sexta-feira, fevereiro 22, 2013
A Célula Evolui!
O "processador central" do computador de Babbage; ver aqui um interessante resumo da evolução das máquinas de computar
(continuação)
O que eu tinha
para dizer sobre evolução era muito diferente de qualquer coisa que o Hans já
tivesse ouvido; há que ter cuidado com a apresentação de ideias novas. Como
disse o Vergílio Ferreira “No
afirmes o erro de uma verdade antes de mudar o seu contexto. A menos que te dê
gozo levar pedradas.” Um sábio o Vergílio; comecei, cauteloso:
- As teorias que
vamos fazendo dependem do entendimento que temos do assunto na altura. Disse o
Heisenberg que por detrás de uma nova teoria está um novo entendimento do
Universo. A teoria do Ptolomeu enquadrava-se no conhecimento do Universo que
havia na altura. Também a teoria de Darwin se enquadra no conhecimento da
biologia que havia na altura. Num e noutro caso, esse conhecimento era muito
limitado e determinou um enorme erro de perspectiva.
- Erro de
perspectiva? De que falas?
- Nós vemos os
seres vivos como complexas estruturas feitas de uma espécie de tijolo a que
chamamos célula. Numa casa, a complexidade está toda na estrutura da casa, não
está nos tijolos de que é feita. Mas nos seres vivos é ao contrário.
- Ao contrário?
- Sim; as células
são imensas estruturas definidas ao nível do átomo, uma complexa máquina
construída átomo a átomo; hoje somos capazes de observar algo da sua
sofisticada maquinaria, as suas complexas capacidades de comunicação, de
analisar como elas são capazes de fazer coisas como reparar um osso partido… já
pensaste na complexidade que é reparar um osso?
- Bem... nem por
isso…
- Pois… é banal,
por isso não pensamos muito no assunto… mas as células têm de ir buscar as duas
partes do osso fraturado, alinhá-lo como se tivessem um GPS e proceder à
reconstrução da estrutura. Isto é duma complexidade transcendente para nós, nem
de longe somos capazes de idealizar dispositivos com inteligência artificial
que fossem capazes de, autonomamente, conseguirem realizar coordenadamente um
trabalho deste tipo; e isto é apenas o exemplo mais simples de que me lembrei,
porque elas fazem coisas muitíssimo mais complexas, como seja a construção do
ser a partir do ovo.- O Hans meditou um pouco e concordou:
- Sim, de facto
isso é quase mágico…
- Contrariamente
à ideia usual, os seres vivos são um pouco como os computadores, cuja
capacidade depende não da sua arquitetura, a mesma ou quase para todos, e
bastante simples, mas da capacidade dos seus componentes, cuja evolução
determina a evolução dos computadores. Podem os computadores evoluir sem
evolução tecnológica?
- Não me parece…
- Pois não; sem a
electrónica ainda estaríamos com o computador de Babbage, sem a
microelectrónica ainda estaríamos com o computador de transístores discretos e
leitores de cartões perfurados; e sem internet, é claro. É também um pouco como
acontece com a sociedade humana; a nossa sociedade não é o resultado da
evolução da sociedade dos macacos, é o resultado de nós termos capacidades que
os macacos não têm e que suportam uma sociedade mais evoluída. Da mesma
maneira, a evolução dos seres vivos é suportada na evolução das suas células. –
Calei-me, à espera da reação do Hans. Primeiro hesitou, depois arriscou:
- E nós? Somos o
resultado da evolução do chimpanzé, ou da evolução das células do chimpanzé?
- Penso que as
células evoluem e depois o ser evolui tirando partido das novas capacidades
tornadas possíveis. Em que é que consiste uma evolução celular? Aparentemente,
na capacidade de produzir proteínas mais complexas. As células dos peixes, por
exemplo, não podem produzir proteínas com a complexidade que as nossas podem.
Ora bem, sempre que isso aconteceu, seres com melhores capacidades,
nomeadamente velocidade, tamanho, cérebro, adaptabilidade a diferentes meios,
passaram a ser possíveis. O cérebro tornou-se a vantagem decisiva. Mas um novo
cérebro não se forma de um momento para o outro, um chimpanzé não dá à luz um
humano, há um processo evolutivo até que são obtidos animais com a máxima
capacidade mental que o novo grau de complexidade proteica permite. A partir
daqui podem ainda ocorrer processos de adaptação e mesmo evolução sem que, no
entanto, haja mais incremento da capacidade mental. Para existir um novo
incremento da capacidade mental é preciso que exista uma nova evolução celular.
Ou seja, se a capacidade mental dos chimpanzés não evolui é porque eles já
atingiram o máximo que as suas células suportam; e se nós temos mais capacidade
mental, é porque temos células mais evoluídas. – Os olhos do Hans iluminaram-se
subitamente e ele exclamou:
- Então será por isso que os seres que
existem não evoluem e será por isso que não existem seres intermédios! A célula
de um qualquer chimpanzé evoluiu, gerando uma descendência de seres cada vez
mais evoluídos até chegar ao Humano! Todos os humanos têm a mesma capacidade
porque todos têm a mesma célula; podem diferir em aspectos acessórios, mas os
limites são os mesmos para todos, porque o Humano é o limite evolutivo das suas
células, como o chimpanzé o é das células dele, a tartaruga idem, etc! - O Hans estava extasiado com a sua
descoberta; tinha encontrado uma explicação para o facto de não existir um
contínuo de seres desenhando o percurso da evolução e para o facto de os seres
que existem parecerem ter parado de evoluir, como a tartaruga ou o chimpanzé. Mas
havia uma pequena correção a fazer; ri-me com o súbito entusiasmo dele e
acrescentei:
- Isso mesmo! Há
só um pormenor a corrigir no que disseste: não é verdade que os seres que
existem não evoluem; todos os seres vivos mantêm os seus mecanismos de evolução,
simplesmente esta está limitada pela capacidade das suas células; as suas
células é que não evoluem.
- Os seres vivos
evoluem? Onde é que vês isso? A tartaruga evoluiu nos últimos 400 milhões de
anos? O espanto do Hans era quase indignação.
- Evoluem sim;
por exemplo, há uma rã que desenvolveu uma adaptação ao gelo, as suas células
não congelam graças a uma proteína que ela produz; ora os gelos só existem na
Terra há uns dez milhões de anos, antes disso a Terra era mais quente;
portanto, a rã, uma espécie muito mais antiga que os gelos, desenvolveu essa
adaptação muito depois de terem surgido células mais evoluídas do que as suas,
o que significa que ela fez uma evolução numa altura em que as suas células já
não evoluíam. Mas há muito mais casos, desde a hibernação dos ursos à adaptação
das flores à polinização por insectos. Os seres vivos adaptam-se / evoluem
continuamente, as células é que não, apenas em determinadas ocasiões.
- Acho que te
estou a perceber... então, para ti, os seres vivos são como os computadores; a
célula é o hardware e o ser vivo o resultado do software; o software está
limitado pela capacidade da célula; sempre que esta evolui e passa a suportar
um software mais complexo, dá-se uma evolução do software, ou seja, do ser
vivo, até esgotar a capacidade da célula... como nos computadores, onde um
avanço tecnológico origina microprocessadores e memórias mais poderosos e estes
um novo desenvolvimento dos sistemas operativos e programas.
-Sim, é uma
razoável analogia... colocaste aí 3 níveis de evolução: tecnologia, hardware e
software... estás mais certo do que imaginarás no que toca à comparação com a
biologia mas por agora vamos apenas considerar dois níveis, a célula e o
software de cada ser, escrito no seu DNA; cada um destes níveis tem o seu
processo evolutivo. O que interessa para questionar as ideias darwinianas é a
evolução do software dos seres vivos, do seu DNA; é saber se esta resulta de
mutações e seleção natural ou se usa outros processos. Já te mostrei que a
evolução por seleção é uma impossibilidade que apenas continua a ser referida
porque ainda ninguém apresentou uma alternativa melhor; é isso que me proponho
fazer agora; estás com paciência para me ouvir?
O Hans sorriu-se;
- Tens até eu acabar esta cerveja!
- Chega e sobra!
Ora presta atenção.
(continua)
Etiquetas:
A Evolução da Vida,
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