Vamos lá então ver se conseguimos imaginar um processo de o Sol esconder de nós o bater do seu coração. Dei-vos uma pista: água a ferver! Isto sugeriu-vos alguma coisa? Em que consiste este fenómeno?
É uma mudança de estado... líquido para vapor...
Certo... e...?
E a temperatura da água não varia...
Exacto! Apesar do constante fornecimento de energia, a temperatura não varia! E não varia porque toda essa energia é absorvida na mudança de estado. Ora bem, há um fenómeno no Sol semelhante à vaporização da água. Chama-se ionização. Sabem o que é?
É a perda de electrões dos átomos
Muito bem. Vejamos o que se passa com o átomo de hidrogénio, mais de 9o% dos átomos do Sol, e se compõe simplesmente de um electrão a orbitar um protão.
Na zona mais externa do Sol, esta estrutura mantém-se estável, enquanto no interior profundo do Sol as condições energéticas são tais que arrancam o electrão: o hidrogénio desaparece, desfaz-se em protões e electrões.
São as camadas convectiva e radiativa do Sol
Vejo que estudaste o Sol. Explica lá isso aos outros, se fazes favor.
A zona convectiva é a externa e a radiativa fica entre esta e o núcleo do Sol. Na zona externa, o transporte de energia para o exterior é feito pelos átomos, que se movimentam e que transmitem a sua energia uns aos outros por contacto; na zona radiativa, a energia já não é transportada pela matéria mas pela radiação, sucessivamente absorvida e re-radiada pelos átomos.
E isso são dois estados da matéria? Como água e vapor?
Não... isso tudo está certo, mas permitam-me uma colherada. O que é realmente importante, na minha análise, é se os átomos de hidrogénio estão ou não ionizados. Na zona profunda estão ionizados, na zona superficial não estão. E estes é que são os dois estados da matéria, como vapor e água.
Ionizado corresponde a vapor?
Exactamente. A outro nível, mas é na mesma um processo de dissociação, não de átomos ou moléculas, mas das próprias partículas atómicas. A uma gás ionizado chama-se “plasma” e considera-se este o quarto estado da matéria: sólido, liquido, gasoso e plasma. Em qualquer dos casos, a mudança para o estado seguinte consome energia.
Humm, estou a ver... então a fronteira entre a zona ionizada e não ionizada é como a superfície da água a ferver?
Não será exactamente, mas tem as suas semelhanças. Seria complicado entrar agora em detalhes.
Mas no Sol o processo está ao contrário: o “lume” está do lado do “vapor”...
Pois é, mas isso não vai impedir pessoas com a nossa imaginação de perceber o que acontece quando esse “lume”, como muito bem disseste, varia, pois não?
Então... quando aumenta a energia... aumenta a ionização...
Lógico. E como é preciso muita energia para ionizar um átomo, esse é um processo muito eficiente de absorção das variações da energia solar: essas variações são convertidas em mudança de estado, entre plasma e gás. Estão a ver?
Sim
E reparem também no seguinte: se não fosse este processo de ionização, o escoamento dum excesso de energia produzida seria lento; então, como a energia produzida cresce com a energia acumulada, facilmente o Sol entraria num processo explosivo. É este processo de ionização que garante estabilidade ao Sol.
Estou a ver que o Sol é uma máquina muito bem construída...
Podes dizê-lo. Mas o Sol é uma máquina muito mais espantosa do que o que imaginas.
O Rei Sol!!
Rei? Ahahah estás enganado! O Sol não é um Rei, é uma Rainha!
Rainha? Como é isso?
Pois, altura de falarmos das manchas solares.
foto Sol: Nasa; desenho: www.infomet.com.br/imagens/s_plasma1.gif