segunda-feira, abril 19, 2010

A Origem do Sexo

Quando começámos a nossa busca sobre o que seja Inteligência, vimos que o processo mais elementar é  «Acaso+Selecção», ou «A+S».

Qualquer processo mais sofisticado de Inteligência exige capacidades novas, nomeadamente a «Aquisição de Informação» e a «Comunicação». Comunicação que serve para transporte e troca dessa Informação. Por agora interessa-nos a Comunicação.

Sabemos como a capacidade de comunicação entre os humanos está indissociavelmente ligada ao nível de complexidade que a sociedade humana pode atingir. A Fala permite apenas sociedades do tipo tribal; a Escrita, mesmo rudimentar, veio permitir as primeiras grandes civilizações; depois, a invenção de Gutenberg permitiu-nos sair da Idade Média; os Media permitiram a sociedade global; a Internet está a permitir um novo nível de desenvolvimento.

Vemos assim que a capacidade de comunicação está associada a um nível de Inteligência. Por outro lado, quanto mais evoluída uma organização, maior nível de Inteligência exige para poder funcionar. Portanto, uma sociedade que dispõe de uma certa capacidade de comunicação poderá dispor de um certo nível de Inteligência; se este é superior ao necessário para o estado de desenvolvimento da sociedade, esta evoluirá até que atinja o grau de desenvolvimento correspondente à Inteligência de que dispõe; aí ficará estagnada. Isto pressupondo que outros factores necessários ao processo de Inteligência não escasseiam, como a Energia.

Percebem como coisas como a banda larga, o e-escolas, o Magalhães, a informatização dos serviços públicos são essenciais? Isso é determinante da sociedade que poderemos ser.

Temos uma percepção clara destas formas de comunicação racional que usamos no dia-a-dia, mas ignoramos quase tudo quer sobre as formas de Comunicação dos outros seres vivos, quer sobre as de Aquisição de Informação (por exemplo, não conhecemos como se orientam os animais, da formiga ao pombo correio). E nem falo da simples transmissão de Vontade (vulgo transmissão de pensamento). E, como ignoramos, não temos percepção da sua complexidade.

Reparemos nas formigas, por exemplo. São cegas, é claro, de quase nada lhes serviria a visão no seu mundo; no entanto têm uma complexa sociedade só possível graças a um complexo sistema de comunicação.

Mas muito mais complexos são os animais eles mesmos. Naturalmente que devemos esperar que a comunicação entre células seja altamente sofisticada para suportar o elevado nível de Inteligência necessário à existência de um ser vivo. A descoberta das comunicações celulares no nosso organismo ainda está no princípio e já é um oceano de complexidade. Repare-se apenas na precisão micrométrica com que as células conhecem a sua localização no organismo.

Temos de descer a formas mais elementares de Vida à procura de processos de comunicação que possamos entender: vamos às bactérias.

Em 1946 Joshua Lederberg, um homem notável, descobriu uma incrível forma das bactérias comunicarem. Ganhou um Nobel por isso. Sabem como é? Nem vão acreditar. Reparem na figura:



 Schematic drawing of bacterial conjugation. Conjugation diagram1- Donor cell produces pilus. 2- Pilus attaches to recipient cell, brings the two cells together. 3- The mobile plasmid is nicked and a single strand of DNA is then transferred to the recipient cell. 4- Both cells recircularize their plasmids, synthesize second strands, and reproduce pili; both cells are now viable donors
 (Fonte: wikipedia)

Os vossos olhos não vos estão a enganar: as bactérias usam mesmo um Pilus para transferirem informação de umas para as outras! É desta forma, conhecida como «conjugação», que elas difundem rapidamente soluções para enfrentar problemas ambientais, como antibióticos.

É claro que isto é um processo que implica um nível de Inteligência elevado – não se trata de transmissão de informação ao Acaso, mas de informação relevante, da qual resultam alterações de estrutura e funcionamento da bactéria. Também revela um comportamento social das bactérias. Não é um comportamento do qual resulte uma vantagem imediata para a bactéria que tem o Pilus, pelo contrário, ela transmite às outras uma vantagem sua. Não pode ser explicado de forma simples.

Para quem conhece um mínimo sobre o funcionamento da célula, isto não é particularmente surpreendente: os processos que decorrem no seu interior são tão sofisticados como este. Mas esta é uma evidência da existência de processos Inteligentes e não «egoístas» a nível das bactérias que não é escamoteável e é particularmente chocante para muitas pessoas. Por alguma razão, algo que é conhecido desde 1946 continua fora dos manuais escolares.

Este processo de troca de informação através do Pilus é uma espécie de internet do mundo bacteriano.

Como é evidente, este sistema de troca de informação não pode funcionar assim entre os metazoários, os seres vivos multicelulares diferenciados. A informação que as bactérias trocam permite-lhes modificarem-se para se adaptarem às condições do meio; os metazoários são estruturas demasiado complexas para se poderem modificar desta maneira. Então, a solução é a formação de um novo indivíduo que incorpora a nova informação. Logo, a troca de informação genética entre metazoários tem de resultar na formação de um novo indivíduo!

Como vêm, esta «conjugação» entre bactérias está na origem do sexo nos metazoários. O Pénis é mesmo a evolução do Pilus, embora seja comum afirmar que nada há de comum entre os dois, cruz credo que horror! O Sexo não existe por causa da Reprodução, que pode ser feita sem sexo, mas para transmitir informação sobre adaptação ao mundo exterior. Para transmitir experiência de vida. E isto, por outro lado, implica também a morte dos progenitores, para que estes sejam substituídos pelo novo ser produzido de acordo com a informação recolhida. Ou seja, o equivalente à «conjugação» das bactérias é a reprodução sexuada seguida da morte dos progenitores nos metazoários. Morte esta que é geralmente (nem sempre) imediata à postura dos ovos nas espécies inferiores mas deixa de o ser em espécies mais evoluídas pela necessidade dos progenitores cuidarem das crias. E se prolonga ainda mais na nossa espécie porque precisamos de mais tempo para transmitir informação não codificada geneticamente.

O sexo e a sucessão de gerações são inerentes ao processo de transmissão de informação / acumulação de conhecimento entre os metazoários. São processos necessários à Vida, não ao indivíduo. A nossa noção de individualidade alimenta-se da nossa fraca percepção da Vida como um todo de que fazemos tanto parte como cada célula do nosso corpo faz parte de nós. 

16 comentários:

antonio ganhão disse...

A origem do sexo é mais interessante que o da vida... sinto-me metazoário na necessidade de transmitir informação, difundir o conhecimento, de penetrar o pilus na inocência aberta de quem se abre ao conhecimento.

alf disse...

antónio, esse comentário é muito melhor do que o post rsrsr

Mas desiluda-se... ninguém se abre ao conhecimento...

Diogo disse...

«Então, a solução é a formação de um novo indivíduo que incorpora a nova informação. Logo, a troca de informação genética entre metazoários tem de resultar na formação de um novo indivíduo!»


Até que enfim! Você chegou finalmente à minha tese: a nova geração representa a evolução (se tiver havido necessidade disso), da espécie. E é por isso que a velha geração tem de morrer.

Falta-lhe um último passo: como cada indivíduo pode «descobrir» uma forma ligeiramente diferente de evolução, os metazoários reproduzem-se sexualmente (trocam informação), para que a nova geração venha homogénea.

A reprodução sexuada não é uma forma de diferenciação, mas uma forma de manter a homogeneidade na espécie.

alf disse...

Diogo

E assim vamos entendendo o Como e o Porquê de as coisas serem como são; é esse entendimento que gera o «saber» e nos permite depois tomar decisões acertadas sobre como proceder, desde as pequenas decisões do dia-a-dia às grandes decisões orientadoras da humanidade.

O «Como» sem o «Porquê» não é sabedoria, embora muitos digam que é toda a sabedoria que precisamos de ter.

Ena, hoje estou muito filosófico rsrsr

alf disse...

Diogo

"A reprodução sexuada não é uma forma de diferenciação, mas uma forma de manter a homogeneidade na espécie."

Interessante pensamento... os dois ainda vamos fazer uma nova teoria de evolução...

antonio ganhão disse...

Ora bolas!

andrecruzzzz disse...

http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=planetas-giram-direcao-orbita-contraria&id=020130100413

http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=objeto-cosmico-velocidade-superluminar&id=020130100415

achei estes links interessants e lembrei-me d si caro alf.

alf disse...

andrecruzzzz

Obrigado! Esse «site» tem coisas interessantes, gostei de conhecer

Em relação aos planetas, na verdade, não se trata de planetas como os do sistema solar. Muitas estrelas (suponho que a maioria) são sistemas binários, o que indica que o processo de formação de estrelas tende a gerar um par de corpos; é possível que muitas vezes um desses corpos não tenha massa suficiente para iniciar a fusão nuclear e surja assim como uma bola de hidrogéneo semelhante a Jupiter e maior.

Num processo de condensação de uma nuvem de matéria, como a velocidade angular cresce quando a distância ao centro de condensação diminui, o que é de esperar é que os corpos que se formem tenham rotação oposta à translação, tal como se observa nestes casos.

No caso do sistema solar, o que se observa é que a rotação dos planetas é no sentido da translação e isto é que não parece de acordo com a hipótese nebular.

Tenho outra explicação para a formação do sistema solar e a descoberta de que estes exoplanetas rodam como se esperaria a partir de um processo de condensação nebular serve de suporte à minha hipótese pois mostra o sistema planetário e os exoplanetas não se formaram da mesma maneira.

Quanto ao objecto de velocidade supraluminar, o que é lógico pensar é que pelo facto de se encontrar na direcção de um aglomerado de estrelas se presumiu erradamente que lhe pertenceria; na verdade, deverá estar muito mais próximo e por isso a luminosidade e velocidade que lhe foram atribuidas estão erradas.

Joaninha disse...

Mas que bonito post Alf!

Completamente de acordo.

beijos

Diogo disse...

Então Alf?

Não se escreve nada? A evolução parou? Mandrião!

alf disse...

Joaninha

delicioso e surpreendente o teu comentário! Fico muito feliz que tenhas achado que o post é bonito.

alf disse...

Diogo

«Mandrião» será a palavra certa... mas parece que anda tudo apostado em me roubar tempo... dê-me mais uma semaninha, está bem?

alf disse...

quarentão

Não tenho a mesma perspectiva em muitos aspectos.

Quanto a sociedade humana entrou em sobrepopulação em relação aos recursos que conseguia obter da natureza, o que aconteceu há vários milhares de anos atrás, estabeleceu-se a luta pela sobrevivência, a luta entre grupos, tribos, sociedades; nestas lutas, os guerreiros eram prodominantemente os homens, logo as vítimas também. Portanto, a população humana desde essa altura que tem excesso de fêmeas, salvo nos pequenos períodos em que os recursos suplantaram a população.

A poligamia é uma forma de garantir que todas as fêmeas têm o seu macho; nos tempos violentos da antiguidade, nem as crias humanas (as crianças) nem as fêmeas (as mulheres) podiam sobreviver sem um macho.

Mas cada mulher pode ter 20 filhos, em média; ora numa situação de sobrepopulação, isso é catastrófico. Havia que controlar a natalidade.

A perseguição ao sexo tem a ver com isso. Sexo= reprodução antigamente e a reprodução era a origem de todos os males, o que tinha produzido a «expulsão do paraíso», criado o inferno na Terra; porque a sobrepopulação é verdadeiramente o Inferno, não há nenhum inferno pior, pois é aquele em que a sobrevivência de cada um só é possível se ele matar os outros.

Os casamentos primitivos tinham uma falha, qd as mulheres envelheciam os homens abandonam-nas, o que equivalia a uma condenação à morte. Então, para protecção das mulheres, criou-se o casamento para a vida; e para limitar a reprodução o casamento monogâmico.

Há outra razão para o casamento monogâmico, que tem a ver com os intintos de muitas mulheres, com o seu instinto de propriedade e de pertença a um macho.

Nas tribos primitivas, o fabrico de venenos é segredo que só os homens possuem; a razão para isso é que, dizem esses homens, se as mulheres soubessem fazer veneno envenenavam-se umas às outras.

Homens e Mulheres têm cada um as suas idiosincrassias e a sociedade foi-se organizando para se compatibilizar com elas.

A monogamia tem como consequência o aparecimento de muitas mulheres sem homem; uma solução foram os conventos de freiras e as actividades que só podiam ser desempenhadas por mulheres solteiras, como enfermagem.

Não há «homens fracos», não há homens rejeitados pelas mulheres; mas as mulheres, para aceitaram sexualmente um homem, têm de ser primeiro deflagradas, como qualquer fêmea. É necessário que o homem faça a corte, a sedução, a «dança nupcial». Ora acontece que nem todos os homens estão para isso.

O que há é portanto homens que querem ter acesso às mulheres sem a chatice da «dança nupcial».

O casamento é uma forma de o conseguir - ele dava o direito ao homem a ter sexo qd lhe apetecesse sem ter de estar a deflagrar a mulher. Hoje isso já não é assim e há muitos divórcios porque elas recusam-se a ter sexo sem «estarem deflagradas» e como eles não o sabem fazer, não faz parte da sua cultura, nunca foram ensinados a tal, não sabem ultrapassar o problema. Além de outras razões, porque os instintos das fêmeas, humanas ou outras, condicionam a capacidade do mesmo macho a deflagrar por um período superior a meia dúzia de anos.

Bem, isto seria uma longa conversa...

Diogo disse...

Umquarentao, leia lá o Desmond Morris.


Alf, então essa merda sai ou não sai?

Fátima Lopes disse...

Olá Alf,

Passei por aqui e de uma só vez li os últimos 3 posts. Todos muito interessantes. Gostei de saber que não estou sózinha na minha crença na "vida inteligente". Isso do acaso e da aleatoridade não me convence. A propósito destes temas, fiz um post um pouco nesta linha, se bem que, sem o fabuloso nível de conhecimentos do Alf! Eu sou muito ignorante nestas áreas, move-me apenas a curiosidade e o espirito critico. Mas fica o convite para passar no meu blog e comentar o post "Biodiversidade"

Beijinhos e boas postagens.

Pink

alf disse...

Olá Pink e Blue

Obrigado pelo teu interesse.

Conhecimentos eu? Olhei para dentro de mim, à procura deles, e só encontrei «vagas ideias»... os conhecimentos estão fora de nós, na wikipedia, na net, nos livros, na tv, em tudo o que acontece à nossa volta. Ou seja, os teus conhecimentos são tão bons como os meus, e vamos construindo compreensões ou não das coisas a partir do que vamos pensando.. e que tu pensas tem tanto interesse como o que eu penso.

Escrevi imenso no comentário ao teu post... hoje estou para as filosofias... estimulaste-me, és a culpada rsrsrs

Bjs e obrigado