terça-feira, agosto 21, 2012
O meu amigo alemão
Foi uma surpresa
encontrar o Hans na esplanada de Odeceixe; foi ele quem me reconheceu, ser careca
tem essa vantagem, não mudamos de cabeça com a idade...
Conheci o Hans há
bem uns vinte anos atrás; era engenheiro de uma grande empresa alemã de
equipamentos de telecomunicações e metrologia e viera a Portugal por causa de
um concurso internacional aberto por uma empresa pública; contactara-me para
saber as possibilidades de conseguir incorporação nacional para os seus
equipamentos, crendo que isso seria uma vantagem para o concurso. Lá o informei
que possibilidade existia, mas que seria um grave erro da parte dele porque os
gestores das empresas públicas tinham horror a tudo o que fosse nacional, até
porque não faltaria quem os acusasse de corrupção se se atrevessem a adjudicar
alguma coisa no mercado nacional. Até as verbas do PEDIP, supostamente
destinadas ao desenvolvimento da indústria nacional, eram preferencialmente
atribuídas a empresas estrangeiras. Ele não me acreditou e lá lhe dei as
informações que pretendia.
Mais tarde, pediu-me desculpa de ter duvidado de mim; contou-me que apresentou a sua proposta de incorporação nacional na primeira reunião de
negociação e que a recepção foi tal que na reunião seguinte apresentou um
declaração em como nem um parafuso dos seus equipamentos seria montado em
Portugal! Disse-me então uma coisa de que nunca mais me esqueci:
assim, o vosso país vai ao fundo e vão
arrastar a Europa com vocês!
E foi exactamente
com essa frase que começamos a conversa que se segue, enquanto as respectivas
esposas iam apanhar sol para a praia. Tinhas toda a razão, e já várias vezes citei o que me disseste na blogoesfera, disse-lhe eu.
Não, não, esta
crise não tem nada a ver com isso; aliás, o vosso primeiro-ministro anterior, o
Sócrates, estava a colocar o vosso país no rumo certo. Esta crise é tão má para
vocês como para nós.
Senti-me logo
irritado; lembrei-me do Cavaco a dizer que também estava sem dinheiro ou do
Vale e Azevedo a dizer que vivia da caridade dos amigos. Que mania esta a dos
ricos de se vitimizarem. Ele deve ter percebido o meu desagrado porque se
apressou a acrescentar:
Agora, pelo contrário, seriam vocês que podiam fazer qualquer coisa para se salvarem e
salvarem-nos, a nós e à Europa.
Nós?!? Não pude
reprimir o espanto. Como?
Lembro-me, do
nosso contacto anterior, de que és uma pessoa lúcida; por isso,
deves ter uma ideia do que esteja a causar a crise, não é verdade?
Sim, tenho, mas
quero ouvir a tua versão, até porque não estou a ver como é que Portugal pode
ter um papel na sua resolução, respondi-lhe, cauteloso, enquanto o olhar se
distraía nas duas vistosas loiras que tinham acabado de chegar à esplanada
Já vais perceber.
Deixa lá as loiras e presta atenção ao que te vou dizer.
(continua)
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