ao dinheiro emitido corresponde produto acrescido e o juro do mútuo é o benefício que reverte ao prestamista dos fundos requeridos e consumidos até ao arranque da nova produção e sustentável reprodução do respectivo ciclo de actividade no tempo.

Não há neste processo espoliação de ninguém nem desproporção alguma entre o esforço e a retribuição.


Nota:- Os comentários eliminados foram-no por mim, porque não ficaram como eu queria.

Carlos disse...

Caro vbm

“Mas depois dizes, assim «se cria riqueza (pessoal) sem produzir algo»… Será possível? Julgo que não. Parece-me curto-circuitado o ciclo de criação de riqueza.”

O sr A foi ao banco e pediu 5.000€.
O banco concedeu-o por 12 meses com 10% de juros (500€).
O sr A foi para Manaus beber uns chopos, etc.
5 dias antes do prazo acordado, o sr A deposita no banco 5.500€
No dia acordado o banco retira da conta do sr A 5.500€
O banco aumentou a sua riqueza em 500€.

O que foi que o banco produziu para ter um aumento de riqueza de 500€?

vbm disse...

Lol

Nesse exemplo, não houve qualquer aumento de riqueza mas só uma transferência da mesma de A para B(anco).

Carlos disse...

“Nesse exemplo, não houve qualquer aumento de riqueza mas só uma transferência da mesma de A para B(anco).”

Exacto. O banco transferiu para si, isto é, aumentou a sua riqueza pessoal, em 500€.

Concordo se for a nível de uma determinada área económica, por exemplo um país, sendo os dois intervenientes residentes dentro dessa área, há transferência de riqueza. Mas, eu referia-me a nível do banco (dentro duma área económica), e aí houve. O banco aumentou a sua riqueza pessoal em 500€ sem ter produzido nada.
Será que me expliquei bem?...

vbm disse...

Sim, mas essa riqueza existia já, apenas é transferida de A para B, seja dentro ou fora de uma dada área económica.

Marx, p.e., é historiador quando descreve os processos de acumulação primitiva que se exemplificam em esbulhos, roubos, saques, pirataria, assaltos e ladroagem de estrada, etc.

Tudo processos de apropriação e concentração de riqueza acumulada - Robin Hood e Zé do Telhado invertem o processo, redistribuem riqueza! :)

O crédito nunca é inflacionista se causa o emprego de recursos inactivos criando bens e serviços úteis e procurados.

vbm disse...

Post-scriptum: - Em termos de corolário ao último enunciado, quase valido, ou valido mesmo, que ladrão que se aplica a criar trabalho para aumento do bem-estar de todos é ipso facto ou de jure ladrão redimido.

Carlos disse...

Viver a crédito, versão curta, visto algures na net. :)
Um homem entra numa hospedaria e pergunta quanto custa uma noite num quarto.
O dono da hospedaria diz-lhe que são 100€.
O homem surpreendido pelo preço, faz uma proposta ao dono: Eu deixo aqui 100€, mas 1º quero ver o quarto.
O dono da hospedaria chama a mulher para ir mostrar ao homem os quartos.
Entretanto enquanto a mulher vai mostrar o quarto ao homem, o dono corre ao talho paga a dívida que lá tinha no valor de 100€, O dono do talho, corre a pagar ao fornecedor de carne os 100€ que lhe devia. O vaqueiro por sua vez corre a pagar os 100€ que devia à menina que lhe prestava uns serviços. Esta por sua vez corre à hospedaria para pagar os quartos que alugava para lá levar os seus amores, no valor de 100€
Entretanto o homem volta da visita ao quarto e diz que não gosta, que vai procurar quarto noutro lado e leva os 100€ que tinha deixado como deposito.
Moral da história...

Carlos disse...

Caro vbm
A banca ao conceder crédito, ao vender dinheiro, pode proporcionar, a que outro possa criar riqueza.
A banca não está a criar ou produzir nada directamente.
Só que a banca empresta, vende, algo que não tem, que não existe. Só existirá posteriormente a nível contabilístico, não em papel, não na realidade. E depois é pago com dinheiro real e, o que foi “criado” a partir do nada, algo inexistente, “transforma-se”(*).
O esquema de criar nada, a não ser contabilisticamente, vender esse nada, gerando lucro ao vendedor, é que me parece estranho.

(*)Repare que a banca criou 5000€, que só existem contabilisticamente, e cobrou mais 500€ pela concessão do crédito.
1 – A banca depois quando recebe o pagamento desses 5000€, transforma os tais 5000€ contabilísticos, fictícios, inexistentes, em existência real. Em 5000€ reais. Que depois pode voltar a criar mais dinheiro fictício para voltar a emprestar... e o processo prossegue (cria nada e depois transfere para si riqueza real).

2 – Para além disso ainda vai recolher os juros (500€ reais) que cobra por ter vendido nada (e ter transformado esse nada que emprestou, em riqueza real).

Este processo permite criar... nada... e transformar esse nada em dinheiro real. Para além disso ainda permite cobrar juros, por ter vendido... nada... o ganho é duplo.


“Marx, p.e., é historiador quando descreve os processos de acumulação primitiva que se exemplificam em esbulhos, roubos, saques, pirataria, assaltos e ladroagem de estrada, etc.”
É o que se está a fazer hoje. Roubar... transferir a riqueza de muitos para as mãos de uns poucos.
Também havia acumulação primitiva de riqueza de forma honesta. A honestidade não é contemporânea nem propriedade de Marx.
Marx era um burguês tótó... :)

“O crédito nunca é inflacionista...”

Exacto. O credito.
Mas se para poder conceder esse crédito, tem de se criar dinheiro, mesmo que fictício, contabilístico, já cria/gera inflação.

“Post-scriptum: - Em termos de corolário ao último enunciado, quase valido, ou valido mesmo, que ladrão que se aplica a criar trabalho para aumento do bem-estar de todos é ipso facto ou de jure ladrão redimido.”
LOL gostei. Sempre admirei a capacidade intelectual do ser humano, para justificar o injustificável, para criar lógica onde ela não existe, etc.
Lema banqueiro?...
Ladrão (pequeno ou grande) deve ser preso, ponto final. Se roubou, mesmo que depois possa criar emprego, deve ser preso e, quiçá, os originais proprietários da riqueza, roubada, devem tornar-se os proprietários do que ele criou.

vbm disse...

Sobre o último ponto, prender quem tenha sido ladrão, muito embora vire cidadão respeitável ou benemérito: é lícito defender esse valor, embora em todas as sociedades se consagre a prática da prescrição de crimes. Porém, entre os sistemas de moral, o do utilitarismo ainda não está totalmente rejeitado por argumentação válida, mas, verdade, pode preferir-se e perfilhar-se outro sistema ou prioridade de valores, o da estricta rectidão, tipo imperativo categórico de Kant, mas há quem não opte por tal moral. É uma questão discutível.

Carlos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlos disse...

Aceito o que diz, mas há um ponto que me deixa insatisfeito com duvidas.

“Sobre o último ponto, prender quem tenha sido ladrão, muito embora vire cidadão respeitável ou benemérito: ...”

Desde que tenha pago pelo crime que praticou e depois tornar-se um cidadão respeitável, não vejo nada de errado.

Agora, a prescrição de crimes, não é uma injustiça imposta à vítima?

vbm disse...

O esquema de pagamento sucessivo de uma dívida com a mesma nota de banco inicial é a mera exemplificação da velocidade de circulação da moeda, pois que na verdade a equação de trocas é MV = PT, stock de moeda vezes o número de vezes da sua utilização na unidade (período) de tempo liquida o número de transacções ao preço médio das mesmas. Nada tem de especial e não vejo qual é o sentido da história.

«A banca ao conceder crédito, ao vender dinheiro, pode proporcionar, a que outro possa criar riqueza. A banca não está a criar ou produzir nada directamente.»

Certo. Proporciona a outrém a criação de riqueza. O contributo bancário é o de arrecadar a poupança e emprestá-la aos produtores-investidores.


Só que a banca empresta, vende, algo que não tem, que não existe.

Tem. Tem a poupança e os saldos de liquidez dos depositantes. Mas é verdade que é autorizada a emprestar um múltiplo dos depósitos que lhe são confiados. Nesse aspecto pode dizer-se que empresta o que não tem. Por isso mesmo, tem de emprestar com prudência e cumprir os rácios de solvabilidade institucionalmente impostos à actividade bancária.

A falência eventual de um banco de depósito tem de ser gerida pelo Estado e paga por impostos. A alternativa, é a declaração do estado militar de emergência e adopção de senhas de racionamento na distribuição dos bens essenciais. A falência de um banco pode ser ou não dolosa, a responsabilidade é exigível, também, ao regulador, o banco central

vbm disse...

Agora, a prescrição de crimes, não é uma injustiça imposta à vítima?

É inumano punir vinte, trinta anos depois do crime. E ao cabo de cem ou cento e vinte anos algozes e vítimas estão todos mortos!

vbm disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlos disse...

“Só que a banca empresta, vende, algo que não tem, que não existe.
Tem. Tem a poupança e os saldos de liquidez dos depositantes.”

Tem uma ínfima parte da quantidade daquilo que empresta. Um banco com uma alavancagem de 5% (penso que era o caso em Portugal), quantas vezes mais pode “criar”?

“Mas é verdade que é autorizada a emprestar um múltiplo dos depósitos que lhe são confiados. Nesse aspecto pode dizer-se que empresta o que não tem.”

É a esses múltiplos, que não tem, mas que pode criar, que eu me refiro.

““O dinheiro existente, o stock de moeda inicial, é uma mercadoria como as demais. Está criada. Entesourada. Tão presente quanto todo o stock de bens ainda não consumido ou utilizadamente gasto. O que se proporciona ao mutuário é a utilização desse dinheiro, desse poder de gasto. Como isso se faz num múltiplo do stock existente é verdade que se cria dinheiro que não existia.”

E o vendedor de laranjas que tem um stock de 5.000 laranjas?. Qual é o máximo de laranjas que pode vender (sem vender laranjas de colheitas vindouras)?

“A falência eventual de um banco de depósito tem de ser gerida pelo Estado e paga por impostos.”

Assim sendo, se é um imperativo, ter de ser paga por impostos, então parece-me correcta a opinião de alguns de que a banca deve ser toda estatizada. Porque se a falência tem de ser paga por todos, então os lucros devem ser repartidos por todos. É incorrecto, que os lucros sejam repartidos por uns quantos, enquanto que os prejuízos tenham de ser repartidos por todos.

A alternativa não será criar um sistema diferente?

Carlos disse...

“Agora, a prescrição de crimes, não é uma injustiça imposta à vítima?
É inumano punir vinte, trinta anos depois do crime. E ao cabo de cem ou cento e vinte anos algozes e vítimas estão todos mortos!”

Admito que poderá ser inumano punir alguém várias décadas depois do crime cometido, mas:

1 – Não é igualmente inumano deixar alguém a quem tenha sido cometido um crime, ficar sem que justiça seja feita para com ela?

2 – O criminoso pode sempre que quiser, em qualquer altura, denunciar o crime que cometeu e cumprir a respectiva pena/sanção, redimindo-se. Podendo daí para a frente começar realmente uma nova vida. Neste caso de cabeça mais erguida.

Penso que há duas formas de ver a questão. Uma pelo lado do criminoso/prevaricador e outra pelo lado da vítima.
Não pode a prescrição ser vitalícia?

vbm disse...

Creio que a alavancagem de crédito é menor do que 1/.05 (20 vezes); não sei ao certo, mas é terá baixado para 1/.12 (8 1/3), possivelmente, não sei.

Se a concessão de crédito não ultrapassasse o volume de depósitos a economia seria pouco estimulada, entraria num estado “anémico”.

Note-se que os bancos não emprestam só no limite do tal múltiplo do volume de depositos: obtêm empréstimos doutros bancos e jogam com os prazos e juro dos empréstimos contraídos para a concessão dos empréstimos que outorgam.

O problema-chave é a utilidade e rentabilidade da aplicação do dinheiro. Em pleno emprego, o crédito deve restringir-se e a taxa de juro aumentar.

Há bens perecíveis que o produtor pode vender e comprar várias vezes até á venda final. Na Mauritânia, os barcos de pesca antes de desembarcarem o pescado em Nouakchot, vendem e recompram várias vezes o lote do porão do barco, por telex, antes mesmo de encetada a pesca! Se a procura for animada, podem elevar o preço substantivamente ao da primeira oferta. Com as laranjas é mais difícil! :)

Não é eficiente o Estado ser banqueiro, é suficiente regular e controlar a actividade dos bancos. Os lucros dos bancos são tributados e os distribuidos também, na composição do rendimento de cada accionista particular.

A desregulação financeira e as operações off-shore deviam concertadamente ser proibidas, especialmente por causa da corrupção e lavagem do dinheiro do tráfico da droga.

Se a União Europeia adoptasse essas medidas, mesmo que não seguida pela América e Inglaterra, já era um grande golpe na pirataria mundial.


Claro que um criminoso deve ser preso. O que digo é, no caso de não o ser, por não ser apanhado, se ele aplicar o produto do roubo em benefício da colectividade, melhorando o bem-estar da sociedade, eu penso que de algum modo ele se redime, e há benefício acrescido para todos. A “acumulação primitiva” é isso! E esta maneira de ver não é a do criminoso nem a da vítima, mas a da colectividade, a posterior, e no caso de escapar à justiça, o que pode acontecer.

Carlos disse...

Caro vbm
“Se a concessão de crédito não ultrapassasse o volume de depósitos a economia seria pouco estimulada, entraria num estado “anémico”.”

É verdade que abrandava. Tal como os esquemas e a possibilidade de os criar. Se se perderia por um lado ganhar-se-ia por outro.

“Note-se que os bancos não emprestam só no limite do tal múltiplo do volume de depositos: obtêm empréstimos doutros bancos e jogam com os prazos e juro dos empréstimos contraídos para a concessão dos empréstimos que outorgam.”

Claro, mas o problema de criação de dinheiro mentem-se, só que passa a ser a montante.

...
“Com as laranjas é mais difícil! :)”

LOL É uma das razões que torna interessante este “escreversar” consigo.
Não sei como funciona esse esquema na Mauritânia. Mas, parece-me ser especulação em que o consumidor final acaba por comprar o peixe mais caro, ficando prejudicado.

“Não é eficiente o Estado ser banqueiro, ...”

Concordo. Mas, talvez fosse mais benéfico ser o único a criar dinheiro. Embora não sendo a melhor opção é talvez a menos má.


“Claro que um criminoso deve ser preso. O que digo é, no caso de não o ser, por não ser apanhado, se ele aplicar o produto do roubo em benefício da colectividade, melhorando o bem-estar da sociedade, eu penso que de algum modo ele se redime, e há benefício acrescido para todos. A “acumulação primitiva” é isso! E esta maneira de ver não é a do criminoso nem a da vítima, mas a da colectividade, a posterior, e no caso de escapar à justiça, o que pode acontecer.”

O que é o colectivo? Nada. O colectivo é uma abstracção, o indivíduo uma realidade. É uma expressão criada pelo homem, para referir-se a um conjunto, a um grupo, de indivíduos. Se retirarmos os indivíduos ao colectivo, este deixa de existir. Por si só não existe. O indivíduo por sua vez existe, quer em conjunto quer individualmente.

Como se pode sobrepor o interesse do colectivo (uma abstracção) ao interesse do indivíduo (uma realidade)?

E porque pode acontecer não ser apanhado? Certamente não é por ele, o prevaricador, ter tido um rebate de consciência.:)

Devem os princípios ficar subjugados a outros interesses?

É uma hipótese que põe, mas que para mim não satisfaz.

Caro alf
Daqui a pouco estamos no natal e você nem entra no debate, nem continua com a sua conversa com o alemão... :)

vbm disse...

:) O alf continuará por certo :)

A política não se rege só por princípios de moral.

Não basta acusar alguém de um crime, é preciso provar a acusação: há criminosos impunes.

Se juntarmos indivíduos, formamos um grupo e obtemos um colectivo. Há políticas que aumentam o bem-estar de todos, logo de cada um também.

A regulação financeira tem de ser restaurada para que os interesses particulares se subordinem ao interesse geral.

A democracia tem de reforçar a autoridade do pensamento político e científico na direcção da sociedade.

Os agentes económicos e as famílias têm o direito de viver com liberdade, mas condicionada pelas leis da natureza e da racionalidade humana.

Gosto sempre de citar Platão: - «Por onde a razão, como uma brisa, nos levar, por aí devemos ir.»

alf disse...

Amigos

Ena, que coisas interessantes que aqui têm sido escritas!

peço desculpa da minha ausência, estive no Portugal profundo, profundo demais para ter uma net com qualidade suficiente. Dêem-me mais uns dias porque tenho muita coisa para pôr em ordem e já cá volto.

Só um apontamento: em minha opinião não se pode, como faz um pouco o vbm, presumir a bondade dos agentes. Cada um acaba sempre por agir em função dos seus interesses (as excepções, a existirem, não têm peso no processo. Por isso, o sistema funciona em função da força dos agentes na defesa dos seus interesses. Quem tiver o poder de regular a economia, de emitir dinheiro, usará fatalmente esse poder no seu interesse. Ora acontece que a única forma de colocar minimamente esse poder ao serviço da sociedade é colocá-lo na dependência da política, a ideia de que a economia se autorregula em benefício de todos é uma utopia, um erro, uma falácia, que é propalado por aqueles a quem isso convém.

Esta crise das dívidas soberanas é exclusivamente uma crise do euro - há uma crise financeira que resulta do estoiro dos processos especulativos, mas crise da dívida soberana, contrariamente ao que afirma o Durão Barroso, é só do euro; e isso acontece porque o BCE é independente da política e agiu para transferir a crise financeira para os Estados. Isso é claríssimo em Espanha e o governo espanhol está a fazer o que pode para evitar essa transferência; mas como tb está comprometido com o sistema, acabará por deixar isso acontecer e pôr o povo a pagar os lucros de 30 a 50% que os especuladores andam a ter há umas duas décadas.

Abraço

alf disse...

Não percam este vídeo que o Diogo disponibilizou - são só 5 minutos em que se apresentam duas graaaandes verdades

http://citadino.blogspot.pt/2012/09/nick-hanauer-um-multimilionario-crente.html

vbm disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
vbm disse...


«não se pode, [ ] presumir a bondade dos agentes»

Absolutamente!

Há que ser espinosista, ou seja algo como "maquiavel ao cubo"!

Em economia, a satisfação do interesse próprio é até o princípio explicativo do funcionamento da sociedade.

Genericamente, prova-se que o interesse próprio induz o em-estar colectivo.

Porém, desde que materialmente não subjugue uns a outros,i.e., desde que a liberdade (individual) seja respeitada.

Por isso mesmo, a autoridade política deve manobrar a oposição corporativa de interesses de classe, de modo a favorecer uns contra os outros, numa estratégia tal que tenda a beneficiar o livre desenvolvimento de cada um.

Qual o risco? Que o poder político fique dependente da classe que favorece e esta já não seja a melhor impulsionadora do máximo desenvolvimento de todos...

O que fazer? O que pensar?

Antes de mais, saber pensar, para ver e antever claro :). Perceber o que é preciso.

O alf pode ter razão ao diagnosticar que a chamada “crise do euro” não passa de um esquema de conservar o que for possível dos ganhos especulativos ilícitos da classe possidente, trespassando a regulação das imparidades para os prejuízos a saldar com impostos sobre a população dos estados endividados.

Como contrariar isto, ou antes, como reverter isto em proveito próprio de quem paga? Avanço uma sugestão, — assim tipo hipótese «alfiana», :)

— pagar, mas, politicamente, não permitir a saída dos pagamentos para fora do território da população tributada: acumular as divisas da dívida amortizada em crédito dos credores, só disponível para investimento produtivo no próprio território ou, nalgum outro modo de reemprego migrante da população tributada.

Que tal? Não é tão absurdo nem tão impossível quanto possa parecer, desde que os estados tributados e se aliem para o conseguir. Agora, «anjinho» é que eu não tenho idade para ser! lol

alf disse...

vbm

não se trata de ingenuidade, trata-se de pensar que

"Genericamente, prova-se que o interesse próprio induz o em-estar colectivo."

que, como muito bem dizes, é a máxima fundadora do nosso sistema económico.

A afirmação bombástica que eu ando a fazer é a de que isso não é verdade!

Podemos por os olhos na natureza; em princípio, os seres vivos agem egoistamente; mas a natureza teve de intervir imprimindo-lhes "instintos" que forçam comportamentos que são contrários ao interesse individual e priorizam o interesse da espécie. Os seres vivos agem sempre dando prioridade ao interesse da espécie e só depois atendem ao interesse individual.

O nosso sistema económico é como se os instintos das espécies desaparecessem.

E o grande problema é encontrar maneira de impor "instintos" à sociedade humana. A figura do "estado de bem" regulador é tb uma ingenuidade, porque os agentes do estado acabam capturados pelos interesses que deviam regular.

O melhor que temos é a democracia, a capacidade das pessoas escolherem quem regula o sistema; só que a vekha democracria política já não serve porque todo o sistema está capturado por esses interesses

Na Europa, para cúmulo dos cúmulos, os interesses mais predadores de todos, que são os financeiros, que visam capturar riqueza sem gerar nada em troca, tornaram-se independentes do que resta do poder político. O BCE é independente da pol+itica

Por isso, não há solução nenhuma, a meu ver, no quadro do euro. Vamos ter de saltar fora do euro e recomeçar com outra moeda que possa ser controlada politicamente

A tua proposta é boa, pode ser aplicada nos EUA, por exemplo; mas aqui não pode porque aqui os políticos já não têm qq poder sobre o dinheiro.

Ao Passos Coelho resta obedecer aos financeiros. A nós resta-nos acabar com o euro e começar de novo. Penso eu.

Carlos disse...

Caro vbm
A política não se rege só por princípios de moral.
É verdade... aliás, raramente isso acontece.
Moral (ética) é um lastro, anti-progresso, que deve ser evitado a todo o custo.

Não basta acusar alguém de um crime, é preciso provar a acusação: há criminosos impunes.
Eu sei... para isso existe muita legislação

“A regulação financeira tem de ser restaurada para que os interesses particulares se subordinem ao interesse geral.”
Eu prefiro: A regulação financeira tem de ser restaurada para que os interesses de uns não se sobreponham ou prejudiquem os interesses de outros.

“A democracia tem de reforçar a autoridade do pensamento político...”
Estou completamente baralhado :0
Crime when it succeds is called virtue. ----- Luciu Annaeus Seneca

Gosto sempre de citar Platão: - «Por onde a razão, como uma brisa, nos levar, por aí devemos ir.»
Quanto ao tal de plantão, a única coisa que sei, foi que quando cumpri o serviço militar tive de estar muitas vezes de plantão... era cá uma seca...

Caro alf
“Podemos por os olhos na natureza; em princípio, os seres vivos agem egoistamente; mas a natureza teve de intervir imprimindo-lhes "instintos" que forçam comportamentos que são contrários ao interesse individual e priorizam o interesse da espécie.”

Penso que está enganado.
1- Instinto é o que leva o ser humano a agir egoisticamente.
2- A socialização é o que leva a que tomemos em consideração os outros. No entanto não deixa de estar presente uma certa doze de egoísmo.

“Os seres vivos agem sempre dando prioridade ao interesse da espécie e só depois atendem ao interesse individual.”

Os seres vivos agem sempre dando prioridade ao interesse próprio e só depois atendem ao interesse da espécie.
Por essa razão por exemplo, quando entram em pânico atropelam-se uns aos outros para se salvarem. Os mais fracos ou menos afortunados ficam para trás.

Napoleão disse correctamente: Men are moved by two levers only: fear and self interest.

Carlos disse...

Em ralação oa ponto 2 "No entanto não deixa de estar presente uma certa doze de egoísmo."
Temos um ditado.
Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti.

alf disse...

Carlos

O facto interessante acerca da natureza é que os seres vivos agem efectivamente em favor da espécie. O instinto maternal é um exemplo claro, mas todo o processo reprodutivo também o é, bem como comportamentos sociais.

Uma teoria que pretende explicar isto é a do "gene egoísta". Já não é o indivíduo que é egoísta, é o gene; e o gene está disposto a sacrificar o indivíduo se isso for vantajoso para ele, ou seja, para a espécie.

Os seres vivos têm um programa base que é egoísta mas têm um conjunto de rotinas que são deflagradas quando ocorrem os estímulos certos e que determinam comportamentos que se sobrepõem aos do programa base, essas rotinas determinam os comportamentos sexuais, em caso de perigo do indivíduo e também os outros comportamentos que nos surgem como misteriosos porque não são egoístas e por isso não sabemos explicar - como o instinto maternal.

Percebermos isto é importante para percebermos que não há solução para a sociedade humana se estabelecida em obediência ao egoísmo. Ou melhor, ela vai funcionando, mas não se livra das crises, dos conflitos, dos ciclos de abundância e carência.

Há muito que a humanidade percebeu isto, sendo uma das razões que levou ao desenvolvimento das religiões, das morais, da ética e de muita filosofia.

Só que nós agora tornamo-nos tão ignorantes e tão convencidos dos feitos tecnológicos que não percebemos a sabedoria que está por detrás de tudo isso e em vez de evoluirmos essas soluções, regredimos.

A teoria do egoísmo serve muito bem quem está por cima, é claro. Mas como leva ao crescimento da desigualdade, os seus defensores tornam-se minoria e depois surgem outras coisas que protegem melhor os interesses de quem está por baixo - como a religião.

Se isto continua, não faltará muito para que os portugueses prefiram ser governados pelos bispos do que pelos políticos ao serviço dos interesses financeiros; vá observando.

vbm disse...

alf


O interesse próprio transmutar-se, como por uma mão invisível, na realização do bem comum é um facto social óbvio. Como diria Adam Smith,

«Não é da bondade do homem do talho, do cervejeiro
ou do padeiro que podemos esperar o nosso jantar,
mas da consideração em que eles têm
o seu próprio interesse.»


Poder-se-á objectar que isso só é válido entre a pequena burguesia comercial e urbana e que após a concentração industrial monopolista em grandes empresas e com o predomínio do capital financeiro especulativo não há «mão invisível» que transmute a ganância em bem, mas tal juízo é um diagnóstico parcial das forças que agem na economia e na sociedade.

O confronto político e militar, latente ou explícito, entre estados soberanos é um factor que independe do mero poder financeiro, antes o subordina aos seus objectivos. Depois, podem parecer aliados, mas a subordinação é a do dinheiro ao poder militar.

O que há de mais subtil e civilizacional na condução das sociedades é aliança da inteligência ao poder, com o efeito de as populações viverem, não anestesiadas pelo ópio da propaganda das corporações de interesses particulares, mas despertos pela observação e conhecimento da realidade e pelo espírito crítico e o exemplo dos mais sábios.

Esta é a diferença entre a nossa espécie e as demais sociedades animais que seguem acriticamente os seus chefes.

De qualquer modo, é facto que a ciência e a tecnologia permitem a produção em massa de bens de consumo e equipamentos e a indústria opera em larga escala; o crédito bancário alia-se à expansão económica na distribuição de bens quer úteis quer inúteis permitindo a concentração maciça de capitais na maioria ociosamente ocupados em mera especulação financeira.

Esta deriva especulativa precisa de ser controlada e limitada sem anular contudo a especulação em si. Esta é uma actividade legítima, própria da inteligência e útil, especialmente quando acerta ou, quando se emenda rápido, logo que se apercebe do erro!
Diagnosticar o que se observa, teorizar e prognosticar o devir é puro exercício de inteligência e permite melhor agir na natureza.

Para decantar a ‘pureza química’ da especulação financeira talvez seja suficiente interditar os paraísos fiscais, onde se refugiam os capitais do tráfico da droga, das armas e da corrupção na adjudicação das grandes encomendas públicas e privadas. Rarificada a lavagem de dinheiro, os capitais tenderiam a aplicar-se em investimentos produtivos, designadamente no desenvolvimento dos países atrasados, na condicionalidade concomitante de adequado controlo populacional da natalidade!

Quanto ao euro, sou um medíocre especulador :), mas custa-me a crer que não vingue… é que não vejo que a desnuclearizada Alemanha desista, isolando-se entre a França/Inglaterra e Rússia, potências nucleares, reduzindo-se a um comércio declinante de inexpressiva grandeza. {Só ignoro em que questão de unificação bancária da União a França e a Alemanha discordam, porquê e o que pretendem.}

vbm disse...

Carlos,

“A democracia tem de reforçar
a autoridade do pensamento político...”

Estou completamente baralhado :0
_________________________________

Ao que quis aludir, neste enunciado algo obscuro, era os partidos políticos terem de deixar de ser meros grupúsculos aparelhísticos de selecção eleitoral e passarem a respeitar a autoridade do pensamento político das respectivas elites partidárias, hoje acantonadas ao comentário político tipo jornalístico, ou simplesmente silenciadas em actividade privada.

(Eu peço desculpa, porque realmente, ‘fora da minha cabeça’, talvez fosse impossível ver que fosse isto o que pretendia dizer, mas disse: uma democracia partidária que respeite e apoie a autoridade dos políticos que pensam e sabem pensar - :).

alf disse...

Carlos

Permita-me algumas correções; os animais não seguem acriticamente os chefes, obedecem aos seus instintos. Ora os humanos têm uma coisa que os distingue dos animais: a razão.

Os antigos souberam perceber isso e verter esse conhecimentos na sabedoria antiga: aos humanos foi dado pelos deuses o "livre arbítrio". Ou seja, os animais são directamente comandados pelos deuses através dos instintos, mas os deuses deixaram os humanos entregues a si próprios, órfãos da mão sábia que guia os outros animais na preservação da sua espécie.

Não somos, porém desprovidos de meios para sabermos o que convém à espécie, ou ao grupo. Porém, temos essa consciência em graus diferentes e alguns em grau nulo.

Eu já conheci pessoas que efectivamente venderiam a mãe se lhes oferecessem dinheiro por ela. e pessoas ditas "importantes", o que não admira: como me disse um renomado astrónomo do Porto, "os conselhos da avozinha tornaram-se o estigma do falhanço" Ou seja, as pessoas que só pensam no seu interesse imediato e se estão completamente nas tintas para os outros são aquelas que mais facilmente atingem o sucesso nesta sociedade; e estas pessoas moldaram a sociedade para as suas conveniências

É por isso que é legal, por exemplo, abrir um serviço de linhas de valor acrescentado para andar a enganar velhinhos. A vigarice é uma atividade legal. E pior, criou-se a ideia de que vigarizar não só é legal como é legítimo e é um motor essencial da economia!

a actividade do homem do talho não tem nada a ver com a do especulador financeiro.

O homem do talho, ou o banco que faz um empréstimo, prestam um serviço, geram riqueza. O que recebem é função do que dão à comunidade.

A atividade de especulação, ao contrário, não gera riqueza, visa apenas a apropriação da riqueza dos outros - é uma atividade predadora

nestes comentários há uma enorme confusão entre a atividade bancária de empréstimo, que é útil, legítima, e a actividade de especulação financeira, que é predadora. Esta actividade é que é a origem de todos os problemas atuais. Há muito quem defenda que devia ser proibido misturar as duas coisas: a banca de retalho tem um lucro típico de 8% enquanto a dita de investimento, a especulativa, tem tido um lucro acima dos 30% ao ano. Um lucro que não gera riqueza nenhuma para a sociedade. (continua)

alf disse...

Carlos

(continuado)

Vivemos inundados de notícias sobre o sobe e desce das bolsas e isso leva-nos a pensar que a actividade bolsista é crucial no crescimento económico; mas olhemos para as empresas que realmente são dele motores e vejamos qual é a importancia da bolsa para elas: Sony? Boeing? Airbus? Nasa? Texas? Intel? Volkswagen? Bem, mas a esmagadora maioria das empresas nem sequer está na bolsa. A bolsa é apenas o casino onde se joga um tipo de especulação financeira, só serve a predação.

Os predadores desta sociedade olham para as pessoas como tu e eu e o vbm da mesma forma que os carnívoros olham para os herbívoros. Neste aspecto, o Diogo tem os olhos bem abertos.

Quanto à Alemanha, o alemão rico sofre de um problema antigo: a arrogância. Isso é conhecido há séculos, vem descrito em livros antigos. O Eça de Queirós, qd descreveu demolidoramente o judeu alemão, enganou-se numa coisa: o comportamento que ele descreveu não é dos judeus, é dos alemães ricos!

Essa é uma das razões da atual política de empobrecimento: nós somos inferiores e por isso devemos ser colocados no nosso lugar de inferiores - é uma questão "moral" para os alemães, não é uma questão económica . E quanto mais pobres ficarmos, mais pobres eles acharão que devemos ser - até chegarmos a ser escravos; e depois disso acharão que somos dispensáveis porque a humanidade passa bem sem nós, uma vez que não damos qq contribuição útil e nesta vida só tem direito a existir o que for útil.

Achas difícil de entender? Mas, no fundo, é o que pensamos dos ciganos, não é verdade? Do ponto de vista dos alemães, nós fazemos tanta falta como os ciganos.. e é verdade, um povo com 50% de analfabetos funcionais é o quê hoje? 10% de licenciados, a maioria deles em cursos fictícios, numa sociedade onde não se admite menos de 50% de licenciados em cursos a sério? Uma sociedade em 50º lugar no acesso à net? Uma sociedade com mais de 40% de abandono escolar?

Portanto, para os alemães, nós somos seres inferiores e nem pensar em nos deixarem comer à mesa deles. E nós ou aceitamos o papel que eles nos reservam, ou saltamos fora deste barco... ou nos unimos aos outros "ciganos" e os enfrentamos.

Carlos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlos disse...

Caro alf
O “gene egoísta”
Você já pensou nas implicações legais que essa teoria traz?
Passamos a ser inimputáveis. Não fui eu, foi o meu gene...
Somos a razão última para a sua existência? Nós existimos para que o gene egoísta possa existir e propagar-se?!... Os genes não existem para ajudar-nos a existir?
Acha que um gene é responsável por um comportamento?
Afinal somos meros animais biológicos?
Não é a dessocialização do ser humano?
Já agora, existe também o “gene altruísta”?

“...também os outros comportamentos que nos surgem como misteriosos porque não são egoístas e por isso não sabemos explicar - como o instinto maternal.”
Perpetuação da espécie (não do gene). O instinto maternal tem uma boa dose de egoísmo.

“Uma teoria que pretende explicar isto é a do "gene egoísta". Já não é o indivíduo que é egoísta, é o gene; e o gene está disposto a sacrificar o indivíduo se isso for vantajoso para ele, ou seja, para a espécie.”
E como é que o gene sabe o que é, e porque é, vantajoso para a espécie?


Caro vbm
“O interesse próprio transmutar-se, como por uma mão invisível, na realização do bem comum é um facto social óbvio. Como diria Adam Smith,”

A Motivação por Adam Smith

«Não é da bondade do homem do talho do cervejeiro ou do padeiro,
que podemos esperar o nosso jantar,
mas da consideração em que eles têm,
o seu próprio interesse.
Apelamos,
não para a sua humanidade,
mas para o seu egoísmo,
e nunca lhes falamos,
das nossas necessidades,
mas das vantagens deles. »

Smith acrescenta logo a seguir: “Ninguém, a não ser um mendigo, se permite depender essencialmente da bondade dos seus concidadãos.”

A mim parece-me que Smith afirma exactamente o contrário daquilo que tenta dar a entender.

Carlos disse...

Caro alf
Nas suas duas últimas postagens tem muito com o qual concordo.

“Ou seja, os animais são directamente comandados pelos deuses através dos instintos, ...”
Então os Deuses existem? E, são os genes?

Penso que disse que achava a especulação nociva, vbm é que diferencia entre especulação boa, a que cria bem estar, e má a que destrói bem estar.

“...as pessoas que só pensam no seu interesse imediato e se estão completamente nas tintas para os outros são aquelas que mais facilmente atingem o sucesso nesta sociedade ...”
Sempre assim foi. Umas vezes de forma mais difícil outras nem por isso. Daí ter dito, sarcasticamente, que a ética é um lastro...

“...as pessoas que só pensam no seu interesse imediato e se estão completamente nas tintas para os outros são aquelas que mais facilmente atingem o sucesso nesta sociedade ...”
“... e depois disso acharão que somos dispensáveis porque a humanidade passa bem sem nós ...”
Não vai contra a teoria do “gene egoísta”, em que “o gene está disposto a sacrificar o indivíduo se isso for vantajoso para ele, ou seja, para a espécie.”

Quanto à teoria da questão moral alemã versus económica não me vou pronunciar.

Como é que os genes permitem que possamos provocar a sua mutação?

alf disse...

Carlos

humm... isto está a precisar de um post novo que a conversa está a ficar um bocado confusa lol ... embora interessante.

os "deuses" é a imagem usada pelos antigos para suporte dos conhecimentos. Conhece melhor tratado de psicologia do que a mitologia grega?

O facto de nós não sabermos explicar um facto não implica que o neguemos; eu não sei como é que os animais sabem o que é bom para a espécie, só que isso parece ser um facto; também não sei o que produz a evolução (apesar da teoria do Darwin, que é um primeiro passo, mas claramente insuficiente) mas lá que ela existe, é um facto.

A teoria do "gene egoísta" é apenas uma hipótese, uma tentativa de explicar esse facto - e, ao mesmo tempo, de salvar a ideia de que o egoísmo é motor de alguma coisa positiva, transferindo-o do indivíduo para o gene; mas não é lá muito convincente, pois não?

Nós temos inúmeros sentimentos que nos fazem ser solidários - a nossa felicidade está ligada à dos outros, não somos felizes sozinhos; porque é que somos assim? Não somos sociais porque pensarmos que isso nos beneficia, somos sociais porque nos sentimos mais felizes assim. Claro que agimos egoístamente ao ser assim, mas é porque temos uma rotina que nos força a isso.

(a propósito, o alentejo está cheio de alemães que vivem isolados... parece que lhes falta esse sentimento social... parece que há uma transferência psicológica para o dinheiro...)

O importante nisto tudo é que teorias simplórias baseadas em conceitos simplórios como o da ganância só levam à desgraça.

Se isso fosse suficiente,a natureza ter-nos-ia feito egoístas puros, para quê inventar complexas afectividades?

A nossa complexidade afectiva distingue-nos tanto dos animais como a nossa complexidade intelectual; perdê-la, negá-la, é ser menos humano e mais animal.

isto é muito como a história do "rei vai nu": é óbvio que uma teoria social baseada no egoísmo não funciona, seria muito bom, porque simples, se funcionasse, mas é óbvio que não funciona; adeus simplicidade, temos de conceber algo mais complexo - como nós.

alf disse...

vbm

Eu enderecei o meu comentário ao Carlos mas na verdade respondi ao que me suscitou alguma ideias diferentes no que os dois disseram... a ideia inicial era responder a cada um mas a verdade é que o meu comentário se resume à discussão de uma ideia, se a sociedade pode ser construida baseada no egoísmo ou não; e por isso já não escrevi outro para ti, já tinha dito o que queria dizer; se tiveres paciencia de ler os meus comentários anteriores, gostaria de saber a tua opinião sobre este ponto magno: pode uma sociedade ser construída só sobre o egoísmo, sem ser dotada de regras que, há semelhança dos nossos afectos e dos instintos animais, condicionem o egoísmo a nunca agir de forma a prejudicar o interesse colectivo?

Eu penso que o grande problema está na definição dessas regras, nomeadamente, a partir de que ponto é que as actividades que geram riqueza pessoal sem gerar riqueza colectiva podem ser permitidas, ou seja, actividades que visam a mera transferencia de riqueza de umas pessoas para outras.

alf disse...

vbm

O cerne da questão!

Há muito que sabemos que:

se cada um cuidar dos interesses dos outros, todos beneficiarão

O problema deste princípio é que logo surgem uns que beneficiam a dobrar - cuidam dos seus interesses e não dos interesses dos outros

Então, surgiu uma ideia alternativa:

se cada um cuidar dos seus interesses, todos beneficiarão

Esta é uma ideia facílima de implementar, o ovo de Colombo, a ideia deslumbrante. Só tem um problema: está errada! Não é verdade!

A ideia que funciona é um misto das duas: temos de cuidar dos interesses uns dos outros e dos nossos. É uma gestão complexa, temos de ser capazes de aferir continuamente os resultados.

A natureza preparou-nos para isto. É por isso que temos sentimentos de reconhecimento, por exemplo - se nos fazem bem, temos vontade de retribuir.


vbm disse...

alf,

É claro que o altruísmo tem o seu domínio de validade e efeito útil. Mas fora do intervalo da função-altruísta efectiva, o efeito seria simplesmente o caos.

Por exemplo, a ajuda externa a países carenciados não pode distribuir-se de qualquer maneira, sob ruptura dos próprios canais de comércio habitual e necessário.



Eu tenho uma reflexão algo prolixa sobre as duas questões que colocaste na mensagem acima, que tenho um bocado vergonha de editar por ser realmente extensa.

Mas é pena ficar simplesmente guardada no meu word e já agora, o que me envergonha é só ela não estar mais resumida ou sintética, telegráfica.

Se achares bem edito-a primeiro e depois, se quiseres, apago-a e um dia escrevê-la-ei concisamente.

Vai a seguir

vbm disse...

[Explicitando o tema]

discussão de uma ideia,

se a sociedade pode ser construída baseada no egoísmo ou não;

pode uma sociedade ser construída só sobre o egoísmo,
sem ser dotada de regras que condicionem o egoísmo
a nunca agir de forma a prejudicar o interesse colectivo?

o problema está na definição dessas regras,

a partir de que ponto é que as actividades que geram riqueza pessoal,
sem gerar riqueza colectiva, podem ser permitidas,
ou seja, actividades que visam a mera transferência
de riqueza de umas pessoas para outras.
___________________________________

Se houvesse o processo infalível de transmutar o comportamento egoísta individual em macro-benefício colectivo, sim a sociedade podia assentar exclusivamente no egoísmo.

Em medida não discipienda, esse mecanismo, a «mão invisível», existe e actua. É ele que permite a divisão do trabalho, a troca de bens, generalizável pela mediação do dinheiro,
e o desenvolvimento civilizacional após a fase da caça, agricultura, pastorícia e pesca!

A insuficiência da «mão invisível» nasce na concentração monopolista das grandes indústrias, pela sobre-acumulação de capital financeiro inaplicado em investimento adicional pelo excesso de produção invendável, seja por falta de poder de compra das populações, seja por tais produtos serem um engodo sem interesse nem utilidade nenhuma (por exemplo, automóveis com gasolina a 500 escudos o litro e auto-estradas paralelas para o mesmo destino: duas belas obras de engenharia mecânica e civil, inúteis).

O capital financeiro assim inactivo, fundos soberanos dos estados petrolíferos, lucros acumulados de exploração de assalariados escravos, populações espoliadas por governantes cleptocratas, fortunas erguidas no tráfico de armas, drogas, corrupção pública, digladia-se entre si em hecatombes de abissais menos-valias seguidas de altas de cotações sem tecto de forma a tentar perseverar pelo menos numa rendibilidade média razoável…

Especular na dívida pública dos estados europeus é o que, de momento, tem estado a gerar proveitos ‘interessantes’. Como se teme que os estados ‘exíguos’ da UE entrem em bancarrota, compram-se as respectivas obrigações de tesouro por preço muito inferior ao valor nominal dos títulos — logo, com taxa juro real bem alta, por aumentar a percentagem do rendimento fixo do título sobre o preço de compra diminuído,

Entretanto, das duas, três [princípio financeiro de indeterminação ‘quântica’ :)]: o especulador conserva o título de tesouro até à data de vencimento ou não; no primeiro caso, ou, i) o estado reembolsa-o pelo valor nominal e o titular da obrigação, além do sobre-juro alto, embolsa a mais-valia da diferença de cotações nominal e de compra; ou, ii) o estado em bancarrota liquida a dívida parcialmente, em proporção que pode ser maior, igual ou menor do que o preço a que o título foi comprado no mercado secundário; no segundo caso, e depois de não importa que sucessão de compras e vendas entre particulares, o especulador, iii) vende o título ao BCE — se o estado estiver condicionado a um programa aprovado de assistência financeira —, o qual o compra à cotação de mercado, nas quantidades que os detentores queiram vender, evitando assim que a cotação desça ao ponto de o juro subir a níveis de pânico.

Há ainda outras soluções — por exemplo, a do Salazar que consolidou tudo quanto o Estado devia numa emissão de Obrigações de Tesouro Consolidadas, isto é, jamais reembolsáveis, com direito a um juro anual perpétuo, donde a sua natureza de perpetuidades. Claro que o nome não significa que a dívida dure eternamente: pode durar, se os detentores do Consolidado assim o quiserem; mas, se quiserem vender e o Estado os quiser comprar, a dívida fica nessa altura extinta. Julgo que já não obrigações do Consolidado por resgatar — mas podia haver :).

(continua)

vbm disse...

(continuação)

Bom, mas isto é uma deriva inesperada ao tema colocado em epígrafe, que merece uma apreciação posicional objectiva. Avalio assim, pelas razões que indico:

1) É inevitável — e saudável — que o egoísmo seja pedra basilar da construção social, pela razão de o instinto individual de sobrevivência ser a fonte do egoísmo, e sem esse instinto o indivíduo não sobrevive;

2) A desigualdade individual é socialmente útil na extensão em que contribui para o acréscimo do bem-estar colectivo, e nociva a partir da acumulação que faz declinar o rendimento total da colectividade (por exemplo, se o acréscimo de riqueza do Alexandre Soares e os preços de alimentos que diz serem os mais baratos de que as famílias beneficiam for maior do que a perda de rendimentos dos merceeiros que fecharam portas, o rendimento global da sociedade aumentou; se for menor, a sociedade empobreceu.)

3) Pela razão da lógica do ponto anterior, impõe-se a regra de controlar os casos de produção e distribuição monopolista, de forma a garantir a eficiência económica óptima, ou seja, tem de haver regras a condicionar o “egoísmo” (monopolista).

4) “Actividades” que transferem riqueza de uns para outros sem aumentar a da colectividade existem historicamente desde sempre. Guerra, roubo, vigarice, doações, jogo são casos óbvios, extra-económicos. No domínio estrito da economia, há também o enriquecimento monopolístico, consequência inevitável da «lei dos rendimentos decrescentes» (David Ricardo): — exemplifico: o petróleo da Arábia custa quatro vezes menos a extrair do que o do Mar do Norte; contudo, a produção deste é marginalmente necessária para satisfazer o consumo existente; logo, todo o petróleo se vende ao custo da extracção menos eficiente pelo que os produtores árabes embolsam 3/4 de proveito puro sem contrapartida de qualquer encargo de produção!

5) O caso de embustes, como a técnica de aliciamento tipo “pirâmide-D. Branca / BPN”, são casos de crime económico, do âmbito de direito penal. Mas, eles diferenciam-se da especulação legítima porque esta exerce-se contra de contra o êxito de algum “embuste em curso”, como foi o caso de Georges Soros e a Libra esterlina, — que não valia o câmbio a que a Inglaterra queria adquirir o que importava —, e como é o caso dos estados europeus que se sobreendividaram numa moeda forte de juro baixo, muito para lá da prudência aconselhável de não exceder 50 ou 60% da produção anual, na extrapolação ignara de que o futuro seria igual ao presente inédito que conheciam.

Carlos disse...

Caro alf
Do meu ponto de vista pôs duas questões interessantes, só que inverteu-as.

“se cada um cuidar dos interesses dos outros, todos beneficiarão”
“se cada um cuidar dos seus interesses, todos beneficiarão”

Do meu ponto de vista. 1º surgiu a que vou pôr como 1ª e depois é que surgiu a outra.
1 - “se cada um cuidar dos seus interesses, todos beneficiarão”
2 - “se cada um cuidar dos interesses dos outros, todos beneficiarão”

Se cada um só cuidar dos seus interesses, ninguém beneficia.
Se cada um só cuidar dos interesses dos outros, ninguém beneficia (meramente questão teórica).

“se cada um cuidar dos interesses dos outros, todos beneficiarão
O problema deste princípio é que logo surgem uns que beneficiam a dobrar - cuidam dos seus interesses e não dos interesses dos outros”
Correcto/certo. Porque o interesse próprio (chame-lhe egoísmo, auto-preservação, o que quiser. Desde que depois não se deixe enganar pela palavra) se sobrepõe.

“se cada um cuidar dos interesses dos outros, todos beneficiarão”
Repare que é contraditório e você reconhece essa contradição “...é que logo surgem uns que beneficiam a dobrar - cuidam dos seus interesses e não dos interesses dos outros”

“se cada um cuidar dos seus interesses, todos beneficiarão
Esta é uma ideia facílima de implementar, o ovo de Colombo, a ideia deslumbrante. Só tem um problema: está errada! Não é verdade!”
É uma ideia dificílima de implementar. De certa forma aterradora (se for extremada).
E está Correcta/certa e errada/incorrecta.
Tem de haver um meio termo para que todos beneficiemos (Chama-se a isso socializar. Ensinar a dominar, ter sob controle, os instintos e impulsos).
Vou tentar dar um exemplo (o seu) para ver se consigo explicar.
Uma mãe cuida do filho por interesse próprio. Qual? Dar continuidade à sua descendência. Claro que outro ser beneficia deste interesse próprio. Se for bem sucedida ambos beneficiam (quiçá até a sociedade. Pode vir a se um sócrates ou um passos coelho... lol (aí, se cada um cuidar dos seus interesses, todos perdemos...)lol).

Penso que os termos egoísmo e gene egoísta foram introduzidos para gerar confusão. Auto-preservação ou preservação da espécie são comportamentos diferentes e mais abrangentes. Podem ter algo de egoísta, xenófobo, altruísmo, etc, mas não têm nada a ver com a teoria do gene egoísta.

Carlos disse...

Caro alf
Desculpe meter a minha colherada.

“... pode uma sociedade ser construída só sobre o egoísmo, sem ser dotada de regras que, há semelhança dos nossos afectos e dos instintos animais, condicionem o egoísmo a nunca agir de forma a prejudicar o interesse colectivo?”
Uma sociedade não pode ser construída só sobre o egoísmo.
Ser a sociedade a dotar regras, penso que seria uma autêntica ditadura. Pode ditar algumas regras (e quiçá algumas deve), mas há mecanismos com que nós nascemos que cuidam disso. Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti próprio. A socialização do indivíduo é muito importante.

O nosso instinto de auto preservação (que não é egoísmo (embora possa ter alguma dose de egoísmo) ou o gene egoísta), interesse próprio, para que não nos magoem, aprende a evitar magoar os outros. O medo de podermos ser nós a sairmos magoados duma situação trava a que entremos em conflito (com facilidade).
No entanto continuo a achar que o termo egoísmo está mal aplicado.
Somos seres bio-psico-socio-culturais. A bio, por exemplo, influência as outras três e é influenciada por elas, e assim sucessivamente. Já viu a grandiosidade para que seja reduzido simplesmente ao gene egoísta?

Carlos disse...

Caro vbm

Gostei de ler a sua exposição.
“Em medida não discipienda, esse mecanismo, a «mão invisível», existe e actua.”
Quer nos explicar o que é a mão invisível e como funciona?

Carlos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlos disse...

Somos seres bio-psico-socio-culturais. São milhões de interacções que se influenciam, positiva e/ou negativamente.

vbm disse...

"Em medida não discipienda, esse mecanismo, a «mão invisível», existe e actua.”

Quer nos explicar o que é a mão invisível e como funciona?


___________________________________________

Carlos,

Eu li a continuação daquele "texto do taberneiro", :), do Adam Smith e confesso que não percebo em quê contradiz o sentido expresso no texto inicial!

Quanto ao modo como actua a 'mão invisível' é a tal alquimia de mutação, ou do transbordar, do interesse próprio na conveniência e utilidade alheia.

O mecanismo desta alquimia é o da troca, em que bens se trocam por serviços e bens, serviços por bens e serviços; e só por embuste algo se troca por coisa nenhuma!

Por causa do mecanismo da troca, os bens passam a ter, além de um valor de uso, um valor de troca. A mercadoria, ou bem, ou serviço, mais geografica e universalmente aceite passa a utilizar-se como dinheiro, i.e., instrumento de troca, liquidação de dívidas, objecto de entesouramento ou poupança.

Acho curioso que alguns géneros de serviços quase são dinheiro que cada um transporta consigo. Por exemplo, aos judeus, em Israel e creio que na diáspora, é-lhes permitido tirarem o curso que quiserem e mais lhes agrade; mas parece que todos são obrigados a aprender um qualquer ofício prático, canalizador, sapateiro, médico, electricista ou que quer que seja desse tipo, de modo a poderem sobreviver por si próprios em qualquer parte do mundo. Acho notável porque isto me parece uma moeda invisível, transaccionável em todo o lado! Claro, o ouro e jóias também são facilmente transportáveis no próprio corpo.

A ´mão invisível’, a que converte o interesse próprio em utilidade de outrém, é o mercado, o teatro de troca de bens e serviços; onde infelizmente pode haver muita iniquidade por vigarice.

Aquilo que se chama “risco moral” de uma transacção é o caso em que o comprador ignora ou não a qualidade e o valor do que está a comprar e o vendedor conhece-a ou não, e o dolo, voluntário ou não, pode ocorrer num ou noutro sentido do comprador para o vendedor ou vice-versa.

Carlos disse...

Caro vbm
“Quanto ao modo como actua a 'mão invisível' é a tal alquimia de mutação, ou do transbordar, do interesse próprio na conveniência e utilidade alheia.”
Eu prefiro algo menos místico :) como coincidência, convergência, entre o interesse próprio e a conveniência e utilidade alheia (interesse alheio).

“O mecanismo desta alquimia é o da troca, ...”
Eu não vejo alquimia de mutação, ou do transbordar. Apenas troca de bens ou serviços que satisfazem os interesses dos intervenientes. Caso contrario não há alquimia que lhes valha.

“A ´mão invisível’, a que converte o interesse próprio em utilidade de outrém, é o mercado, o teatro de troca de bens e serviços; ...”
Não me parece que o interesse próprio, como que num passo de magica, possa ser convertido em utilidade de outrem. A única coisa que me parece mais parecido com isso é a publicidade que pode criar necessidades.
Ou há interesses convergentes/coincidentes ou divergentes/discordantes.
Não vejo razão, utilidade ou necessidade em utilizar terminologia diferente da existente para tentar explicar as mesmas coisas.

vbm disse...

Nada de místico na ´mão invisível’. Apenas a metáfora expressiva de como o suposto ‘pecado’ anti-cristão do egoísmo, se transmuta numa virtude socialmente benéfica. Quanto à troca, ela é o operador que evita o “transbordar” da produção que excede o auto-consumo de se converter em mero despedício, conferindo-lhe um valor de troca regulado pela oferta e a procura, no ‘teatro’ mercantil.

Agora, há um aspecto que concordo se enfatize, qual seja o de, por muito que custe ou não custe a produção de que quer que seja, nenhum bem é transaccionável se não tiver interesse ou utilidade nehuma assim como será sem preço se for abundante sem nada custar.

No fundo, ainda respeito a fisiocracia, reconhecendo a fecundidade da natureza na criação do valor, e embora aceite que o trabalho possa medir o custo de reprodução ou replicação dos bens, não posso deixar de valorizar a inteligência e a contribuição da ciência, da tecnologia, e do grau de civilização atingido na formação do valor, pela produtividade que faculta ao trabalho