sexta-feira, setembro 02, 2011
O maquiavélico plano Franco-Alemão (5)
O que até as porteiras em França sabem
Imaginem um casal de agricultores; têm uma pequena quinta, árvores de
fruta, hortícolas, cabras. Todo o ano trabalham na quinta. Têm alguns
utensílios e uma carrinha que compraram a crédito. Consomem parte do que
produzem, outra parte vendem. Compram adubos, medicamentos para eles e para os
animais, produtos alimentares que não produzem, roupa, têm despesas com a
carrinha, pagam electricidade e água, etc.
O resultado do seu trabalho, de todo o seu trabalho, incluindo as
reparações na casa, a valorização que pode ter ocorrido da quinta, corresponde
grosso modo ao conceito de PIB; a diferença entre o que venderam e o que
pagaram corresponde grosso modo ao saldo da sua balança de pagamentos.
Suponhamos agora que eles precisam de comprar um pequeno tractor e vão
ao banco pedir um empréstimo; em que é que se baseia o banco para conceder ou
recusar o empréstimo?
No valor do seu PIB?
Na dívida que eles ainda têm para pagar dos empréstimos anteriores?
A primeira coisa que interessa ao banco é o saldo da sua balança de
pagamentos mais a valorização da sua propriedade; se a soma das duas coisas é
negativa, ou seja, se a propriedade se desvalorizou e o saldo é positivo mas
menor que a degradação da propriedade, ou se a propriedade se valorizou mas o
saldo é mais negativo do que a valorização, ou se ambas as coisas são
negativas, sem perspectivas de se tornar positiva nem mesmo com o novo tractor,
a resposta é negativa, qualquer que seja o montante do PIB e por mais insignificante
que seja a dívida anterior.
Isto é exactamente o que se passa com a economia dos países.
O montante da dívida pública é irrelevante em si mesmo; o que conta é a
capacidade do país em produzir riqueza que chegue para pagar os seus juros; ou
seja, o que conta é, grosso modo, o saldo da balança de pagamentos adicionado à
variação do PIB.
Se um país tem um saldo da balança de pagamentos negativo e um PIB que
não cresce, evidentemente que está a empobrecer, logo não vai conseguir pagar
as suas dívidas. Não interessa se as dívidas são muitas ou poucas, ele não vai
conseguir pagar os juros da dívida que tem, pelo contrário, vai precisar de
pedir mais dinheiro emprestado para tapar o seu saldo negativo.
Ora Portugal tem um saldo da balança de pagamentos altamente negativo e
um PIB que não cresce; evidentemente que não vai poder pagar as suas dívidas,
nem a pública nem a privada. Não interessa para nada se a dívida é grande ou
pequena, a única coisa que interessa é saber se a economia tem um desempenho
positivo ou negativo.
Daqui é fácil concluir que é completamente indiferente que a dívida
pública cresça 5 % ou 1% ou diminua; enquanto o desempenho da economia for
negativo, não há mais empréstimos!
Suponhamos agora que se descobre petróleo na costa portuguesa e que
isso perspectiva que a balança de pagamentos se torne altamente positiva; como
é evidente, não faltará quem queira emprestar dinheiro ao estado, não interessa
qual seja o valor da dívida pública. Como vêm, o montante da dívida pública, por
si só, é irrelevante.
Suponhamos que passamos dois anos a apertar o cinto, que o Estado vende
as empresas públicas todas, despede os boys todos, fecha os centros de saúde
todos, vende a Madeira aos espanhóis e os Açores aos americanos, e com isso
tudo consegue o feito impensável de reduzir a dívida pública a metade; como
reagirão os mercados?
Aumentando os juros porque o resultado disso é que a economia do país
ficou pior, o país desvalorizou e o saldo da balança de pagamentos só se
agravou pela certa.
Portanto, a única coisa que vai fazer diferença daqui a dois anos não é
se o governo cumpriu ou não as metas do déficit público; o que vai fazer a
diferença é se o país se valorizou (aumentou o PIB) e se o saldo da balança de
pagamentos está positivo.
Ora nada disso vai acontecer com as actuais medidas. E isto qualquer
porteira em França sabe. Em França e em qualquer parte do mundo. Toda a gente
sabe que o que conta é se se produz mais do que se gasta ou não. É por isso que
os franceses, ou os alemães, ou os ingleses, querem saldo positivo nas contas
da sua região, é por isso que são altamente regionalistas e tomam as medidas que
forem necessárias para o conseguir. E desprezam aqueles, como os Portugueses,
que o não fazem.
Mas, dirão vocês, se o Estado cortar as suas despesas e aumentar as
suas receitas, fica em condições de pagar a dívida pública; então porque hão-de
os juros continuar a subir? Qual é o problema?
Reparem no seguinte: se a balança de pagamentos é deficitária, a dívida
do país tem de aumentar; mas quem vai emprestar dinheiro à banca de um país
deficitário? A banca vai ter grandes dificuldades de crédito, como está a ter;
então, vai dar menos crédito; ora se a balança de pagamentos está negativa é
porque pessoas e empresas estão a viver do crédito e, reduzindo-se este, vão
falir. Então, o desemprego vai aumentar, estoirando com as contas da segurança
social, e as pessoas vão deixar de pagar os empréstimos que contraíram, o que
significa que a banca vai falir; de repente todos os empréstimos às empresas,
para compra de habitação, para compra do carro, etc, vão passar a «activos
tóxicos», vão dizer que a culpa é da ganância dos banqueiros e com isso vão
justificar a falência generalizada da banca nacional.
Com o saldo da balança de pagamentos negativo, o país inteiro vai
falir.
Mas se assim fosse, perguntam vocês desconfiados, então porque é que
estão a tomar estas medidas? São todos ignorantes? Não sabem o que andam a
fazer?
Claro que sabem! Sabem desde que a União Europeia foi criada, este
desígnio estava traçado desde o primeiro momento, como os economistas fora da
Europa se têm fartado de dizer. O que agora estão a fazer é apenas a executar a
fase final do maquiavélico plano, que compreenderemos claramente no próximo
post.
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6 comentários:
Meu caro Alf,
Você continua um zero a finanças!
Só nos resta esperar por um milagre. Somos bons nisso.
eu tenho esperança de ler a continuação. tenho aguardado com ansiedade.
Nõ te deixes abater por comentários infelizes.
Por favor.
Diogo, o que eu digo neste post nem é novidade nenhuma nem é contestável. Os economistas fora da europa estão fartos de o dizer e os dos outros países da europa também, a mim têm-mo dito repetidas vezes - onde é que pensa que eu fui buscar isto?
isto é tão gritante, tão claro, que a única questão que se põe para os economistas fora daqui é saber quando é que Portugal vai desaparecer - está a durar mais do que as previsões se quer saber.
É tão expectável que até os romancistas que incluem Portugal nos seus romances já o poem como facto, para que os seus romances não fiquem datados no tempo... como já mostrei...
antonio
Todos os problemas têm solução; mas para a encontrar é preciso perceber o problema. É o que estamos a ver se conseguimos aqui. Depois, será uma questão de nos mobilizarmos... quando é preciso também somos bons nisso...
UFO
Desculpa, estive fora uma semana e não deu para manter o ritmo dos posts; vamos lá a ver se ainda hoje ponho outro. Abraço
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