The burning of Troy |
sábado, julho 28, 2012
Política de Terra Queimada
Há alguns anos,
tornou-se público na Dinamarca o plano da NATO em caso de tentativa de invasão
Russa; segundo esse plano, alguns países, nomeadamente a Dinamarca, seriam
“terra queimada”. Plano muito “lógico”, havia que defender o coração da Europa,
portanto destruía-se a periferia para estabelecer uma terra de ninguém onde
fosse mais fácil combater os russos e proteger os cidadãos do coração.
Estranhamente, os Dinamarqueses não gostaram nada do plano.
A Europa, e não
só, embarcou numa perigosa e desajustada teoria económica (de que falarei
noutro texto), de uma particular escola. Em consequência, os grandes bancos
europeus, nomeadamente o Barclay’s e o Deutshe, devem ter um buraco financeiro
de dimensão apocalíptica. Isto pode parecer surpreendente mas não é, o buraco
não é decorrente de “incompetência” ou “corrupção” mas a necessária
consequência da referida teoria económica. Quanto maior o banco, maior o
buraco.
Qual é a
estratégia para resolver esta situação?
A mesma de
sempre: sacrificar a periferia.
A política de
“empobrecimento” não é para os funcionários públicos, ou para os portugueses
empregados, é para toda a periferia europeia. Na verdade, o buraco central será
tão grande que o “empobrecimento” é para toda a Europa à excepção da Alemanha e
da Inglaterra. A ideia é sacar todo o dinheiro que seja possível sacar para
tapar esse buraco. A política de empobrecimento é apenas
um nome para uma política de terra queimada, que vai abranger toda a gente com
atividade nos países envolvidos, ricos ou pobres.
A medida mais
recente é recusar um mecanismo de suporte aos depósitos bancários; isto é um
convite aos depositantes para correrem para esses dois bancos, vistos como
“sólidos”. Na verdade, é uma armadilha: um banco pequeno pode ser muito mais
seguro do que um grande porque está muito menos envolvido nas práticas
financeiras agora ditas de risco – basta que saiba gerir a bolha imobiliária
com inteligência, o ponto frágil dos bancos pequenos.
(um banco cujo
presidente atribui o mau momento à Constituição Portuguesa não dá garantias de
uma gestão inteligente; um gestor para a crise tem de ter um entendimento
oposto aos gestores que conduziram a ela e que agora só sabem encontrar culpados
em todo o lado menos neles – ele é o Sócrates, ele é a Constituição, ele é...)
Até ao fim deste
ano vamos decidir o nosso futuro. Por acção ou omissão.
segunda-feira, julho 16, 2012
Porque é que empobrecemos na era da abundância?
No ocidente,
vivemos na era da abundância; o que limita esta abundância é apenas a
capacidade de consumo, porque podemos produzir muito mais sem qualquer
dificuldade; sendo assim, como é que ainda há tanta pobreza no mundo ocidental
e, pior do que isso, porque estamos num processo de empobrecimento?
Um exemplo que me
parece excelente para compreendermos como evolui o sistema liberal é o caso dos
supermercados.
Como é que os
supermercados maximizam o lucro? Vendendo o máximo e com a margem de lucro máxima,
lógico.
O que é que
limita o volume de vendas? O preço de venda.
O que é que
limita a margem de lucro? A possibilidade dos produtores terem circuitos
alternativos de distribuição.
Então, como é que
se maximiza o lucro?
A solução de
médio prazo é a seguinte: baixar continuamente o preço de venda.
Parece um absurdo, não é? Mas vejam como funciona.
Baixar o preço de
venda tem uma influência positiva no volume de vendas; porém, degrada a margem
de lucro. A seguir, baixa-se o preço que se oferece ao produtor. Como o preço
de mercado é o definido pelo supermercado, as mercearias de bairro têm de o
seguir e o produtor não tem alternativa. Então, o produtor procura aumentar a
eficiência e baixar os seus custos – vai buscar trabalhadores à Tailândia ou à
Argélia, pressiona os fornecedores de adubos e rações para pagar menos. Assim,
os supermercados recuperam a margem de lucro, que usam para continuar a baixar
os preços. Este processo tem uma consequência positiva – aumento de eficiência
– e uma negativa – empobrecimento do lado de baixo da cadeia produtiva.
Na atual situação
de crise, em que há empobrecimento da maioria dos clientes, para manter o
volume de vendas os supermercados tiveram de fazer um corte muito grande nos
preços. Não tem problema, a seguir os produtores vão ter de lhes vender mais
barato ou não vendem.
Os consumidores
acham ótimo que assim seja, porque pagam menos pelos produtos (exceto se também
forem produtores).
Este processo é
geral, a competição gera necessariamente este fenómeno.
Os governos,
porém, são eleitos para melhorarem a qualidade de vida das pessoas. Precisam de
contrariar este processo. Mas, incapazes de uma solução sistémica, o que fazem
é tratar os sintomas: subsidiam as pessoas. Subsidiam a saúde, a educação, os
transportes. Com isto, as pessoas precisam de menos dinheiro para viver, os
empresários podem pagar menos ordenado. Mas a competição não tem limite. Então
os estados subsidiam mais: subsidiam o desemprego, subsidiam os períodos de
menor atividade das empresas (em França), subsidiam os produtores (PAC). Mas
não chega. Então começam a subsidiar o emprego, com os incentivos ao primeiro
emprego. Os empresários passam a só ter de pagar uma parte dos ordenados. Mas
não chega. Passam a subsidiar os empresários para criarem emprego, dar emprego
passa a ser uma actividade geradora de lucros – por exemplo, o Estado paga
estágios profissionais a 690 euros, os empresários contratam licenciados a 490
euros e lucram 200 euros com cada um. Licenciados com experiência, não se trata
de um custo de formação.
Teoricamente, com
estes apoios, as empresas ficariam mais competitivas, teriam lucros, e a estes
lucros ia o Estado buscar o dinheiro para os subsídios. Só que não é verdade,
neste esquema competitivo só tem lucros quem está o topo da pirâmide, os
grandes grupos financeiros, os super-ricos – e estes não pagam impostos.
Os países da
europa do Norte estão na metade superior desta cadeia; nós na inferior. Não é
por acaso, nem é apenas porque têm mais formação, é porque eles sempre
defenderam os seus interesses a todo o transe, desse por onde desse,
independentemente de quaisquer teorias académicas. Eles vivem na economia real,
não na dos académicos, como cá.
Quem está no meio
desta cadeia não entende porque há-de estar a pagar para subsidiar os que estão
na base. Esses gulosos que querem viver acima das suas posses. Por isso, há que
acabar com o “Estado Social”. E assim as pessoas da base (nós) vão ter de viver
do ar. E eles ameaçam: se não gostam vamos buscar empregados à Nigéria. África
e Ásia são fornecedores infindáveis de escravos porque não têm controle de
natalidade.
À nossa frente
está um interminável processo de empobrecimento. Miséria absoluta. Não haja
ilusões. A mesma miséria a que nós temos condenado uma parte significativa da
população portuguesa. Os Alemães não são piores do que nós, são até melhores. Só
que agora vamos ficar no papel em que andamos a pôr muitos portugueses desde há
muitos anos. Agora vamos todos para o bairro da lata.
domingo, julho 01, 2012
O Mistério Português
Na última cimeira
europeia o impossível aconteceu: o BCE (tanto quanto percebi) vai financiar as
dívidas soberanas através do fundo de resgate. A pedra de toque de todo este
processo de destruição dos Estados caiu. Como foi isto possível?
Toda a evolução
das sociedades humanas, os diferentes sistemas políticos, as leis, as regras,
praticamente toda a estrutura da sociedade humana, decorre de uma única coisa:
o poder negocial dos interesses em jogo.
O Poder Negocial
é a Grande Lei da Sociedade, tudo o resto é consequência desta lei.
Por exemplo, foi
o movimento sindical que deu poder negocial aos trabalhadores e lhes permitiu
acordos que foram fixados em Leis, garantidas pelo Estado.
Na última
cimeira, França, Espanha e Itália uniram-se e obtiveram um poder negocial
superior ao da Alemanha; e assim conseguiram o que queriam. E o que queriam
eles? Salvar os Estados; porque a destruição dos Estados é o objectivo dos
“ricos”, pois já não precisam deles, quem precisa deles é sobretudo a classe
média porque já não tem sindicatos, já não tem organização, já não tem poder
negocial, não tem outro poder que não seja o que vem do Estado; e a classe mais
pobre já pouco tem a perder com o fim do Estado.
Há várias
maneiras de ter poder negocial; uma é pela força bruta, “pelo número de
espingardas”, que foi o que aconteceu nesta cimeira; a outra é sendo “um grão
na engrenagem”, que foi o que fizeram os gregos; outra ainda é ameaçar causar
algum prejuízo porque, na sociedade humana como na selva, raramente alguém está
disposto a ficar ferido para matar o outro, que foi o que tentou fazer o
Sócrates, à mistura com algum bluff (mal sucedido, pois a fragilidade da sua
situação condenava à partida qualquer possibilidade de sucesso negocial).
E nós agora? Como
é evidente, Portugal não só não negoceia como, pelo contrário, o governo agrava
unilateralmente as exigências da outra parte; que estratégia é esta, que merece
o apoio dos portugueses dado que não há contestação significativa nem quebra
nas intenções de voto? Nem sequer o líder da oposição contesta a não ser com
palavras de circunstância e vazias de consequências? Que mistério é este?
(continua)
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