sexta-feira, maio 01, 2009

Processos Inteligentes Não Evolutivos


A lagarta da Biston Betulária assume a cor castanha à esquerda e a verde à direita (da Wikipedia)

Um caso que se apresenta como paradigmático do Darwinismo é o das borboletas da espécie Biston Betularia: em Inglaterra, antes da revolução industrial, estas borboletas seriam maioritariamente de cor clara; depois, com o ambiente escuro produzido pela poluição, as borboletas pretas tornaram-se dominantes; actualmente, a população das claras tem vindo a aumentar. Um claro exemplo da Selecção Natural, diz-se: as borboletas pretas viam-se melhor antes da revolução industrial, por contrastarem com o fundo claro das bétulas em que repousavam, sendo comidas pelos pássaros, enquanto o contrário sucederia depois da revolução industrial, onde eram as pretas que escapavam às esfomeadas aves, assegurando uma descendência de borboletas pretas – a Selecção Natural encontrara assim a cor certa para assegurar a sobrevivência das borboletas.

Este caso, frequentemente citado ainda hoje, mostra bem como as ideias mais absurdas podem ser aceites como verdadeiras e lógicas desde que sejam simplórias. Mas isto é «Lógica da Batata». Porque se as coisas se passam assim, este caso é completamente banal, não tem o mais pequeno interesse, não prova absolutamente nada. Antes pelo contrário, as borboletas brancas estão de volta, logo isto nada pode ter a ver com «evolução», porque esta tem um sentido, o homem não pode evoluir para o macaco...

Subjacente a esta explicação inútil está a ideia de que a Natureza é estúpida, sendo a Inteligência propriedade exclusiva dos humanos, o seu dom Divino; como estúpida que é, gera indiscriminadamente borboletas pretas, brancas e cinzentas. Mas cabe uma questão: se a natureza é tão estúpida, porque se dá ao trabalho de fazer borboletas em 3 tons?

Há, porém, um aspecto completamente ignorado neste processo que pode dar-lhe algum interesse:
a borboleta, antes de o ser, é uma lagarta! Então, enquanto lagarta, ela percepciona o mundo exterior e pode fazer escolhas sobre a borboleta que há-de ser. Será que é a experiência de vida da lagarta que determina a cor da borboleta? Será a lagarta uma espia do mundo exterior? Não sei, ninguém se lembrou de fazer tal experiência... Mas há um aspecto que deveria ter chamado a atenção dos cientistas: a lagarta desta borboleta tem propriedades miméticas!

Já viram como pode ser útil a capacidade de espiar como é o Mundo antes de fabricar o produto final?

Já repararam que nós temos esta capacidade?

Na verdade, um bebé não deixa de ser uma forma larvar do ser humano. Porque no bebé não está completamente definido o adulto – os módulos que hão-de integrar o seu cérebro não estão ainda definidos. O bebé nasce com o objectivo de interagir com o mundo exterior, de o explorar, e é a partir dessa exploração que se definirão as suas capacidades.

Por exemplo, sabe-se que uma criança que cresça isolada dos humanos e não aprenda a falar até aos 8 anos, nunca conseguirá falar correctamente – o seu módulo de comunicação pela linguagem não se desenvolveu. Mas outros módulos de comunicação se desenvolveram, mais adequados ao mundo que ela experienciou.

Sabemos também que alguns têm «ouvido musical», outros nem pouco mais ou menos. É outro módulo mental. Como a aptidão para a matemática é também um módulo mental. Ou a aptidão para descodificar as expressões faciais. Ou a aptidão para a dança. Ou para o teatro. Ou para a pintura. Ou para a poesia. Ou para a corrida. Ou para sonhar.

Há inúmeros parâmetros no projecto do nosso cérebro, envolvendo a maneira de pensar e de sentir; são parcialmente definidos geneticamente e são parcialmente definidos na nossa fase larvar, ou seja, nos nossos primeiros anos de vida, em que somos espiões do Mundo.

A capacidade da Vida de se definir em função da sua vizinhança é a base da construção dos seres vivos e das sociedades de seres vivos. É assim que o nosso corpo se forma: cada célula vai-se definindo em função das células vizinhas. É assim que uma célula estaminal se pode tornar em qualquer tipo de célula, ao ser colocada no meio de células desse tipo. É assim que certas espécies podem mudar de sexo mesmo na fase adulta.

É por isso que os primeiros anos de vida são tão importantes. É por isso que é mais importante a antecipação da idade escolar para os 5 anos do que o aumento da escolaridade obrigatória.

Dirão: «
então pessoas criadas exactamente no mesmo ambiente teriam as mesmas capacidades e personalidades». Nem pouco mais ou menos! Nascemos diferentes, o que a experiência dos primeiros anos de vida faz é a optimização dos parâmetros com que nascemos para o ambiente em que crescemos. A Diversidade é uma característica essencial da Vida.

Há em África uma região de lagos próximos. Lagos interiores, sem comunicação com o mar. Nesses lagos,
peixes ciclídeos foram introduzidos, e originaram muitas centenas de espécies em cada lago. E, coisa extraordinária, parece que essas espécies, que se terão desenvolvido independentemente em cada lago, apresentam grandes semelhanças em lagos diferentes. Quase como a especiação das células em dois seres da mesma espécie.

Isto sugere que a geração de espécies não resultou de um processo de erro, aleatório. Uma explicação é que a selecção sexual seria a responsável pela geração de novas espécies. Outra é que isto indicia a existência de um programa, um processo determinístico de geração de espécies. De geração de Diversidade. Seja como for, um facto sobreleva: a espantosa geração de diversidade, mais de mil espécies se originaram de um número pequeno (8, segundo um estudo) de espécies iniciais.

Notem que isto é o oposto das ideias que regem muitas teorias económicas, políticas e sociais: na Natureza, se tivermos 1000 espécies no mesmo ambiente, elas não competem até que fique só uma, mas é exactamente ao contrário, se existir só uma geram-se mil. A Natureza tem horror à uniformidade! A competição não é a regra, a lei não é a do mais forte.

Também a História da Matéria se inicia num estado de uniformidade absoluta, retratado pelo Ruído do Fundo Cósmico, e toda ela é o percurso da uniformidade para a diversidade, para a complexidade.

É por isso que somos todos diferentes. Mas todos iguais, porque não somos melhores nem piores em valor em absoluto.
Somos... diversos!

Percebemos assim que

- temos uma herança genética,
- temos um processo que gera, de forma possivelmente determinística, diversidade a partir dessa herança,
- temos uma fase «larvar» em que os nossos parâmetros são ajustados ao mundo em que vamos supostamente viver.

Três etapas na construção de cada indivíduo!

E nada disto tem a ver com «Evolução». Nem a cor das borboletas, nem as espécies dos ciclídeos. Seria o mesmo que dizer que as células da retina são uma evolução das células do fígado.

Mas ainda há outro factor que contribui para a nossa definição... a Natureza ainda é mais inteligente do que aqui se disse.

49 comentários:

ali_se disse...

Excelente texto!
E sobre esta comparação da criança e da lagarta e do que virá.
...ela percepciona o mundo exterior e pode fazer escolhas sobre ... que há-de ser......é mais importante a antecipação da idade escolar para os 5 anos do que o aumento da escolaridade obrigatória.Tive precisamente essa sensação com a minha filha, que por fazer anos em Janeiro perdeu (como que um ano de escolaridade) aos que faziam anos em Dezembro. E arrependi-me de não antecipar o processo e isto pelo que presenciei de ânsia e enorme expectativa (por volta dos 4-5 anos) a um forte curiosidade pela aprendizagem da escrita e da leitura, e que assim, foi deslocada de um seu tempo, que depois considerei, lhe devia ser como o devido.

... geração de Diversidade...isto é o oposto das ideias que regem muitas teorias económicas, políticas e sociais: na Natureza, se tivermos 1000 espécies no mesmo ambiente, elas não competem até que fique só uma, mas é exactamente ao contrário, se existir só uma geram-se mil. A Natureza tem horror à uniformidade! A competição não é a regra, a lei não é a do mais forte.Esta ideia está claríssima e que eu concordo plenamente e por isso igualmente eu tanto me insurgir sobre essas modelares e insistentes discrepâncias da competição e da lei do mais forte.

É por isso que somos todos diferentes. Mas todos iguais, porque não somos melhores nem piores em valor em absoluto. Somos... diversos!
E já agora todo este processo de Vida e do Ser, se não de «Evolução», poderá ser então considerado, como referes: de Geração de Diversidade ou como refere Bergson: de Evolução Criativa?

Abraço de Alice Valente

Anónimo disse...

Muito interessante, muito interessante!!

Abs,

Rodinsky

UFO disse...

brilhante, magister !
tão estúpido os evolucionistas agarrarem este exemplo das borboletas. de facto só mostra selecção e não evolução/involução.
a experiência até poderá, creio, ser efectuada em ambiente controlado para mostrar que as duas variedades são apenas uma que se adapta ao ambiente através das capacidades das suas lagartas (brilhante).
a evolução das espécies está bem documentada através da evolução do ADN e aqui concordo em absoluto com as tuas conclusões. a 'lei do mais forte' (Herbert Spencer: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sobreviv%C3%AAncia_do_mais_apto) mas não me parece correcta em sentido restrito, singular.
Todas as espécies sobreviventes são, na minha perspectiva, 'o mais forte'.
A frase é mal entendida ou dúbia por estar no singular. Tanto o leão como a sua presa são 'o mais forte'.
A Vida aproveita todos os nichos, todas as oportunidades, tolera todas as alianças em ordem a aproveitar toda e qualquer oportunidade de acesso ao alimento.
A Diversidade é a única garantia de sucesso e já estará presente nos nossos genes. Aqui e agora são activados os programas convenientes e desactivados (mas não apagados) os que foram substituídos.
A Diversidade é favorecida através do cruzamento sexual e em menor grau por mutações (que desempenha o papel de explorar caminhos ainda não testados).
É importante também a Manutenção de Ambientes diversificados para criar a diversidade. Por exemplo a Globalização é sinónimo de uniformidade e esta 'mata' todas as formas 'diferentes' de produção. Traz custos acrescidos de energia no transporte a longas distâncias. É irracional na gestão de energia.
Num mundo sem fronteiras as diversas raças humanas tenderão a ficar muito miscigenadas, com perda de características diferenciadoras. Aqui, não sendo eu racista, creio que ganhamos todos com a manutenção da diversidade para mantermos mais vias de acesso para possíveis futuros distintos, que não podemos seleccionar à priori.

O bebé cria o seu futuro adaptando as capacidades mais relevantes. brilhante.

alf disse...

Ali_se, obrigado por tão amáveis palavras.

Eu estou apenas a tentar recentrar as ideias sobre evolução nos seus trilhos originais e tentar prosseguir o esforço feito pelas pessoas que a ele se têm dedicado. O esforço de descoberta e compreensão, que se pode fazer de muitas maneiras, quer experimentando, quer observando, quer pensando. As ideias dessas pessoas têm sido usadas para fins que nada têm a ver com a compreensão do processo da Evolução, que é coisa que, na verdade, interessa a muito pouca gente. Têm sido usadas para fins políticos, económicos e sociais, que é coisa que interessa a muita gente, e neste uso são distorcidas para suportar as «verdades» que se procura impôr.

Isso é importante porque daí dependem, em parte, os objectivos da sociedade humana; precisamos de perceber o nosso papel e o nosso caminho.

Quanto à sua filha não ter entrado mais cedo na escola, não sei se isso é bom ou mau; isso é importante para crianças que não têm em casa o ambiente cultural adequado, mas, para quem tem, até pode ser negativo, pois a primeira classe é uma coisa um bocado estupidificante.

Quanto ao Bergson, pouco sei dele, penso que ele se preocupou sobretudo em entender o nosso cérebro; pensou que tentou pôr em evidência aquilo a que chamou Intuição, com o que estou de acordo, no meu modelo de cérebro isso corresponde a todo o nosso funcionamento inconsciente, que tem uma importância avassaladora e uma enorme capacidade de processamento que procuro utilizar conscientemente.

Creio que a relação entre as suas ideias e a geração da Diversidade será vaga, mas não estou informado, e agradeço-lhe os esclarecimentos que puder fazer.

alf disse...

Rodinsky

Um comentário desses vindo dum especialista ultrapassa tudo o que eu poderia esperar! Vamos a ver se não te assustas com o que vem a seguir...

alf disse...

UFO
Obrigado pelo teu entusiasmo!

A versão em inglês da página da Wikipedia que citas está bastante mais completa do que a versão portuguesa, traduzida do «simple english»

Na natureza, algumas espécies têm uma organização familiar / tribal que dependem de um lider, que é escolhido pela força. Mas:
- não é a «lei do mais forte» mas é uma escolha de mérito; simplesmente, o «mérito» a esse nível mede-se pela saúde física;
- não é regra geral na natureza nem pouco mais ou menos, só existindo em grupos de muito pequena dimensão e com grande ligação - mesma espécie, mesma família.

Curiosamente, na Natureza são abundantes os grupos sociais sem líderes - um cardume não tem líder por exemplo, mas também há exemplo mesmo nos mamíferos. Os grupos grandes, ao contrário dos grupos pequenos, organizam-se sem terem um líder.

as sociedades humanas primitivas eram lideradas por conselhos de anciãos, nada que se parecesse com a ideia do «mais forte»

O Líder forte, tal como o Deus monoteísta, surge para organizar sociedades militares, sociedades que visam a guerra, a destruição dos outros grupos.

Isso não existe na natureza, os grupos visam apenas a defesa dos territórios necessários à sua sobrevivência.

Mas as sociedades humanas não conhecem hoje nenhuma forma de organização política que não passe pela existência de um líder, embora no passado tenham experimentado outras soluções (e existirem mesmo hoje noutras áreas). Então colocou-se o problema da legitimidade do líder.

A legitimidade dos reis era de origem divina, tal como a dos líderes religiosos.

Com o advento da economia, o poder passou a residir no dinheiro; os lideres passaram a ser os mais ricos; assim, reis e Papas eram os mais ricos da época nos seus domínios.

Ainda hoje, isso acontece, apesar da legitimidade ser supostamente conferida pelo voto - de José Eduardo dos Santos a Putin, passando pelo Berlusconi ou pela Raínha de Inglaterra, muitos dos líderes deste mundo são as pessoas mais ricas, ou seja, as «mais fortes».

Não há nenhum paralelo entre isto e o que se passa na natureza, pois nos casos em que existe a liderança do mais forte, esta funciona apenas em relação a grupos diminutos e de grande identidade.


a ideia do Grande Lider para gerir a Humanidade, tão «sec XX», é um disparate grave; a Humanidade tem de encontrar as melhores formas de se organizar mas, se quer ir buscar inspiração à natureza, tem de olhar para o que se passa nos grupos grandes e não nos grupos pequenos.

Mas isso só será possível depois da Humanidade resolver o problema do controlo da natalidade; até lá, andaremos sempre no limiar da sobrepopulação e em guerra permanente, a cair sistematicamente em sociedades tipo militar.

alf disse...

Por falar na ideia do «Grande Lider»... ainda é assim que pensam aqueles que criticam a presidência europeia do Durão Barroso. Eu não o tinha em grande conta, nenhuma mesmo, mas tenho de reconhecer que o mandato dele será o mais eficiente e produtivo de que tenho memória. Se calhar , a Europa não precisa de nenhum «Grande Líder»... a Europa não é a Coreia do Norte... estão a ver a diferença entre uma sociedade que depende de um «Grande Líder» e uma sociedade que se organiza doutra forma? E sabem qual é a grande acusação que se faz À actual organização da Europa? a de que não consegue ter uma resposta militar eficiente.

Pois é: lei do mais forte = grande lider = objectivos militares

Isto, evidentemente, não tem nenhum paralelo na natureza, os paralelos que se vão buscar visam apenas justificar estas opções escondendo as verdadeiras razões.

Unknown disse...

Acerca da ideia do "Grande Lider" / presidência da Europa : nunca tinha visto as coisas por esse prisma. Mais uma vez supreendeu-me caro alf. Em verdade não desejo um Bush nem mesmo um Obama aqui na Europa.

antonio ganhão disse...

"Antes pelo contrário, as borboletas brancas estão de volta, logo isto nada pode ter a ver com «evolução», porque esta tem um sentido, o homem não pode evoluir para o macaco..."

A borboleta preta é assim o macaco na sua evolução? No princípio eram pretas e depois ganharam cor!

É claro que a evolução não pode explicar tudo, tanto quanto não conseguimos entender o Criador! Esse é Seu mistério!

alf disse...

csousa

Essa ocorreu-me a responder aos comentários. Faz-se muita luz na minha cabeça com os comentários que recebo! e essa sua frase final torna tudo clarinho como água:

"Em verdade não desejo um Bush nem mesmo um Obama aqui na Europa"

alf disse...

antonio

Credo!!! é ao contrário - a teoria é que evoluiram para o preto. O macaco seria a borboleta branca.

Mistério? Confesso que não vejo aí mistério nenhum... apenas vejo a nossa ignorância. E acho a ignorancia uma coisa fascinante (se tudo soubessemos, que interesse teria a Vida, sem nada para descobrir?)

antonio ganhão disse...

A teoria explicava que por evolução as borboletas tinham passado de brancas a pretas, você é que disse que isso estava errado, uma vez que a evolução do homem nunca seria no sentido do macaco.

Quanto ao Mistério, é um conhecimento muito para além da nossa capacidade de compreensão... como sabe a ignorância é atrevida e muitas das vezes explica e esclarece erradamente, tal como acontece com a teoria da evolução. A ignorância nunca impediu ninguém de explicar algo de forma definitiva.

Diogo disse...

Caro Alf, você tocou numa das minhas especialidades.

Agora são 23:45. Amanhã explico-lhe o segredo da evolução. Você não está muito muito longe, mas falta-lhe dar um grande passo.

Prometo. Amanhã tem uma explicação completa.

alf disse...

António

a teoria dizia que a passagem das brancas às pretas era evolução; mas como as brancas voltaram, teriamos uma «evolução» brancas-pretas-brancas. Ora a «evolução» não faz «marcha-atrás», logo esse processo de mudança de cor dominante não pode ter nada a ver com evolução, no sentido que eu lhe dou, ou seja, não acontece macaco-homem-macaco.

Eu creio que percebeu, trata-se apenas de um poético jogo de palavras, mas nestas coisas não devo deixar duvidas no ar...

Esta sua frase é lapidar:

"A ignorância nunca impediu ninguém de explicar algo de forma definitiva". Vou juntar à minha lista de citações!

Note que eu não tenho a pretensão ou o objectivo de "explicar" as coisas, apenas de ir descobrindo peças do grande puzzle.

Note também que este post não é sobre «evolução», mas sobre acontecimentos e processos que erradamente se atribuem a evolução e não são, na minha óptica.

alf disse...

Diogo

Espero ansioso! Nada como da troca de ideias para nascer um pouco mais de Luz!

Note que eu ainda não comecei a falar de evolução - este post é sobre o que não é «evolução». E ainda não acabei de mostrar as coisas fantásticas que se passam e que podem facilmente passar por evolução e não o são, mas que nos dão a ilusão de que compreendemos o que seja evolução baseados em coisas que nada têm a ver com ela.

A seguir, vamos poder olhar, olhos-nos-olhos, para o cerne da questão da Evolução.

Diogo disse...

Caro Alf,

Também não sou darwinista. O que penso sobre isto não está muito longe do que você pensa. Mas há algumas diferenças importantes.

Em minha opinião a evolução acontece de acordo com estes três ditados (um inventado por mim e outro ligeiramente alterado):

a) Burro velho não aprende línguas ou é de pequenino que se torce o pepino.

b) Um pai cavador quer um filho doutor.

c) É da troca de informação que nasce a luz (no sentido de uniformizar o conhecimento adquirido e possibilitar a evolução da espécie no seu conjunto).


Vários indivíduos de uma determinada espécie apercebem-se (esta percepção é física – há uma inteligência física) de que existe uma qualquer alteração – seja uma nova espécie que os ameace, seja uma alteração ambiental, seja o que for que os coloca em risco – ou que há novas oportunidades se adquirirem determinadas capacidades.

Estes indivíduos já não se podem alterar (são burros velhos). Que fazem então? Trocam informação de uma forma física – reprodução sexuada – com os outros elementos da espécie e os novos indivíduos (os filhos) recebem a estratégia evolutiva a seguir: umas pernas mais (ou menos) compridas, uns dentes mais (ou menos) afiados, um cérebro maior, umas asas, um fígado, etc.

A reprodução sexuada é a forma de manter a uniformidade evolutiva dentro da espécie. É para isso que a reprodução sexuada existe e é por isso que existe a morte (natural). Esta destina-se a eliminar os indivíduos que já não são possuidores das novas alterações. A natureza mata-os para que não se continuem a reproduzir, para que a uniformidade da espécie se manenha.

Esta explicação está, sei-o, bastante sintética, mas serve como ponto de partida para um debate que gostava de ter consigo e com outros visitantes deste blog.

alf disse...

Visitantes deste blogue, querem dar opinião sobre a visão do Diogo?

Diogo, eu não comento nada agora porque o próximo post tem muito a ver com o que diz; seria interessante se alguns visitantes respondessem ao seu repto, assim o pensamento já estaria maduro para a continuação desta conversa.

antonio ganhão disse...

Bem gostei da morte como garante da evolução. Sem dúvida, se fossemos eternos ainda teriamos por cá todos os fósseis vivos (e não estariam confinados só à nossa vida política!).

Diogo disse...

António,

«Adult salmon return to their natal stream for reproduction. .... After spawning [desova] the salmon die. »

http://www.marinebio.net/marinescience/05nekton/sarepro.htm


Assim como o salmão, há muitos outros animais onde isto acontece.

Diogo disse...

Então, Alf?

Some plant and animal species die after spawning offspring -- but why?

Algumas espécies vegetais e animais morrem após desovarem a sua prole (após a reprodução) -- mas porquê?

http://videos.howstuffworks.com/discovery/34827-why-tell-me-why-spawning-death-video.htm

UFO disse...

sobre o DNA:

Nestes links estão dados interessantes sobre a história do genoma humano, comparado com o de ratos e outros...mostram que mais de 90% do nosso genoma é 'lixo' e comum a parentes distantes.
Longas sequências de ADN preservadas em comum parecia indicar a associação com alguma funcionalidade importante.
Feitas experiências com ratos geneticamente modificados nessas sequências, surpreendentemente não foram encontrados quaisquer problemas nos parâmetros em análise para o desenvolvimento e sobrevivência deles .

http://bejerano.stanford.edu/talks/BejeranoGoogleOct06.pdf

outros papers do Bejerano:
http://bejerano.stanford.edu/talks.html

com o google video web talk aqui:
http://www.molecularstation.com/forum/molecular-biology-lectures-videos/721-ultraconservation-living-fossils-mysteries-human-genome.html

o DNA tem partes funcionais, i.e. são as instruções de fabrico de proteinas (é o 'outcome' visível')
e tem maioritariamente outras sequências intercaladas que não são funcionais. São lixo ?

Eu creio que não será lixo.
A minha hipótese é a de que representam o arquivo de códigos que antigamente já funcionaram e que caíram em desuso por outros mais eficientes (ou convenientes no ambiente actual).
Representará também o código que se encarrega de controlar o acesso ao código 'operacional' (i.e. o código que 'executa o código'.
Comparando com os computadores será equivalente a termos o bios + sistema operativo + aplicações + dados aplicacionais tudo no mesmo repositório.
Quem faz software está habituado a não apagar o código que vai substituir. Deixa-o apenas inactivo (comentado). Toda a aplicação precisa de uma quantidade muito apreciável de dados de trabalho (constantes, variáveis, bases de dados, etc)
Quando os investigadores estudam o genoma centram-se no estudo das 'funções' que detectam pelo resultado que emana da núcleo da célula ( que aqui considero como uma 'black box' ) e apenas conseguem analizar a livraria das funções.
Mas o(s) programa(s) que ligam tudo e activam as funções (equivalentes aos 'deamons' que funcionam em background num sistema operativo) perante os estímulos apropriados não foram, creio, ainda localizado.

O ADN de uma ameba tem uma dimensão superior à do genoma humano. Isto leva a supor que não foi depurado das funções desactivadas. A ameba poderá sobreviver mesmo regredindo a soluções anteriores se necessário.
O genoma humano terá sido sujeito a 'lifting' talvez porque o organismo humano tem uma quantidade de células astronómica se comparada com a ameba (uma célula) e é preciso poupar no material de construção.

UFO disse...

Em vez de comentar a visão do Diogo vou submeter alguns conceitos que tenho sobre a Vida (não sobre a evolução propriamente dita):

'as formigas e o processo de decisão'

Um comentário na TV mostrava um estudo sobre 'as formigas e o processo de decisão' assinalava que elas tomavam as decisões sempre baseadas em poucos parâmetros disponíveis. As decisões num formigueiro são descentralizadas e não podem ficar pendentes à espera de melhor informação.
Creio que não existem formigas especialistas a escolher o melhor sítio para a localização do formigueiro, nem especialistas em geologia e em estruturas para definir a evolução da construção dos túneis.

Agora vou dar um exemplo de como a eficiência pode ser obtida usando as seguintes duas propriedades:
Cada formiga deixa um rasto de cheiro (feromonas) que persiste após a sua passagem.
Se não está a fazer nada (transportar comida ou terra), então desloca-se ao acaso (talvez 'random' sobre uma orientação inicial escolhida).

Eu, formiga, estou entretida a retirar grãos de terra e levá-los para fora do formigueiro à semelhança das outras formigas. Eu estou a trabalhar numa zona muito dura, uma amiga minha está a trabalhar numa zona muito movediça. O rasto de cheiro mais intenso coresponde às que estão a trabalhar no terreno com melhores propriedades porque fazem mais viagens de transporte. Depressa, eu e a minha amiga, dotadas de uma inteligência primária (seguir o cheiro mais intenso), também estamos a trabalhar junto com os que têm mais eficiência.

Com estes dois princípios as formigas são aventureiras em algum grau, de modo a permitir descobrir novos caminhos e suficientemente sábias para explorarem os mais viáveis.

Creio que todos os processos complexos apenas podem ser regulados por intermédio de um conjunto de funções simples, i.e. com poucos parâmetros, que respondem a mensagens simples, emitindo também mensagems e trabalhando em paralelo, à semelhança dos sistemas operativos e aplicações informáticas complexas de hoje.

A Vida na Terra como uma única entidade colectiva:

A Vida tende a aproveitar todos os recursos de energia renovável disponível (derivada da energia solar/geotérmica/vida,..).

Para que isso aconteça vemos uma multitude de Espécies diferentes, cada uma especializando-se num nicho energético.
A diversidade de ambientes é fundamental para termos muitas espécies diferentes com habilidades distintas e complementares e melhorar assim a sobrevivência da Vida em reposta à variabilidade do meio ambiente.
A uniformidade equivale a assassinar o futuro. É por isso que a Globalização representa uma ameaça à sobrevivência da vida humana.

Cada Espécie como um único organismo descentralizado.
O papel da sexualidade na diversidade evolutiva:
A amiba tem acumulado no seu ADN todas as respostas que já deu no seu longo passado de sobrevivente.
Cada amiba é igual a qualquer outra amiba (mesma espécie) e não tem nada a partilhar no seu ADN com qualquer outra.
Com os organismos de reprodução sexuada já o caso é diferente: todos somos diferentes mesmo dentro da mesma espécie e a partilha de conhecimento é por herança de material genético de distintos progenitores. Os progenitores não são apenas os 'pais' mas também todos os antecedentes deles. No presente partilhamos de todas as respostas que tiveram sucesso no passado.
Algums descendentes dos sobreviventes da gripe espanhola (+-1918) estão preparados para resistir a virus semelhantes.
A sobrevivência da espécie humana é garantida se houver sobreviventes 'bastantes' (dois ?) em qualquer eventualidade.
A sobrevivência da espécie amiba é garantida se houver um único sobrevivente mas, por outro lado, tem um seguro de sobrevivência mais limitado.


Porque é que os salmões morrem ao gerar a sua descendência ?

O orgasmo que experienciamos é como uma pequena morte. É quando estamos mais vulneráveis a qualquer ataque.

A sobrevivência individual de um espécimem não é importante. A sobrevivência da espécie é que é fundamental.

Os que nascem são outros 'eu'. Dito de outro modo: 'eu' não morro.

Os salmões colocam todas as hipóteses numa única postura de incontáveis descendentes no ambiente que lhes foi também favorável à sua própria sobrevivência. Para o conseguiram gastaram recursos energéticos enormes, que inviabilizam o reiniciar de outro ciclo.
Viver para além do necessário torna-se perigoso porque seria um concorrente para os seus descendentes. A sua morte contribui para o enriquecimento biológico (energia) para alimento dos filhos.
Outras espécies apostam em posturas periódicas, como na espécie humana, que diminuem o risco de insucesso total.

Diogo disse...

Ufo,

Você continua um darwinista da velha guarda.

Diz você que: «Os salmões colocam todas as hipóteses numa única postura de incontáveis descendentes no ambiente que lhes foi também favorável à sua própria sobrevivência. Para o conseguiram gastaram recursos energéticos enormes, que inviabilizam o reiniciar de outro ciclo.»

Errado, o salmão que chega a procriar tem uma morte natural de tal forma que se transforma internamente: “Salmon stop feeding as they enter fresh water. Their stomach is no longer needed and it begins to disintegrate internally - leaving more room for the developing eggs and sperm. They begin living off the stored fat in their tissues that has been accumulating during their life in the ocean.”

http://www.marinebio.net/marinescience/05nekton/sarepro.htm

Quanto às plantas que se reproduzem apenas uma vez (uma chega a atingir 100 anos), também não morrem por terem gasto «recursos energéticos enormes, que inviabilizam o reiniciar de outro ciclo».

Os seres vivos morrem depois de uma ou várias reproduções sexuadas para que não se voltem a reproduzir.

Todos os seres vivos de reprodução sexuada têm morte natural. O objectivo não é evitar a concorrência com os filhos, mas antes eliminar seres que são menos evoluídos que os filhos deles de forma a preservar a uniformidade (de uma geração mais adaptada) dentro da espécie.

Diogo disse...

Então, Alf? Você não entra na conversa? Continua o desmancha-prazeres do costume?

alf disse...

Diogo

o meu papel agora é mais ler do que escrever.. Eu vou escrever o que penso no post. Acontece que as coisas que se podem dizer sobre este assunto são tão variadas que cada um pode estar mais virado para um aspecto particular e não ter grande opinião sobre outros aspectos.

Em relação ao problema do indivíduo morrer a seguir à reprodução, acontece o seguinte: o o objectivo é gerar novas gerações o mais adaptadas possível às condições em que vão viver e no menor espaço de tempo.


Se a mesma geração se reproduzir várias vezes, isso gera muito menos diversidade do que se só se reproduzir uma vez - se os salmões se reproduzissem várias vezes, para o mesmo número de indivíduos a diversidade genética seria muito menor do que reproduzindo-se apenas uma vez. Ora o número de indivíduos está limitado pela capacidade do nicho que ocupa, logo a solução que permite a máxima capacidade de adaptação é ter indíduos que atingem rapidamente a maturidade sexual e se reproduzem apenas uma vez.

As bactérias dividem-se para se reproduzirem - logo, a bactéria «progenitora» desaparece a cada reprodução.

Para os animais superiores, cuja maturidade sexual é muito mais demorada do que o intervalo de gestação e o número de crias por gestação muito pequeno, então a natureza teve de encontrar outras formas de assegurar diversidade e adaptabilidade - doutra forma a sobrevivência não seria possível.

O que fica de misterioso não é porque é que morrem a seguir à reprodução, mas o contrário: porque é que nós vivemos muito para além da nossa capacidade de reprodução. Isso pressupõe que há Qual?

alf disse...

UFO

Interessantes congeminações.

Eu penso o seguinte em relação ao problema do código genético «excedentário»: nada no nos seres vivos é «lixo». Tudo o que existe tem uma função. Só mesmo para o nosso apêndice é que se desconhece a função, mas ele é uma coisa mínima.

Ora o código genético «excedentário» é muitíssimo maior do que aquele cuja função se conhece.

A Natureza é muito inteligente, muito mais do que nós. Não podemos assentar nenhuma hipótese na ideia de que se trata de uma ineficiência. Portanto, pensar que o código genético cuja função desconhecemos é «lixo», ou vestígios de passos anteriores na evolução, não me parece ser caminho a seguir.

Colocas uma hipótese muito interessante: a de que pode ser um «conhecimento», uma base de dados das dificuldades enfrentadas, dos virus que já atacaram as células, etc. A «Biblioteca» da célula.

Note-se que sabemos que o código genética tem as instruções para o fabrico de proteinas; mas não fazemos ideia nenhuma donde saem os «comandos», ou seja, a instrução para sintetizar esta ou aquela proteína, as instruções que mandam a célula reproduzir-se, etc.

Portanto, conhecemos qq coisa sobre uma máquina específica da célula, a que fabrica as proteínas, mas nada sabemos sobre o «cérebro» da célula, sobre o que a comanda! E isso deve ser algo muito mais impressionante do que a maquineta que faz proteínas, não te parece?

Para além disso, na reprodução, as operações de «corte e costura» dos cromossomas tb não são por acaso, algo as parece comandar. Mas como? Como é feita a escolha de que este segmento do cromossoma filho sai do progenitor A e aquele do B?

E, finalmente, onde está a máquina que gera a evolução? Esta questão pode parecer estranha agora mas mais tarde será mais claro.

Em conclusão, não fazemos ideia nenhuma como e onde são realizadas as funções mais importantes da células; e temos um monte de código genético que não sabemos para que serve... talvez haja algum relação entre as duas coisas..

UFO disse...

Diogo :
Talvez que eu seja darwinista, e por enquanto não me importo. Terá de haver muito mais para além de Darwin. Mas na essência creio que está correcto.
Coisas que apenas iremos descodificando ao longo de gerações.

-- ainda sobre os salmões:
eu li a sua resposta ao meu comentário, vi o vídeo que recomendou acima (o qual me parece corroborar as minhas palavras) e,.. eu não devo ter compreendido nada sobre qual o cerne da questão do salmão, na sua perspectiva.
Se tiver a bondade de me clarificar...

Para mim é apenas um caso limite.
O sentido da vida, e morte, embora dramática a nível de um individuo com consciência de si, é a chave para a evolução.

O sentido da vida só pode ser entendido a nível da Espécie ou da Vida em geral.
Confesso que eu ainda não entendi o sentido da Vida.

Apenas sei que :
Se existe energia disponível a Vida encontra forma de a aproveitar.

Os primeiríssimos organismos vivos deviam ser simplesmente 'agregadores' de moléculas (crescem) e cindiam-se por razões de estabilidade energética (reproduzem-se). Mas desde este início até ao que vemos agora vai uma multidão de passos gigantescos.


ainda sobre o ADN
nele está inscrito o código e todas as informações (colossais) que são necessárias desde o momento da primeira divisão embrionária até ao indivíduo adulto. Esse código é de uso limitado no tempo, com fortíssima incidência nos primeiros meses de vida fetal.
A quantidade de código que se usa apenas uma vez deve ser muito significativa se comparada com a quantidade necessária à manutenção de um indivíduo já no estado adulto.
É possível que muito desse código seja difícil de detectar e esteja ainda por classificar correctamente.

--- No caso dos humanos uma parte significativa do que somos é por influência social e não por herança de ADN. Evoluímos, porque melhoramos o arsenal de boas respostas em face da adversidade, por via da aprendizagem. Por isso eu preciso de sobreviver ao nascimento da minha prole. A evolução pelo conhecimento não fica directamente inscrita no ADN (talvez no futuro...).
.. neste aspecto o alf mostrou-me que há evolução para além do que o Darwin ensinou.

nota: através da programação genética já se tornou evidente que a evolução é mais acelerada pela existência de níveis de 'fitness' evolutivos, à semelhança dos treinos das modalidades desportivas. Antes de colocarmos a fasquia alta temos de aprender a saltar rasteiro.

nota: quando referi que os descendentes da...gripe espanhola...estão mais preparados para... estou a dizer que no ADN dos primeiros sobreviventes ao contágio já estava pre-preparada uma resposta conveniente (talvez no ADN 'lixo') e que existem descendentes actuais igualmente portadores da defesa.
Creio que já foram encontrados alguns humanos que sobreviveram naturalmente ao ataque do virus da Sida.
Assim a espécie humana já estaria preparada para a sobrevivência no caso de ruína completa do arsenal médico (e da troca de informação).

UFO disse...

alf:
só li agora a tua resposta e estou contigo.

tive agora um vislumbre de um possível mecanismo simples de aceleração na evolução:

Quando existe um ambiente muito adverso à vida os erros de cópia de ADN serão muito maiores do que em ambiente favorável. Deste modo aumentam muito as hipóteses de obter uma resposta adequada (a par com incontáveis inadequados irrelevantes).

A máquina da evolução...?
venham mais posts meu amigo.

alf disse...

UFO

Erros de cópia? E porque a evolução há-de resultar de erros de cópia???

Se introduzires erros aleatórios num programa de computador, qual é a probabilidade de sair um programa melhor? Então num programa tão extendo e complexo como o que pode gerar um ser vivo??

Por outro lado, as células estão cheia de mecanismos para evitar erros de cópia. Quanto mais evoluído o ser, parece que mais eficientes estes mecanismos. Ora os seres mais evoluídos serão aqueles que devem possuir um mecanismo de evolução mais eficiente - seria pois paradoxal que esse mecanismo fosse o dos erros de cópia.

Essa foi a primeira ideia do darwinismo, mas já foi abandonada há muito pelos cientistas que se dedicam a estes assuntos. Foi a primeira ideia porque não se conhecia outro processo. Depois descobriu-se os cruzamentos de cromossomas, as trocas de genes inteiros, e este passou a ser o mecanismo favorito - uma espécie de troca de subrotinas.

Portanto, o que conhecemos hoje, que eu saiba, é o cruzamento de cromossomas e os alelos, que vão variando os «parâmetros do projecto». Mas não é suficiente, tem de ser mais do isto. Só que não fazemos ideia nenhuma de como seja. Não fazemos por enquanto, um dia havemos de perceber mais.

alf disse...

UFO

Duas coisas que dissestes me pareceram especialmente relevantes.

Uma tem a ver com o programa de «fabrico» do ser. Como dizes, o código genético conhecido é o do funcionamento corrente, mas onde está o código que definiu o ser? Onde está o código que fez com que uma célula se tornasse absolutamente transparente para fazer um cristalino, e outra numa célula do coração? E como isso se faz, é uma questão de sintese de proteínas? Não me parece.

Portanto, a tua ideia é que o código «lixo» seria o código que gerou o ser. Interessante. Claro que essa explicação não será válida no caso da ameba, mas tb não tem de ser - os unicelulares absorvem código uns dos outros e podem ficar com montes de código por essa via.

A outra coisa que dissestes é que o prolongamento da vida tinha vantagem de possibilitar uma transmissão de conhecimentos.

Nalgumas espécies de mamíferos de pequenas dimensões, a morte sobrevem muito rapidamente a seguir ao fim da capacidade de gestação; nos mamíferos superiores, o mesmo poderia acontecer a partir da menopausa+o tempo que o juvenil tem de aprendizagem, ou seja, uma dezena de anos no caso dos humanos. Mas não é bem assim; o apogeu é alcançado a meio da idade de reprodução e depois entra-se num lento declínio.


A duração da vida pode não ser independente da experiência de vida. Para as pessoas de idade, muitas vezes a morte surge breve a partir do momento em que a pessoa considera que perdeu a «utilidade». Mas como se transmite a experiência da duração ideal de vida?

De qq forma, cremos saber hoje que a duração da vida nos mamíferos superiores estará programada nos «telómeros».

Portanto, existirá um programa para construcção do ser vivo, um programa de funcionamento, e um mecanismo de autodestruição.

UFO disse...

Alf:
Eu estava a referir-me a ambientes muito adversos. Quando houve extinções massiças de espécies já não é uma espécie em perigo e todos os seres vivos estão à procura da solução. Cada um está a fazer uma extracção da lotaria e o bilhete premiado calha a algum.

'Hardware' inadequado produz erros de cópia acima da média habitual. A uniformidade na reprodução (eficiência de cópia) nestes casos só atrapalha.
Nestes casos de ambientes disruptivos não se está à procura de afinações de pormenor mas de uma solução que seja capaz.

A taxa de mutação mais elevada é mais favorável quando se está longe da solução.

nota:
Na espécie humana o genoma é o conjunto da base comum acrescido de todos os fragmentos de ADN distintos individuais, deste modo talvez seja mais extenso do que o da amiba.

Diogo disse...

Caro Ufo,

A evolução não se dá com erros de cópia (vantajosos) que depois sobreviveriam por selecção natural.

Os erros de cópia conduziriam sempre à degenerescência de qualquer espécie.

Vamos supor uma espécie com 100 indivíduos e que na reprodução (cada par teria dois filhos, para manter a população constante), existissem 10 mutantes, cujas mutações não seriam significativas em termos de sobrevivência (por exemplo aumentavam ou diminuíam em apenas 1% a capacidade de sobrevivência de um indivíduo).

Acontece que as probabilidades de erros de cópia negativos para o indivíduo são infinitamente maiores do que os erros de cópia vantajosos. Vamos supor, para o nosso exemplo, que 9 filhos teriam mutações negativas e 1 filho teria mutação positiva e todos sobreviveriam (porque as mutações eram insignificantes).

Deriva daqui que a geração seguinte será sempre menos apta que a geração anterior, donde este não pode ser o caminho da evolução.

alf disse...

UFO e Diogo

UFO, tu tens razão quando dizes que nas situações de stress é quando o mecanismo de evolução actua; mas não concordo contigo qd pensas que esse mecanismo é um mecanismo de erro, aí estou de acordo com o Diogo.

Há uma mudança profunda que o nosso pensamento tem de fazer se queremos alguma dia compreender alguma coisa disto: é perceber que a Natureza é Inteligente!

Nós presumimos que a Inteligência é um exclusivo dos nossos cérebros ou, um dia, das nossas máquinas, ou seja, algo que resulta do funcionamento de dispositivos muito complexos, porque isso é o que resulta das nossas observações imediatistas.

Mas, por outro lado, temos o contrassenso de presumir que o nosso cérebro resultou de processos não inteligentes. Ou seja, para usar uma ferramenta é preciso a alta inteligência do nosso cérebro, mas para produzir o próprio cérebro, já não é preciso inteligência nenhuma, bastam uns erros de cópia.

A grande mudança que eu defendo é perceber que a Inteligência é um processo Natural; que decisões ao acaso são um processo elementar de inteligência, eficiente desde que o número de «acasos» seja suficiente; mas que a partir deste, outros processos mais sofisticados se foram sucessivamente desenvolvendo, cada vez menos dependentes do número de «acasos»; e que a Natureza tem Inteligência e uma inteligência muito superior à nossa porque resultante duma dimensão muito maior.

O que tu dizes e o que eu digo encontra-se magnificamente sintetizado neste excerto da «Viagem ao Futuro» de H.G.Wells:

"Um animal em perfeita harmonia com o seu meio envolvento é um mecanismo perfeito. A Natureza nunca apela à inteligência senão quando o hábito e o instinto se tornam irrelevantes. Não existe inteligência onde não existe mudança nem necessidade de mudança."

Ele referia-se à inteligência humana; mas isto aplica-se igualmente à inteligência da natureza. E aqui entram as contas do Diogo - toda a mudança, adaptação, evolução, envolve riscos; se a espécie está em harmonia com o ambiente, não vai correr nenhum risco, logo, a evolução fica estacionada; se enfrenta uma situação de stress, então o risco de não fazer nada é mais alto do que o de fazer e a máquina da evolução começa a funcionar.

Para chegarmos a algum lado, temos de analisar cuidadosamente como as coisas se passam, mas tendo presente que a Natureza é Inteligente! E isto não tem nada a ver com criacionismo ou qualquer crença religiosa, porque, como tentei mostrar nos posts com a etiqueta «inteligência», a Inteligência é um processo natural.

Diogo disse...

Caros Alf e UFO
Exactamente Alf! A natureza viva é inteligente. E não é preciso um cérebro. Os vegetais não têm cérebro e evoluem. Existe um grande número de espécies animais como os equinodermos, ouriços e estrelas-do-mar, medusas etc. que se movimentam, fogem, escondem, caçam, etc. que não têm cérebro. Ou seja, a natureza viva é inteligente.

É esta inteligência natural nos indivíduos que detecta mudanças no meio ambiente e que decide a melhor forma de estes se adaptarem: seja criando barbatanas, olhos, rins, pernas, penas ou asas.

Mas estes indivíduos já estão formados, já não conseguem alterar a sua própria estrutura (burro velho já não aprende línguas). Assim reproduzem-se, dando instruções aos seus filhos, por via, talvez, genética, sobre a forma como estes se vão desenvolver desde o ovo até à forma adulta (ontogenia). Estes filhos vão ser o resultado da reacção inteligente dos pais às modificações ambientais que percepcionaram – «O pai cavador, que sente que a sua profissão não tem futuro, mete o filho na escola para este ser doutor (que o pai cavador sente que é uma profissão com futuro)».

alf disse...

Diogo

Você diz que a natureza viva é inteligente, mas eu vou mais longe: a natureza é inteligente, a vida já é ela mesma um resultado dessa inteligencia. A inteligência da natureza terá a forma mais básica, a do acaso+selecção, eficiente em grande número de acasos, mas esta forma básica vai depois originando formas de inteligência através de processos cada vez mais complexos e cada vez menos dependentes de «acaso».

Quando virmos como se formou o sistema planetário poderá começar a perceber melhor a força da inteligência inorgânica da natureza.

O que você diz é o que parece lógico, o que a natureza, sendo inteligente, certamente fará. No fundo, é o que o Lamarck defendeu. Só que isso foi posto de lado com o argumento de que não existe nenhuma forma de a experiência de um ser vivo ser geneticamente transmitida aos descendentes, porque os espermatozoides têm uma existência independente do resto do organismo.

É sobre isso que irei discorrer no próximo post, por isso é que não quis comentar muito o que disse.

alf disse...

Diogo e UFO

Esclarecendo um pouco melhor o que penso sobre a Inteligência: a Inteligência da natureza não viva é a inteligência do acaso+selecção; esse tipo de inteligência, correspondente ao resolver um labirinto andando ao acaso, só é eficiente quando é possível gerar um grande número de acasos.

Este tipo de inteligência foi capaz de gerar a Vida; o que caracteriza a Vida é exactamente ser a primeira forma de inteligência que não funciona com base no processo elementar de acaso+selecção.Como exemplifiquei nos primeiros posts sobre Inteligência, eu posso resolver um labirinto virando sempre para o mesmo lado - este processo é muito mais eficiente se eu dispuser de um número reduzido de tentativas. Portanto, há processo de inteligência entre o acaso e o nosso cérebro.

Assim «Vida=processos de inteligência acima do elementar»

É por isso que a Evolução não resulta de «erros de cópia». Esse é o processo de inteligência da natureza inorgânica, não da vida. Esse processo não tem a eficiência que a evolução requer, porque a capacidade de gerar «acasos» da vida é muitíssimo mais limitado do que a matéria inorgânica, porque o número de seres vivos é incomensuravelmente menor do que o de átomos.

Diogo disse...

Alf: «A inteligência da natureza terá a forma mais básica, a do acaso+selecção, eficiente em grande número de acasos… quando virmos como se formou o sistema planetário poderá começar a perceber melhor a força da inteligência inorgânica da natureza.»

Diogo: Não existe inteligência no não vivo, nem acaso+selecção, apenas leis da física. O sistema planetário formou-se como se formou porque a matéria e energia têm as suas leis. Não há acasos e muito menos selecção.

As leis de Kepler, de Newton e a lei de Titius – Bode (estabelecida em finais do século XVIII, é expressa por uma sucessão de números que, com uma precisão admirável, reproduz as distâncias do Sol a cada um dos seis planetas conhecidos até então: Mercúrio, Vénus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno), explicam cabalmente o funcionamento dos corpos celestes.


Alf: «O que você diz é o que parece lógico, o que a natureza, sendo inteligente, certamente fará. No fundo, é o que o Lamarck defendeu. Só que isso foi posto de lado com o argumento de que não existe nenhuma forma de a experiência de um ser vivo ser geneticamente transmitida aos descendentes, porque os espermatozóides têm uma existência independente do resto do organismo.»

Diogo: Eu não disse o que Lamark defendeu. Lamark disse que um indivíduo se modificava e transmitia essa modificação à descendência. O que eu defendo é que o indivíduo se apercebe da necessidade de uma mudança de estrutura e transmite os planos dessa mudança aos filhos.

O que é você sabe sobre o que está dentro de um espermatozóide, de um óvulo ou do citoplasma, ou da interacção destes três elementos?

Os gémeos verdadeiros ou monozigóticos possuem o mesmo património genético. Mas são eles absolutamente iguais fisicamente? Não! E não apenas por causa do ambiente.


No Wikipedia - http://pt.wikipedia.org/wiki/Gene:

Em uma unidade de transição de um organismo eucariótico há trechos que serão traduzidos em seqüência de aminoácidos e trechos intercalares, que não serão traduzidos. Em 1978, o geneticista norte-americano Walter Gilbert propôs os termos exão (do inglês exon, expressed region), região que são traduzidas em seqüências de aminoácidos, e intrão (do inglês intros, intragenic region, região intragênica) para designar as regiões não traduzidas entre os exãos.

O processo de definição de intrãos e exãos por parte dos genes para definir quais trechos serão transcritos em uma cadeia de RNA guarda uma admirável complexidade. Desde os anos 1980 já se sabe que alguns genes são capazes de seleccionar trechos distintos de exãos, produzindo, dessa forma, diferentes proteínas. Pesquisas recentes têm revelado que esse tipo de ocorrência, longe de ser uma excepção, é a regra no funcionamento dos genes, chegando a um número estimado médio de 5,7 variações possíveis transcrições de uma dada área codificadora. Um determinado gene seria capaz de produzir diferentes transcrições para diferentes tipos de células. Mesmo transcrições obtidas entre exãos de genes diferentes ou mesmo de cromossomas distintos estão sendo consideradas possíveis.

Essas observações têm levado a novas considerações sobre a definição de gene e, não apenas isso, a novos paradigmas quanto a forma de organização do genoma e da herança genética


ps) Você não podia alterar a sua caixa de comentários de forma a poder abrir a janela completamente?

UFO disse...

Meus caros amigos eu vou tentar esticar a mutação como fonte principal de evolução em tempos de crise.

quando o ambiente se vai tornando muito adverso as espécies que estavam até aí adaptadas vão-se extinguindo.
E isto é óptimo porque deixam os recursos energéticos livres para os que estão perto de um máximo da função fitness se multiplicarem, alargando a muito significativamente as hipóteses de encontrar uma solução.

No entanto os máximos locais de fitness já encontrados podem ser insuficientes quando houver maior degradação.
A nova solução é uma variação sobre os melhores dos anteriores seres. Aqui a mutação serve melhor a procura de outros máximos locais ainda não explorados.

A extinção em massa de espécies não corresponde a uma diminuição da biomassa.

Assim temos simultâneamente um alargamento do número de extrações de lotaria (todos os seres vivos presentes são os melhores candidatos) e com o aumento dos erros de cópia pesquiso muito mais linhas de diferenciação.

Acho que este mecanismo é naturalmente inteligente.

(O mecanismo das formigas acima também representa inteligência).

Ainda uma nota sobre o ADN:
a evolução do embrião humano mostra sinais de ir reproduzindo formas e estruturas mais antigas, como se estivesse a recapitular.
Lembram-se das imagens ?

alf disse...

Diogo

Pois, perceber que a Inteligência não é uma propriedade concedida por um Deus e sim uma propriedade dos sistemas naturais é um grande salto. Note que não há meio termo: ou os sistemas físicos já dispoem desta propriedade da Inteligência ou então há uma entidade exterior que a confere.

Temos de pensar longamente sobre o que seja «Inteligência». Os primeiros posts com esta etiqueta são incontornáveis.

As leis físicas que citou explicam o movimento dos planetas, mas não explicam como se formou o sistema planetário. A «Inteligência» tem a ver com a mudança. Como eu disse, apenas quando mostrar como se formou o Sistema Planetário, a sua mente se poderá abrir à percepção do que é um processo inteligente natural. Deixo-lhe um exercício: imagine-se com os poderes de um Deus e conceba uma máquina, dependente apenas de «leis físicas», capaz de gerar um sistema planetário.

Não é por acaso que os cientistas ainda não conseguiram por de pé nenhuma teoria capaz de explicar a formação do sistema planetário; é que a nossa humana inteligência é muito inferior à inteligencia da natureza, os cientistas simplesmente não têm inteligência suficiente para conceber um processo capaz de o conseguir.

Eu tropecei nele quando procurava entender outra coisa.

Note que eu só citei o argumento anti-Lamarck - não disse que estava de acordo. Como verá, não estou.

Mas resta o problema; você diz "O que eu defendo é que o indivíduo se apercebe da necessidade de uma mudança de estrutura e transmite os planos dessa mudança aos filhos." Mas transmite como? Como é que isso faz crescer o pescoço da girafa? Esse é que é o problema!!!! O problema ao qual o Darwin apresentou uma resposta. Mais ninguém apresentou uma proposta alternativa. Por isso é que o darwinismo é ainda incontornável, não há uma alternativa, só há duas teorias em cima da mesa: Darwinismo e Criacionismo.

(claro que eu tenciono apresentar uma nova teoria)

O que diz acerca dos «intrãos» e «exãos» é importante e esclarece aquilo que eu já referi em comentário anterior: onde está o comando que decide que se faz esta proteína e não aquela? que se transcreve este troço do código genético e não o outro?

Porque o código genético é apenas uma espécie de biblioteca de procedimentos para fabricar isto e aquilo; mas o que é que decide o que deve ser fabricado e quando?

Não sei o que é isso de «abrir a janela dos comentários completamente», vou ser se descubro.

Por último, estou verdadeiramente fascinado pelo seu interesse e pensamento por estes assuntos! E agradecido pelos seus interessantes e estimulantes comentários.

alf disse...

UFO

Não estás a ir ao cerne da questão, que é a de saber se os novos seres surgem por mero «erro de cópia» ou devido a um processo de inteligencia mais complexo.

Como já disse, o processo inteligente que resulta do acaso só é eficiente num grande número de acontecimentos, num número tão grande que para o conseguir atingir temos de calcular as combinações possíveis do número de átomos que existe, por exemplo, na totalidade dos oceanos durante um espaço de tempo dilatado.

Podes conseguir melhorar um programa de computador introduzindo erros ao acaso; isso não é impossível; mas a probabilidade de isso acontecer será da ordem de grandeza... do número de combinações possíveis de todos os átomos dos oceanos durante mil milhões de anos ao ritmo de mil combinações por segundo... por aí...

Estás a perceber o problema? Quando se trata de seres vivos e não de átomos, a capacidade de gerar combinações estatísticamente significativas desaparece.

Então, é preciso usar processo de inteligência mais complexos. Já não podes resolver este «labirinto» andando ao acaso, é preciso ter um procedimento resolvente.


Quanto às formigas, é preciso não simplificar demais os seus comportamentos; embora baseados num número de informações limitados, essas informações são processadas com muita inteligência. Por exemplo, as formigas pesquisam de forma aparentemente aleatória, mas qd encontram algo que lhes interesse regressam ao formigueiro pelo melhor caminho. Formigas do deserto regressam em linha recta e isso tem sido objecto de investigação. Parece que se orientam por qq coisa no céu que não sabemos o que seja, talvez umas nuances na faixa dos ultravioletas que nós não vemos. Seja como for, têm de ter um verdadeiro computador de GPS dentro da cabeça.

alf disse...

UFO

Em relação à formação do ser humano «recapitular» organismos mais antigos: podia ser de outra maneira? Não é um processo de crescimento, é um processo de diferenciação; ora a crescente diferenciação é o que distingue as sucessivas espécies, por isso é natural que a formação do ser humano apresente um paralelo com a evolução das espécies, mesmo que não haja nenhuma relação entre as duas coisas. Que eu não sei se há ou não, só digo que isso não implica que haja porque, haja ou não, a formação do ser humano teria de se seguir sempre este percurso.

Diogo disse...

Alf: «Pois, perceber que a Inteligência não é uma propriedade concedida por um Deus e sim uma propriedade dos sistemas naturais é um grande salto. Note que não há meio termo: ou os sistemas físicos já dispõem desta propriedade da Inteligência ou então há uma entidade exterior que a confere.»

Diogo: Um dos maiores enigmas para mim é a existência do vivo: um pedaço de matéria que age para se manter. Ainda não compreendi. Mas compreendo que havendo vida, haja inteligência, com ou sem cérebro.

Mas a sua explicação para o vivo e inteligência: acaso + selecção, não explica nada. Selecção de quê? Há rochas mais bem sucedidas que outras? Há ondas magnéticas mais bem adaptadas?


Alf: «As leis físicas que citou explicam o movimento dos planetas, mas não explicam como se formou o sistema planetário. A «Inteligência» tem a ver com a mudança. Como eu disse, apenas quando mostrar como se formou o Sistema Planetário, a sua mente se poderá abrir à percepção do que é um processo inteligente natural. Deixo-lhe um exercício: imagine-se com os poderes de um Deus e conceba uma máquina, dependente apenas de «leis físicas», capaz de gerar um sistema planetário.»

Diogo: Basta-me, como mortal, abrir a torneira do lavatório e ver a água a escoar-se pelo ralo. Aí temos o comportamento de uma galáxia.


Alf: «Não é por acaso que os cientistas ainda não conseguiram por de pé nenhuma teoria capaz de explicar a formação do sistema planetário; é que a nossa humana inteligência é muito inferior à inteligência da natureza, os cientistas simplesmente não têm inteligência suficiente para conceber um processo capaz de o conseguir. Eu tropecei nele quando procurava entender outra coisa.»

Diogo: Dou-lhe os parabéns por ter tropeçado (sem malícia), e fico à espera. Mas acho que você está a colocar a questão ao contrário. Então a matéria não interage uma com a outra? E não fará sentido que obedeça a regras? Uma pedra mais dura não deve riscar uma mais mole?


Alf: «Note que eu só citei o argumento anti-Lamarck - não disse que estava de acordo. Como verá, não estou. Mas resta o problema; você diz "O que eu defendo é que o indivíduo se apercebe da necessidade de uma mudança de estrutura e transmite os planos dessa mudança aos filhos." Mas transmite como? Como é que isso faz crescer o pescoço da girafa? Esse é que é o problema!!!! O problema ao qual o Darwin apresentou uma resposta. Mais ninguém apresentou uma proposta alternativa. Por isso é que o darwinismo é ainda incontornável, não há uma alternativa, só há duas teorias em cima da mesa: Darwinismo e Criacionismo.»

Diogo: Já lhe disse: essa informação transmite-se pelos espermatozóides, pelos óvulos e, talvez, pelo citoplasma. É assim que os pais passam informação aos filhos (não falando, por ora, em educação). O pai e a mãe apercebem-se que precisam de um pescoço mais longo. Esses pais já têm uma estrutura consolidada e não mutável. Pela reprodução transmitem a nova necessidade e o respectivo plano de evolução aos filhos. Estes irão ter pescoços maiores.


Alf: «O que diz acerca dos «intrãos» e «exãos» é importante e esclarece aquilo que eu já referi em comentário anterior: onde está o comando que decide que se faz esta proteína e não aquela? Que se transcreve este troço do código genético e não o outro?
Porque o código genético é apenas uma espécie de biblioteca de procedimentos para fabricar isto e aquilo; mas o que é que decide o que deve ser fabricado e quando? »

Diogo: É a inteligência do vivo. É ela que faz os planos da mudança, que são passados aos filhos. É assim que o vivo evolui e se adapta. Pela reprodução.


Alf: «Por último, estou verdadeiramente fascinado pelo seu interesse e pensamento por estes assuntos! E agradecido pelos seus interessantes e estimulantes comentários.»

Diogo: Devolvo-lhe o elogio. Admiro uma pessoa que pensa pela sua própria cabeça e que seja capaz de elaborar as suas próprias teorias.

Abraço

Diogo disse...

Então Alf?

alf disse...

Diogo

Eu já tinha respondido ao seu comentário, mas, pelos vistos, não entrou!!! é pena porque me tinha saído bem; vou responder de novo.

Diogo:"Mas a sua explicação para o vivo e inteligência: acaso + selecção, não explica nada. Selecção de quê?"

Alf: nas condições que eu expuz como sendo as da Terra primitiva, os átomos de C, N, H e O, e tb outros, ligavam-se fácilmente fazendo cadeias crescentes de átomos. Eram imensas quantidades de átomos e geraram imensas combinações destes átomos. Uma única destas combinações que fosse estável e autoreprodutora é quanto basta para iniciar o processo de Vida. Esta combinação autoreprodutora usaria os átomos livres e os das outras combinações para se «reproduzir». Além disso, estas macromoléculas autoreprodutoras associar-se-iam, formando moléculas maiores, mais robustas, que usariam as moléculas anteriores para fazerem cópias de si próprias.

Isto é algo que acontece fatalmente no ambiente que descrevi, mas é apenas ainda um primeiro passo. Depois aconteceu que o CO2 que estava no estado supercrítico deixou de estar e estas macromoléculas tiveram de enfrentar a água, que é capaz de as dissolver. Mas a água também tem um estranho efeito repulsivo sobre moléculas de lípidos e uma associação de lípidos com outras moléculas sobreviveu à água, os lípidos formando a primeira membrana.

Bem, isto é só um apalpar muito por alto do processo. Mas que podemos detalhar muito mais,e calcular as probabilidades.

Está agora a perceber como funciona a selecção na geração da Vida?

Também é bom que vá percebendo que a nossa inteligência é muito mais limitada do que pensamos e há muitos fenómenos que nos vão surpreender. Um é o aparecimento de caos em processos regulares, por exemplo. Outro mais sofisticado é o que está escondido no Teorema de Pitágoras. Outro ainda é o processo de geração dos sistemas planetários.

"Diogo: Já lhe disse: essa informação transmite-se pelos espermatozóides, pelos óvulos e, talvez, pelo citoplasma. É assim que os pais passam informação aos filhos"

Alf: Mas transmite-se como? Como é que o espermatozoide «sabe» que um pescoço mais comprido seria vantajoso? O Lamarck ainda dizia que o progenitor conseguia essa modificação, que depois seria transmitida; mas você é mais radical - o espermatozoide só transmite a necessidade da modificação. O que levanta outro problema: e como se gera essa modificação?

O Darwin deu uma resposta muito simples e clara a estas questões: os pais não transmitem nenhuma mudança aos filhos; estes, porém, não são iguais aos pais, são afectados de um factor de diversidade - nascem uns com o pescoço mais comprido, outros com ele mais curto. Depois, os que são mais adaptados ao seu nicho ecológico dominam sobre o outros e reproduzem-se mais. Assim, geração a geração, um caracter que seja relevante para o nicho ecológico vai sendo seleccionado e vai evoluindo até atingir a configuração óptima.

"Diogo: Basta-me, como mortal, abrir a torneira do lavatório e ver a água a escoar-se pelo ralo. Aí temos o comportamento de uma galáxia."

Alf: se fosse assim tão simples, porque teriam tido os cientistas necessidade de inventar a matéria negra? Mas devo dizer-lhe que você até nem está muito longe da verdade... Embora a sua explicação não possa ser aceite porque não há «ralo» nenhum, nenhuma força a «puxar» a matéria para um ponto.

Mas a formação das galáxias, embora fascinante, ainda é uma trivialidade ao pé de processo de formação dos sistemas planetários. Estes têm propriedades bem definidas e resultam de um processo determinístico. Que só é suplantado em complexidade pelo processo de formação da Vida.

Como se virá a descobrir, todas as estrelas iguais ao Sol têm sistemas planetários como o nosso.

"Diogo: É a inteligência do vivo. É ela que faz os planos da mudança, que são passados aos filhos"

Alf: os nomes são importantes mas não chegam como explicação. Não basta dizer que «é a inteligência do vivo», é preciso dizer como se processa. Por mim, até podem dizer que foi Deus... desde que digam como é que fez... é o COMO que é preciso descrever.
A Inteligência não é uma propriedade etérea, não é um ectoplama, resulta de processos naturais, é preciso um sistema de átomos para se gerar inteligência.

(embora eu compreenda a sua resposta da parte de quem pretende ter uma ideia "enquadrante" do assunto; eu faço o mesmo em relação a assuntos que não são prioritários para mim, ou enquanto não consigo ir mais longe na minha análise)

Diogo disse...

Vamos ver uma questão de cada vez para não nos perdermos:

"Diogo: Já lhe disse: essa informação transmite-se pelos espermatozóides, pelos óvulos e, talvez, pelo citoplasma. É assim que os pais passam informação aos filhos"

Alf: «Mas transmite-se como? Como é que o espermatozóide «sabe» que um pescoço mais comprido seria vantajoso? O Lamarck ainda dizia que o progenitor conseguia essa modificação, que depois seria transmitida; mas você é mais radical - o espermatozóide só transmite a necessidade da modificação. O que levanta outro problema: e como se gera essa modificação?»

«O Darwin deu uma resposta muito simples e clara a estas questões: os pais não transmitem nenhuma mudança aos filhos; estes, porém, não são iguais aos pais, são afectados de um factor de diversidade - nascem uns com o pescoço mais comprido, outros com ele mais curto. Depois, os que são mais adaptados ao seu nicho ecológico dominam sobre os outros e reproduzem-se mais. Assim, geração a geração, um caracter que seja relevante para o nicho ecológico vai sendo seleccionado e vai evoluindo até atingir a configuração óptima.»


Diogo: O que eu disse foi que os pais se apercebem da necessidade de uma modificação (possuir um pescoço mais longo, por exemplo), e transmitem os planos desse desenvolvimento aos filhos, via espermatozóides e óvulos.

Como é que Darwin explica o surgimento de um novo órgão? Um fígado ou um olho?

alf disse...

Diogo

O processo «geração de hipóteses + selecção» é um processo de Inteligência, portanto permite teóricamente explicar tudo; mas a sua eficiência depende da geração dum número de hipóteses suficientemente grande e de uma selecção suficientemente eficiente. Logo, a questão não é saber se este processo pode explicar mas saber se é o processo usado.

No caso do olho ou de qq outra questão de morfolgia dos seres vivos, a explicação é sempre a mesma: primeiro, por acaso, surgem uma célula epitelial sensível à luz, o animal que tem esta célula tira vantagem disso e reproduz-se mais, a seguir, por acaso, surge outro com 2 células sensíveis à luz, etc, até chegar ao olho.

quando analizamos como se chegou ao olho actual encontramos este percurso quase todo, desde animais com apenas células sensíveis à luz espalhadas pelo corpo a olhos de diversos tipos e em diversas quantidades.

Resumindo:

A evolução até ao olho revela um processo «Inteligente»,de acordo com a definição de inteligência que propuz; «geração de hipóteses + selecção» é um processo de Inteligência. A questão está em saber se foi este o processo responsável ou se foi outro. A dificuldade está em que ninguém ainda conseguiu propor outro.

Você dizer que "os pais se apercebem da necessidade de uma modificação (possuir um pescoço mais longo, por exemplo), e transmitem os planos desse desenvolvimento aos filhos, via espermatozóides e óvulos" não é descrever um processo de inteligência.

Não me leve a mal mas vou fazer uma analogia com uma coisa que me aconteceu muitas vezes.Pessoas completamente fora de áreas tecnológicas, querendo mostrar-me o bom entendimento que tinham deste mundo tecnológico, diziam-me coisas como: um aparelho de TV funciona porque tem uns fios lá dentro! Para elas, os fios, algo que não pertencia ao seu mundo, eram o segredo e a explicação da TV. O António Silva tem uma piada num dos filmes dele em que explica o funcionamento da rádio como uma onda que chega e se reflete na válvula, ou qq coisa parecida. Isso já é uma explicação quase de intelectual!

No entanto, como já disse, você até nem está errado!!! Embora isso não seja uma explicação, seja uma descrição, que deixa tudo por explicar. Mas se a descrição estiver certa, já é meio caminho andado para se descobrir a explicação...

Diogo disse...

Alf: «O processo «geração de hipóteses + selecção» é um processo de Inteligência, portanto permite teoricamente explicar tudo; mas a sua eficiência depende da geração dum número de hipóteses suficientemente grande e de uma selecção suficientemente eficiente. Logo, a questão não é saber se este processo pode explicar mas saber se é o processo usado.»

Diogo: Vamos, por ora, colocar a questão do processo de inteligência de parte. Aceitemos, simplesmente, que o vivo é inteligente, no sentido de ser capaz de recolher informação, processá-la e, com base no tratamento dos dados, delinear uma estratégia de actuação em seu próprio benefício.


Alf: «No caso do olho ou de qq outra questão de morfologia dos seres vivos, a explicação é sempre a mesma: primeiro, por acaso, surge uma célula epitelial sensível à luz, o animal que tem esta célula tira vantagem disso e reproduz-se mais, a seguir, por acaso, surge outro com 2 células sensíveis à luz, etc., até chegar ao olho. Quando analisamos como se chegou ao olho actual encontramos este percurso quase todo, desde animais com apenas células sensíveis à luz espalhadas pelo corpo a olhos de diversos tipos e em diversas quantidades. Resumindo: A evolução até ao olho revela um processo «Inteligente», de acordo com a definição de inteligência que propus; «geração de hipóteses + selecção» é um processo de Inteligência. A questão está em saber se foi este o processo responsável ou se foi outro. A dificuldade está em que ninguém ainda conseguiu propor outro.»

Diogo: A coisa não é assim tão simples. O surgimento de uma célula epitelial sensível à luz não significa necessariamente uma vantagem para o organismo. Pode-lhe até ser prejudicial. É preciso que o indivíduo tenha forma de interpretar a informação que lhe chega pela luz, e que tire partido dessa informação. De resto a célula epitelial sensível à luz é inútil.


Alf: «Você dizer que "os pais se apercebem da necessidade de uma modificação (possuir um pescoço mais longo, por exemplo), e transmitem os planos desse desenvolvimento aos filhos, via espermatozóides e óvulos" não é descrever um processo de inteligência. »

«Não me leve a mal mas vou fazer uma analogia com uma coisa que me aconteceu muitas vezes. Pessoas completamente fora de áreas tecnológicas, querendo mostrar-me o bom entendimento que tinham deste mundo tecnológico, diziam-me coisas como: um aparelho de TV funciona porque tem uns fios lá dentro! Para elas, os fios, algo que não pertencia ao seu mundo, eram o segredo e a explicação da TV. O António Silva tem uma piada num dos filmes dele em que explica o funcionamento da rádio como uma onda que chega e se reflecte na válvula, ou qq coisa parecida. Isso já é uma explicação quase de intelectual!»

Diogo: Meu caro, eu não estou assim tão fora das áreas tecnológicas como você pensa. Tenho um curso superior de informática e sempre tive um fascínio pelas ciências, alguns ramos das quais aprofundei por autodidatismo. As teorias da evolução são uma delas.


Alf: «No entanto, como já disse, você até nem está errado!!! Embora isso não seja uma explicação, seja uma descrição, que deixa tudo por explicar. Mas se a descrição estiver certa, já é meio caminho andado para se descobrir a explicação...»

Diogo: É uma explicação! É uma explicação para a evolução: os pais apercebem-se da necessidade de uma modificação (possuir um pescoço mais longo, por exemplo), e transmitem os planos desse desenvolvimento aos filhos, via espermatozóides e óvulos.

Diogo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
alf disse...

Diogo

Quando diz: "os pais apercebem-se da necessidade de uma modificação (possuir um pescoço mais longo, por exemplo)..." quer dizer exactamente o quê? Apercebem-se como e onde? É uma percepção a nível do cérebro? Consciente ou inconsciente? Refere-se a outro tipo de percepção?

E como é que essa percepção vai parar aos espermatozoides e óvulos?

....
Nenhuma explicação é definitiva, todas levantam um Porquê? ou um Como?

Por exemplo, posso dizer: os carros andam porque têm motor. É uma explicação satisfatória para muitas pessoas. Mas depois pode-se perguntar: e como é que o motor o faz andar? e por aí fora. Não há fim nas perguntas, porque estas podem entrar pela química das explosões de gasolina, pelos fenómenos atómicos, pela natureza da matéria e do espaço...

Mas uma coisa é certa: eu posso verificar que os carros têm motor.

E é aqui que está a diferença para o que diz, que deve ser encarado como uma hipótese, porque para ser encarado como uma explicação seria preciso que você mostrasse os mecanismos que suportam a sua afirmação.

Ou seja, o que você afirma nem é explicação nem descrição, é uma Hipótese. Para sabermos se essa hipótese está certa é necessário conseguir prová-la pela observação de como as coisas se passam ou descobrir os mecanismos que a suportam.

Daqui a dois posts creio que esta conversa começará a fazer todo o sentido.