segunda-feira, novembro 26, 2012

O Império dos Ricos

Imagem retirada deste blogue; recomendo a leitura, e do seu post mais recente, sobre Séneca


Os comentadores televisivos, os partidos da oposição, toda a gente, anda a dizer que o nosso governo tem falhado todos os objectivos: a dívida aumenta, o desemprego aumenta, o deficit público aumenta, a recessão aumenta. Segundo toda esta gente, o governo e a troika serão duma incompetência total, de uma burrice inacreditável pois insistem na mesma política que tem conduzido a estes resultados e necessariamente continuará a agravá-los. Paradoxalmente, a troika diz que Portugal está “ no bom caminho”, que as medidas são um sucesso; além de incompetentes serão loucos?

Na verdade, eles nem são incompetentes nem loucos, mas exactamente o contrário. E é bem verdade: as medidas têm sido um sucesso.

O equívoco está no que as pessoas pensam que é o objectivo das medidas; e não é por falta de esclarecimento do governo e da troika, que estão fartos de o dizer: o objectivo imediato é

Empobrecer os portugueses

Parece um objectivo disparatado? Mas não é, pelo contrário, é o objectivo adequado dentro do sistema político em que vivemos. Mas antes de percebermos isso, confirmemos que de facto o objectivo é esse.

Se este é o objetivo, as medidas têm sido um sucesso: estamos cada vez mais pobres. O ordenado médio já caiu perto de 20%! E o ministro da Economia parece só estar interessado nas concessões mineiras, a que não deve ser estranha a conexão canadiana com a estranhíssima empresa Colt. Até agora, já se viu alguma medida de apoio às empresas que trabalham para o mercado interno e que são responsáveis pela quase totalidade do nosso PIB e do nosso emprego?

Mas “empobrecimento” como objetivo parece realmente uma coisa disparatada. Na verdade, o “empobrecimento” é só o meio para conseguir o verdadeiro objetivo: mão-de-obra barata de forma sustentada.

Não é isso que se procura constantemente no sistema capitalista? Mão-de-obra tão barata quanto possível? Não querem pagar o mínimo à mulher-a-dias? Pela refeição no restaurante? Pelo leitinho no supermercado? Pelo bilhete do futebol? Quem recebe quer receber o máximo, quem paga quer pagar o mínimo, estas são as regras do sistema. A ideia é que um sistema assim encontra o seu equilíbrio naturalmente. Uma ideia muito do agrado daqueles que esperam que o sistema se desequilibre cada vez mais a seu favor, sabendo-se como se sabe que este sistema se desequilibra sempre para o lado do mais rico.

Porque é que surge este problema agora aqui? Uma razão é porque já não há no mundo onde obter mão-de-obra barata de forma sustentada. Hoje, já ninguém aceita fábricas estrangeiras sem pesadas contrapartidas. As fábricas na China têm pelo menos metade de capital chinês, prazo de saída e são obrigadas à transferência de saber-fazer. A Volskwagen tem de sair da China até 2030. Mas sai antes, porque os chineses não nasceram para escravos e os ordenados lá têm de subir quase à taxa a que sobem os rendimentos dos ricos no mundo ocidental.

É por isso que os Ricos precisam de “mexicanizar” o sul da Europa, não têm alternativa.

Vejamos quais são as medidas que servem este objectivo:

1 – Empobrecimento
Para que as pessoas aceitem trabalhar por ordenados miseráveis é preciso que não tenham alternativa; isso implica duas coisas: cortar os apoios sociais e aumentar o desemprego. Como é que se aumenta o desemprego? Através da recessão, ou seja, fazendo cair a economia interna. Não são as empresas exportadoras que geram o grosso do emprego, são as empresas que trabalham para o mercado interno. Como é que se faz falir estas empresas? Empobrecendo os portugueses. Se os portugueses tiverem menos dinheiro, consomem menos e levam as empresas dependentes do mercado interno à falência. Daí a importância do empobrecimento e da falta de apoio às empresas que trabalham para o mercado interno; daí o facto de a recessão ser não um indicador do falhanço da política mas do seu sucesso!

2 – Redução dos apoios sociais
A redução dos apoios sociais é indispensável à existência de mão-de-obra disponível para trabalhar por qualquer preço e em quaisquer condições; e também para reduzir a TSU, o que permite baixar o custo do trabalho.

3-Reduzir o Estado a um órgão executivo dos Mercados
Há um objectivo de acabar com o Estado como o órgão de gestão dos povos. Quem manda são os “Mercados”, as políticas económicas são definidas de fora, o Estado social acaba, o ensino, a saúde, os serviços públicos são privatizados, as forças armadas acabam por inúteis, , os transportes, as águas, a energia, o notariado... a justiça é “independente”, ou seja, continua ao serviço dos Ricos mas paga pelos pobres... a polícia acabará por ser transformada numa espécie de segurança privada dos ricos paga pelos pobres... o estado reduz-se assim a um mero órgão executivo dos Ricos.
Sabem quando foi feito o referendo a perguntar se prescindíamos de ter um país? nas últimas eleições, por isso é que o PSD apareceu a cantar o Hino Nacional e de pin na lapela, como as homenagens que se fazem aos que vão morrer; por isso houve acabar com certos feriados.

O mundo capitalista é um império dos ricos. Uma Plutocracia. E uma Plutocracia não quer saber de países e Estados, vistos como obstáculos e incómodos ao crescimento do seu poder.

Como os “mercados” são os Ricos, é por isso que o “regresso aos mercados” depende de empobrecermos de acordo com os objectivos de empobrecimento. O “regresso aos mercados” depende apenas de o governo conseguir que as fábricas europeias se possam instalar aqui com um custo bruto do trabalho de 2 euros por hora, isentas de impostos e de legislação laboral, não tem nada a ver com a dívida pública nem com o deficit.

Os governos dos países neste sistema obedecem aos mercados, ou seja, ao poder dos Ricos.

Mas há outra razão para isto acontecer e essa é inteiramente da nossa responsabilidade; e é essa que torna muito difícil sairmos desta situação (e também não tem nada a ver com a dívida)
(continua) 

segunda-feira, novembro 19, 2012

Peluches de Oleiros



Fico muito impressionado com a história da fábrica de peluches de Oleiros; ela retrata bem o nosso atraso.

Quando um empresário monta uma fábrica num país estrangeiro onde não tem mercado, na busca da redução de custos, há uma coisa que ele tem de acautelar: o saber-fazer.

Se ele não se acautelar, logo aparecerá quem fabrique o mesmo que ele e estabeleça concorrência.

Hoje, estas situações são definidas à partida em todo o Mundo. Os países aceitam fábricas estrangeiras na condição de a controlarem suficientemente (normalmente detendo metade do capital), de elas terem um prazo de saída que é fixado logo no inicio (a Volkswagen tem de sair da China até 2030, se não estou em erro), e de deixarem ficar as instalações operacionais.

A condição de os países hospedeiros terem controlo da empresa tem 3 objectivos: um é evitar que essas empresas desenvolvam políticas de esmagamento da mão-de-obra, fomento do desemprego, etc, conducentes a manter baixos os seus custos, outro é recuperação de parte dos lucros, e o terceiro é garantir a transferência de saber-fazer.

Em troca, esses países não desenvolvem concorrência até ao fim do prazo acordado a não ser de forma limitada. É por isso que os chineses não vão exportar carros para o ocidente até 2030.

No caso da fábrica de Oleiros, não é por acaso que ela foi para um sítio no “fim do mundo” em vez de ir para os arredores de Lisboa, onde teria menores custos de funcionamento – estas fábricas procuram lugares isolados para minimizar os riscos de concorrência. A fábrica estava “escondida” em Oleiros mas agora foi “descoberta”; os riscos disso, associados aos custos relativamente altos de funcionamento ditam a necessidade de se ir esconder para outro lado (e também pode ser que a Merkel não tenha gostado das conversas acerca de o peluche ser feito em Portugal e mandado a fábrica sair de cá; há que educar os inferiores, ensiná-los que não podem mandar bocas ao chefe)

A fábrica de Oleiros vai ser abandonada? Há um lado positivo nisso!

Com certeza que ao fim de tantos anos, numa actividade com tanta componente manual, já haverá pessoas com conhecimentos para dar continuidade à actividade de fabricar peluches de qualidade!!!

O que há a fazer é isso. Não é o que os chineses fariam?

Claro que a maior componente do valor dos peluches não é o seu fabrico, é o marketing; bom, mas aproveitemos o que temos e talvez sejamos capazes de dar a volta por cima. O presidente da câmara já analisou essa possibilidade? Deve haver cá empresários nacionais do ramo, ou de ramos próximos, como o calçado, que podem ver aí uma oportunidade de negócio.

Aqui, estou de acordo com o Passos Coelho; estas coisas são oportunidades. Essa fábrica, ao sair, liberta saber-fazer; e isso é valioso. Aproveitá-lo não será fácil mas é o que há a fazer. Ela não ia lá ficar para sempre, não é verdade?

segunda-feira, novembro 12, 2012

A Refundação da Banca



Tudo o que corre mal na sociedade humana pode ser melhorado corrigindo as regras da sociedade; e sempre que alguma coisa corre mal, há que corrigir as regras.

Os pequenos erros são difíceis de corrigir porque há sempre muitos interesses que beneficiam deles; mas as grandes catástrofes, ao contrário, são uma oportunidade de ouro para corrigir grandes e pequenos erros. O Tsunami do Japão acabou com o programa nuclear da Alemanha, por exemplo.

O sistema bancário atual tornou-se um paradoxo: o Estado é o garante do sistema sem ter nenhum controlo sobre os riscos. Um absurdo que importa corrigir rapidamente.

E é fácil corrigir.

Para começar, os depósitos a prazo saem da banca. O que cria o risco sistémico é as pessoas terem as poupanças na banca. Saindo de lá os depósitos a prazo, esse risco acaba.

Vão para onde os depósitos a prazo? Para o Estado. O Estado só pode ser o garante desse dinheiro se tiver a sua gestão direta. Os depósitos a prazo vão para os Certificados de Aforro. Dupla vantagem para o Estado, ou seja, para todos os contribuintes: o Estado tem o controlo do risco e financia-se livre de ataques especulativos.


Para a Banca fica a prestação de serviços bancários – gestão de contas à ordem, multibanco, etc. Serviços de que ela naturalmente se cobrará. E fica o crédito ao consumo e a actividade financeira dita de “investimento”, ou seja, a actividade que consiste em ganhar dinheiro com o dinheiro. As pessoas que querem ganhar dinheiro com o dinheiro aderem aos produtos que a banca lhes propuser mas ficam com os riscos, ou fazem seguros, o que quiserem, tudo menos querer que seja o Estado, ou seja, os contribuintes, as pessoas que não querem correr riscos, a assumir os prejuízos quando as coisas correm mal e eles ficarem com os lucros quando as coisas correm bem. Se falir, faliu. Todas as iniciativas privadas têm de poder falir; o que não puder falir tem de ficar sob o controlo do Estado.

Como é que se consegue esta profunda mudança? Facílimo: o Estado remunera os certificados de Aforro adequadamente e as pessoas mudam. Os Bancos financiam-se agora no BCE a 0,75%, não precisam dos depósitos a prazo, até porque estão limitados no volume de empréstimos que podem fazer. 

O Estado ainda tem de assegurar duas outras coisas.

Uma é o crédito às empresas nacionais. Essencial para garantir igualdade de competitividade. O Estado tem de ter um Banco de Fomento ou um banco dependente do Estado que assegure essa função. Podia ser a CGD, mas teria de levar uma escovadela enorme; talvez o mais simples seja começar de novo, fazer um novo banco e privatizar a CGD, ou talvez a CGD consiga fazer uma inversão de percurso. A ver vamos.

A outra coisa é o crédito para assegurar dois direitos fundamentais: à habitação e à educação.

O crédito à habitação tem servido de capa para todo o tipo de crédito ao consumo e fugas aos impostos; mas não pode ser, este é um crédito com regras especiais, que tem de ser controlado pelo Estado. Como a Banca não é agora controlada pelo Estado, este crédito deve ser função do Estado ou, pelo menos, o Estado deve ter uma relevante capacidade de intervenção. É o que se passa na Suécia, segundo creio.

O mesmo se passa com créditos necessários a garantir a igualdade de oportunidades, nomeadamente para a educação. É o que têm os países nórdicos.


Como vêm, não só é fácil resolver estes problemas como até já está feito nos países nórdicos; já ouviram falar de alguma crise financeira na Suécia?

Claro que ainda há uma questão de fundo a resolver com a circulação de capitais e os offshores. Mas lá chegaremos.

quinta-feira, novembro 08, 2012

A Carta



Excelências

Venho comunicar-vos que a chanceler decidiu arrancar já com a 3ª fase do plano de mexicanização do Sul. A chanceler considerou existirem condições invulgarmente favoráveis em Portugal que é preciso aproveitar de imediato, tendo dado a 2ª fase do plano por concluída, atendendo a que o abaixamento dos custos laborais já conseguido é excelente e suficiente, conforme anunciou no seu discurso de ontem.

As condições em Portugal são actualmente ideais, pois o povo aceita tudo sem reagir, o PM é completamente submisso, o PR está isolado e nunca fará nada que belisque os seus interesses pessoais imediatos.

Ao abrigo do previsto para a 3ª fase, foi já acordado com o Ministro da Educação português o nosso controlo sobre o ensino público, que irá formar o pessoal necessário às nossas empresas, as quais beneficiarão de períodos longos de estágio suportados pelo ME português, ou seja, mão-de-obra paga pelo Estado Português. Habilidosamente, o ministro anunciou a adopção do plano de ensino “dual” alemão. Ninguém reagiu.

Segue-se a instalação de filiais de empresas alemãs em Portugal. Isto será apresentado como o esforço alemão para o desenvolvimento económico de Portugal e a primeira acção será a visita da Chanceler a Portugal acompanhada da equipa seleccionada para a ocupação. Garantirá mão-de-obra muito barata em Portugal, que começaremos a trazer para a Alemanha a título de “circulação de trabalhadores”, torneando a resistência dos nossos sindicatos. Actualmente estamos a importar especialistas de Portugal a metade do preço praticado na Alemanha mas por este processo vamos reduzir para 1/5 o seu custo. Recordo que o objectivo final é reduzir a 1/10 o custo do trabalho, que será atingido através do processo de redução progressiva de salários que se retomará na quarta fase, uma vez assegurado o fim de qualquer possibilidade de autonomia. Já lançamos um movimento a apelar à abstenção e isso dará o pretexto para ocuparmos politicamente o país, uma vez que os portugueses irão dessa forma declarar que não querem ser governados por portugueses.

Há um único aspecto que temos de manter controlado: o Ministro das Finanças português, Gaspar, é um agente do FMI e é muito mais perigoso do que pensávamos. Combinou com os chineses uma privatização fictícia da EDP que nos obrigou a suspender o plano de privatizações; só podemos retomar o plano depois de corrermos com ele, pois aplicará um golpe semelhante em todas as privatizações e nem uma virá para as nossas mãos. Já avisámos que as privatizações não vão contar para as contas do deficit, a fim de suspender o processo.

Além disso, há um movimento de bastidores que pretende que o PR nomeie um governo de iniciativa presidencial com o Gaspar em Primeiro-Ministro. Em caso algum podemos consentir nisso ou ele tornar-se-á um novo Salazar e boicotará todos os nossos planos. Não estamos muito preocupados porque o PR deles nunca faria isso, sabendo como nós o podemos prejudicar. À cautela, vamos aproveitar o próximo buraco orçamental para responsabilizar o Gaspar e propiciar a sua remodelação. Aproveitaremos para correr também com o Ministro da Saúde que parece ser competente demais e essas pessoas tendem a tornar-se perigosas.

Quanto à oposição política: como prevíamos, sem o Sócrates o PS não existe, limita-se a fingir que existe; e a esquerda é marginal. A direita está controlada, não representa qualquer ameaça.

Face a estes bons desenvolvimentos da situação, venho solicitar o pagamento acordado para a 2ª fase; é certo que esta ainda não está concluída nos outros países, mas Portugal irá funcionar como locomotiva e a instalação de empresas alemãs em Portugal irá levar os outros, face aos seus crescentes e insolúveis problemas de emprego, a aderir à 3ª fase.

Com os melhores cumprimentos,

Dr. Jordan

terça-feira, novembro 06, 2012

Quem tem o Poder?



Um aspecto que me parece importante salientar nesta altura é o seguinte: fala-se muito da importância dos mercados, que estamos submetidos aos mercados, são as leis dos mercados que nos regem, o sistema é baseado na confiança nos mercados, etc, etc.

Tretas!!!

O sistema é baseado na confiança sim, mas não nos mercados – na confiança no Estado. É por isso que o Estado é que avaliza os depósitos e avaliza os próprios bancos. O sistema financeiro é tão independente, tão independente, tem impressoras para imprimir dinheiro à sua vontade, o BCE empresta à banca a juro quase nulo, a fiscalização é toda sua, mas quando se trata de aguentar com os prejuízos é o Estado que tem de por a mão por debaixo.

Um paradoxo, não é?

Na verdade, quem tem o Poder é quem faz as Leis e os Decretos-Lei.

O Estado está sujeito à chantagem dos mercados? Só enquanto o quiser – basta-lhe ameaçar tirar “ a mão debaixo” para os mercados se ajoelharem. E para acorrerem a emprestar dinheiro às dívidas soberanas que é onde ele está seguro; não é o Estado o avalista final?

Não quer isto dizer que os financeiros não tenham poder; têm, mas um Estado na mão de quem tenha cabecinha acaba sempre por levar a melhor. Pode abanar se apanhado de surpresa, mas depois acaba por sair vitorioso (desde que tenha governantes à altura...)

Os mercados são altamente previsíveis no seu comportamento, funcionam para o lucro máximo no prazo mínimo; e os Estados, querendo, manobram-nos à sua vontade. As crises financeiras não são nenhum fenómeno natural, algo que nos ultrapassa e submerge; são o mero resultado da acção predatória de uns que querem enriquecer à custa dos outros. Uma acção de consequências previsíveis com antecedência para quem percebe um mínimo do assunto, por um lado; por outro lado, a previsibilidade do comportamento dos mercados faz das crises um fenómeno manipulável, programável, por quem percebe do assunto. Ou seja, a crise tanto pode surgir periodicamente porque a ganância financeira gera ciclos presa-predador como pode surgir porque um Estado fez manipulação para a produzir.

Quando olhamos para a actual crise do Euro, a primeira coisa que é evidente é que ela não se deve a uma dívida soberana excessiva. A nossa é igual à da generalidade dos países e a de Espanha é metade. Nem é devida a uma balança externa deficitária, a da Grécia não o era; nem à fraqueza da economia, a da Itália é pujante. Nem sequer é devida à crise financeira porque os países fora do euro não estão com um problema desta dimensão. Não há nada de comum entre os países afectados a não ser uma coisa: não estão sob o domínio Franco-Alemão na Europa.

Quem faz uma guerra, o primeiro cuidado que tem de ter é esconder isso. A primeira habilidade de quem quer fazer a guerra é a arte da dissimulação.

“Deus é Subtil” disse o Einstein; a nossa inteligência é muito limitada e tudo o que nos parece lógico, acertado, óbvio, nunca o é. Se é tão óbvio que são os financeiros quem puxa os cordelinhos da actual situação, é porque... não são!

Esta crise foi produzida de propósito para gerar uma situação que permite atingir outro objectivo; numa guerra começa-se sempre por criar uma diversão. A diversão é a primeira operação no terreno.

Os financeiros são altamente previsíveis, fáceis de manipular, ideais para manobras de diversão. O verdadeiro problema não é financeiro, essa é a diversão.Tentar combater o problema olhando apenas para o lado financeiro é cair no engodo! É uma ingenuidade...

Eu andava convencido que o Governo não percebia nada desta tramóia; ela é sofisticada, comecei a desenhá-la com as conversas com o Dr. Jordan, depois percebi que tinha de ir mais devagar e comecei com as conversas com o Hans. Mas eis que em pleno dia de finados uma luz se me acendeu:

Imaginemos que o Governo conhece perfeitamente todo o plano. E suponhamos que não é conivente com ele. Como deve proceder?

A primeira coisa é não o mostrar: a arte da dissimulação é fundamental numa guerra, sobretudo quando se está em guerra com algo muito mais forte. Portanto, o primeiro cuidado a ter é manter o adversário convencido de que se está completamente apanhado no engodo.

A seguir, é preciso agir como um seguidor submisso e estúpido, desastrado, burro. Isso vai permitir fazer “erros” que irão comprometendo o sucesso da operação do outro.

Eu não vou divulgar aqui as minhas conclusões, seria fazer o jogo do inimigo. Esta guerra ainda está no começo. Mas uma coisa lhes digo: vou dormir muito mais descansado, desde que descobri que há génios neste Governo. De facto, o custo enorme da formação do ministro foi um belo investimento que este país fez. Penso mesmo que vamos dispensar a troika antes do fim do período acordado.

A única coisa que preciso fazer é colocar as minhas economias em certificados de aforro.

Reparemos agora na estratégia de Espanha: a Espanha é muito mais forte que Portugal, por isso a estratégia dela é outra – é a estratégia do porco-espinho. A Espanha não é suficientemente forte para ganhar a guerra, mas é suficientemente forte para poder causar estragos relevantes: a Espanha tem poder de dissuasão, empata o inimigo e isso enfraquece-o, desorienta-o, desorganiza o ataque. Nós não temos, por isso temos outra estratégia.

Ganhar tempo é fundamental porque existe mesmo uma crise financeira e ela vai cair em cima da Alemanha. Paradoxalmente, a crise financeira é algo que os arquitectos desta guerra não previram, estavam convencidos que iam desenhar um ataque imparável às dívidas soberanas; mas em breve será a própria crise que obrigará os financeiros a correrem para o porto seguro das dívidas soberanas dos países do Alho...

Ou seja, a resistência a este ataque não está descoordenada como poderia parecer.

Claro que há duas frentes de batalha: temos não só de furar os planos do inimigo como pôr de pé a nossa actividade económica; o Governo está a tratar da primeira, que é prioritária, eu vou continuar a pensar na segunda. É que temos de aproveitar a austeridade para endireitar o país, que tem vindo a ganhar uns podrezitos aqui e ali...